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Anteprojeto da Suprema Corte para proibir o aborto vaza nos EUA e gera manifestações

A Suprema Corte americana estaria prestes a derrubar a decisão histórica que reconhece o direito ao aborto há quase meio século nos Estados Unidos. A informação foi divugada na noite de segunda-feira (2) pelo site de notícias Político, após o vazamento de um anteprojeto majoritário escrito pelo juiz conservador Samuel Alito e datado de 10 de fevereiro. A notícia levou centenas de pessoas pró e antiaborto a se manifestar em frente à sede da Suprema Corte, em Washington.

Manifestantes pró-aborto em frente à Suprema Corte dos EUA, que pretende sugerir a revogação do direito ao aborto.
Manifestantes pró-aborto em frente à Suprema Corte dos EUA, que pretende sugerir a revogação do direito ao aborto. AP - Sue Ogrocki
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No texto de 98 páginas, intitulado "Opinião da Corte", o juiz Samuel Alito argumenta que a decisão Roe v. Wade, de 1973, que estabeleceu que a Constituição dos EUA protegia o direito da mulher ao aborto, foi "totalmente infundada desde o início". Na sequência, o magistrado afirma enfático: "Acreditamos que Roe v. Wade deve ser revogada", de acordo com o documento publicado pelo site Político

"O aborto é uma questão moral profunda", prossegue Alito, "e a Constituição não proíbe os cidadãos de cada estado de regulamentar ou proibir o aborto". "A conclusão incontestável é que o direito ao aborto não está profundamente enraizado na história e nas tradições da nação", diz o juiz, acrescentando que a decisão "não é protegida por nenhuma disposição da Constituição".

Se esta conclusão for confirmada pela Suprema Corte, os Estados Unidos voltarão à situação anterior a 1973, quando cada estado era livre para proibir ou autorizar o aborto. Devido às opiniões divergentes sobre este direito das mulheres, é provável que a metade dos estados americanos, principalmente os do sul, mais conservadores e sujeitos à forte influência religiosa, decidam banir o aborto.

Parlamentares democratas denunciaram o potencial retrocesso. Seria "uma abominação, uma das piores e mais prejudiciais decisões da história moderna", disse a presidente da Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi, e o líder democrata do Senado, Chuck Schumer, em uma declaração conjunta.

"Se estas informações forem exatas, a Suprema Corte está pronta para infligir a mais severa restrição de direitos nos últimos 50 anos – não apenas às mulheres, mas a todos os americanos", advertiram Pelosi e Schumer.

"Sejamos claros: trata-se de um anteprojeto. É ultrajante, sem precedentes, mas não definitivo: o aborto permanece um direito e ainda é legal", escreveu no Twitter a organização Planned Parenthood, que administra várias clínicas que praticam o aborto nos EUA.

Sem precedentes

A Suprema Corte passou por uma grande reformulação durante a presidência do republicano Donald Trump. Ele nomeou três juízes durante seu mandato, reforçando a maioria conservadora. Dos nove magistrados que compõem o tribunal, sobraram apenas três progressistas.

Desde setembro, essa maioria ultraconservadora tem enviado vários sinais a favor dos oponentes ao aborto e se recusou a impedir a entrada em vigor de uma lei texana que limita o direito ao aborto às primeiras seis semanas de gestação. A legislação atual prevê a interrupção da gravidez até dois trimestres.

Durante o exame de revisão de uma lei do Mississippi, em dezembro passado, que também questionava o prazo legal para o aborto, a maioria dos juízes deixou claro que estavam preparados para restringir ou derrubar a decisão Roe v. Wade. O parecer do tribunal deve ser conhecido em junho. O anteprojeto obtido pelo site Político está relacionado com este caso. 

O vazamento surpreendeu juristas, já que o sigilo das deliberações da Suprema Corte quase nunca foi violado. Segundo o site Político, que cita uma pessoa com conhecimento das discussões do tribunal, quatro outros juízes conservadores – Clarence Thomas, Neil Gorsuch, Brett Kavanaugh e Amy Coney Barrett – votaram com Samuel Alito, enquanto os três juízes liberais elaboram uma posição dissidente. O voto final do presidente do tribunal, John Roberts, permanece desconhecido.

"Tenho certeza de que nunca houve um vazamento como este" na Suprema Corte, comentou no Twitter o jurista Neal Katyal, que tem defendido repetidamente a administração Obama perante o Supremo Tribunal. Ele disse que havia "vários sinais" de que o documento era genuíno. Solicitado pela agência AFP a se pronunciar sobre a autenticidade do documento, o tribunal se recusou a comentar o caso.

Manifestações espontâneas

Na sequência do vazamento, centenas de defensores do direito ao aborto e opositores se reuniram espontaneamente em frente à Suprema Corte em Washington, na noite de segunda-feira.

Na multidão cantando "meu corpo, minha escolha", Abby Korb, uma estudante de 23 anos e assistente parlamentar, disse à AFP que ela estava "literalmente em estado de choque". Para ela, "tornar o aborto ilegal não vai diminuir a prática, apenas torná-lo mais perigoso".

Claire Rowan, 55 anos, mãe de sete filhos, não escondia seu entusiasmo. Ela espera que as pessoas "peçam perdão a Deus" para que os EUA possam "se curar".

Os políticos se mostraram divididos e reagiram com veemência. Vários representantes democratas disseram que há uma "necessidade urgente" de consagrar o direito ao aborto na legislação. "Devemos proteger o direito de escolha e consagrar a Roe V. Wade na lei", disse a senadora Amy Klobuchar. Uma proposta nesse sentido foi aprovada na Câmara dos Representantes, mas está paralisada no Senado devido à oposição feroz dos republicanos. 

O campo conservador saudou uma vitória há muito esperada. "Esta é a melhor e mais importante notícia de nossas vidas", comentou a representante da Geórgia Marjorie Taylor Green, e seu colega Josh Hawley pediu à Corte que emitisse sua decisão "imediatamente".

Com informações da AFP

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