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Operação da PF que apreendeu celular de Bolsonaro reverte ânimo político em Brasília e irrita bolsonaristas

Ex-presidente brasileiro é acusado de adulterar sistema do SUS para incluir comprovante falso de vacinação contra o coronavírus, pouco antes de embarcar para os Estados Unidos após sua derrota nas eleições. A operação da Polícia Federal, que prendeu ex-assessores de Jair Bolsonaro e fez buscas de material e documento na casa do próprio ex-chefe de Estado, elevou a temperatura política nos corredores da capital e provocou revolta no ninho bolsonarista.

Jair Bolsonaro deixa sua casa após operação da Polícia Federal.
Jair Bolsonaro deixa sua casa após operação da Polícia Federal. REUTERS - ADRIANO MACHADO
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Raquel Miura, correspondente da RFI em Brasília

Apoiadores de Bolsonaro viviam uma semana de otimismo, especialmente com o adiamento da votação do PL das Fake News e certos embaraços na administração Lula, com frases polêmicas do petista à recepção entusiástica que o adversário recebeu na Agrishow, em Ribeirão Preto. Mas a operação desta quarta-feira alterou o humor político em Brasília. Nos bastidores bolsonaristas, muitos direcionaram o arsenal de críticas ao presidente do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes, que defende a proposta de regulação das plataformas digitais de informação e, por conduzir o inquérito das milícias digitais, foi quem autorizou a operação.

Os celulares de Bolsonaro e da esposa Michele foram apreendidos e o próprio ex-presidente apareceu para falar. "Eu não tomei a vacina. É uma decisão pessoal minha depois de ler a bula da Pfizer, de não tomar a vacina. O cartão de vacina da minha esposa também foi fotografado. Ela tomou a vacina nos Estados Unidos, da Janssen. A minha filha, que eu respondo, Laura, atualmente com 12 anos, não tomou a vacina também. Tem o laudo médico tocante a isso. De resto, eu fico surpreso com a busca e apreensão por esse motivo. Eu não tenho mais nada para falar", defendeu-se.

A irritação ficou evidente na própria negativa de Bolsonaro em comparecer para depor na Polícia Federal sobre o caso hoje. A defesa dele disse que não teve acesso aos autos do inquérito e considerou arbitrária a ação dos agentes na residência onde ele mora atualmente, num condomínio em Brasília. O material recolhido será analisado e os assessores detidos serão ouvidos pela PF.

Aliados temem desgaste político

Os aliados do ex-presidente temem pelo risco de desgaste político, já que somente este ano, depois de retornar dos Estados Unidos, Bolsonaro já depôs duas vezes à Polícia Federal sobre outros dois casos – atos antidemocráticos e as joias recebidas da Arábia Saudita.

Quando a informação da operação correu as redes sociais, inclusive com a prisão do ex-ajudante de ordem de Bolsonaro, tenente-coronel Mauro Cid, houve apreensão entre bolsonaristas, alguns temendo que uma prisão de Bolsonaro possa ser o próximo passo de um dos inquéritos em andamento no STF. Na casa de Cid, que também é investigado no caso das joias sauditas, a PF encontrou notas de dólares num total de U$ 35 mil, e também notas de real, somando R$ 16 mil.

As reações foram imediatas, tanto entre os aliados como entre aqueles que se opõem ao ex-presidente. “Antigamente a PF fazia operações contra a corrupção. Hoje a outrora gloriosa Polícia Federal faz buscas e apreensões e prisões por SUSPEITAS na vacinação. Que vergonha para a Instituição e para o Brasil”, escreveu no twitter o deputado Carlos Jordy (PL/RJ).

"Bolsonaro é uma pessoa correta, íntegra, que melhorou o país e procurava sempre seguir a Lei. Confiamos que todas as dúvidas da Justiça serão esclarecidas e que ficará provado que Bolsonaro não cometeu ilegalidades", afirmou Valdemar da Costa Neto, presidente do PL, partido do ex-presidente.

Al Capone

Já entre os adversários do ex-presidente o dia foi marcado por explorar o caso nas redes sociais, destacando o que a investigação tem apontado até aqui: que o cartão de vacinas de Bolsonaro e de outras pessoas que viajaram com ele foi adulterado. A avaliação dos desafetos do ex-presidente é de que o caso arranha mais o pessoal do que o lado administrativo do militar. 

O bolsonarismo tem pela frente o desafio de construir uma narrativa entre duas hipóteses possíveis: a primeira é que Bolsonaro não tomou a vacina, como ele diz, mas teve seu cartão falsificado por aliados para ingressar nos Estados Unidos sem ser incomodado, como sugerem até agora as apurações desse inquérito, o que configuraria crime. A segunda possibilidade é que ele teria tomado o imunizante como está no cartão, apesar de ter feito todo um discurso antivacina, desestimulando apoiadores a se proteger do vírus, o que seria moralmente muito cruel. Até aqui, a defesa tem focado na primeira hipótese, mas tentando afastar do presidente a responsabilidade pelo ato em si ou possível ordem a subordinados para que o fizessem.

“Bolsonaro sempre foi um enganador. Enganava os militares fingindo ser um sindicalista. Enganou evangélicos com sua arenga religiosa. Enganou o povo com a conversa de mito. Quis enganar o SUS e a PF falsificando um cartão de vacinação para entrar nos Estados e manter seu discurso negacionista. Se deu mal”, afirmou o deputado Carlos Zaratini (PT/SP).

“Tem de tudo na ficha corrida de Bolsonaro, de peculato à prevaricação, passando por negligência, charlatanismo, epidemia qualificada, usurpação de função pública, corrupção, uso da máquina pública, atentado contra a democracia e apropriação de bem público. Agora mais um, corrupção de menores. Tá mais do que na hora de Jair pagar pelos crimes”, publicou nas redes sociais a presidente do PT, Gleisi Hoffman.

Já o senador Alessandro Vieira (PSDB/SE) foi irônico em seu comentário sobre o episódio. “Coincidências da vida: esta semana estava assistindo a um filme sobre o Al Capone, aquele gângster que cometeu diversos crimes graves e acabou preso por um crime menor, no caso dele sonegação”.

Pelas análises dos dados do sistema do SUS, as informações que atestavam a vacinação de Bolsonaro contra a Covid-19 foram incluídas no ConecteSUS no dia 21 de dezembro do ano passado, alguns dias antes do ex-presidente embarcar para os Estados Unidos, fugindo da cerimônia de transferência da faixa presidencial a seu sucessor. Dias depois, os dados sobre a suposta imunização de Bolsonaro foram retirados do sistema, sob alegação de erro.

“Não existe adulteração da minha parte. Não tomei a vacina. Ponto final. Em momento algum falei que tomei a vacina e não tomei", frisou Bolsonaro após a ação da PF.

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