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Linha Direta

Para analistas, Lula deve se impor para cortar ruídos internos no governo pela raiz

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Presidente Lula convocou para esta sexta-feira (6) uma reunião com todos os ministros, ao fim de uma primeira semana de governo marcada por declarações polêmicas e ruídos internos. Desafio do petista é garantir autonomia da equipe, mas mostrar que governo não é um barco sem rumo.

O Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a primeira-dama Rosângela 'Janja' da Silva , o vice-presidente Geraldo Alckmin, sua esposa Maria Lúcia Ribeiro Alckmin, o senador Venesiano Vital do Rêgo e o ministro-chefe da Casa Civil Rui Costa (à dir.) escutam o hino nacional durante a cerimônia de posse de Alckmin como Ministro da Indústria e Comércio, no Palácio do Planalto, em Brasília, em 4 de janeiro de 2023.
O Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a primeira-dama Rosângela 'Janja' da Silva , o vice-presidente Geraldo Alckmin, sua esposa Maria Lúcia Ribeiro Alckmin, o senador Venesiano Vital do Rêgo e o ministro-chefe da Casa Civil Rui Costa (à dir.) escutam o hino nacional durante a cerimônia de posse de Alckmin como Ministro da Indústria e Comércio, no Palácio do Planalto, em Brasília, em 4 de janeiro de 2023. AFP - EVARISTO SA
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Raquel Miura, correspondente da RFI em Brasília

Nos últimos dias houve ruídos negativos para o governo, como a declaração do ministro da Previdência, Carlos Lupi (PDT/RJ), que questionou o déficit da Previdência e falou em revisar a última reforma do setor aprovada pelo Congresso, o que derrubou a bolsa e elevou o dólar. A Casa Civil precisou vir a público dizer que tais ideias não estão no horizonte do novo governo.

Lula também acha que, em alguns casos, é preciso saber a hora certa de apresentar mudanças e explicá-las de forma clara, evitando rebuliços com a opinião pública, como aconteceu quando o ministro do trabalho, Luiz Marinho (PT/SP), afirmou que pretende acabar com o saque-aniversário do FGTS.

“A impressão que a gente teve nessa primeira semana é que os ministros, cada um à sua maneira, chegaram com muita pressa para resolver problemas, para imprimir sua marca e, de alguma forma, para ter seu protagonismo individualizado. O presidente vai ter de chamar para si a responsabilidade de comandar, de coordenar, de cobrar”, disse à RFI o cientista político Leonel Cupertino.

Na linguagem política formal, trata-se de ‘alinhar o discurso’ e as ações do novo governo. Na linguagem popular, está mais para um leve puxão de orelha em alguns e um alerta para outros, a fim de mostrar que todos foram nomeados para contribuir, mas que não se pode passar a ideia de um navio à deriva.

Para Cupertino, foi a ausência desse comando que provocou muito tumulto no governo anterior. “Quando se pretendia mexer, por exemplo, na área de comunicação, esse ministério não falava com a Casa Civil, não falava com coordenação política e isso gerava ruídos. Isso acontecia porque Bolsonaro não coordenava, mas só delegava. Por sua vez, Lula tem um caráter mais de coordenador – e terá de fazer isso”, afirmou o especialista.

Frente ampla sendo acomodada na Esplanada

Já o analista econômico Andrew Storfer, da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, afirmou à RFI que esse choque de opiniões se deve em grande parte à ausência de propostas claras no programa petista durante a campanha eleitoral, justamente para ser capaz de formar uma frente partidária ampla em torno de Lula. “Há um desencontro de proposições e declarações. E pode haver até mais, mas muitos ministros ainda não falaram de suas prioridades. Isso é fruto da própria campanha do PT, que optou por não divulgar nem diretrizes, nem propostas para não afastar alguns eleitores e também para não inviabilizar alianças”, avaliou o economista.

Para Storfer, “é cada um achando que sua ideia, sua diretriz para o respectivo setor é o que deve prevalecer, e num governo com 37 ministérios para abrigar tantos partidos aliados. É um desafio grande agora fazer esse alinhamento”.

Cerimônia de Assunção no cargo de Ministro de Estado do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin
Cerimônia de Assunção no cargo de Ministro de Estado do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin © Isaac Amorim/MJSP

Quem manda na economia

Uma das áreas mais sensíveis é a economia, por se relacionar com todas as demais pastas e suas medidas têm repercussões transversais. O principal ponto de interrogação, neste caso, é quão autônomo será o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT/SP).

Ele e o restante da equipe sabem que, em momentos de dúvidas e tensão, a palavra final será de Lula, como já aconteceu no primeiro e segundo governos do petista. Mas a credibilidade do chefe da Economia passa também por mostrar que não é apenas um executor das ideias do presidente, mas que terá poder para conduzir a política fiscal e econômica do país.

A sensação de que Haddad ainda precisa mostrar força na área que vai comandar cresceu logo que o novo governo tomou posse, em 1º de janeiro, quando foi prorrogada a isenção de tributos federais sobre os combustíveis por determinação de Lula, mesmo com dúvidas de Haddad sobre a medida. Um dos testes de fogo será com o Congresso, onde o ministro pretende discutir, neste primeiro semestre, um novo arcabouço fiscal para substituir o teto de gastos.

Os desafios são imensos. A própria PEC da Transição resultou num rombo fiscal que implica em juros em patamares altos durante um bom tempo, além da ameaça da inflação. Se nota então um medo dos investidores. Assim, é preciso achar um rumo que atenda ao país como um todo, que permita um ambiente econômico melhor”, disse o Andrew Storfer.

Justamente por estar focado em análises de números e elaboração de propostas, Haddad não compareceu às cerimônias de posse de outros colegas da Esplanada. Ele só marcou presença na de Simone Tebet (MDB/MS) no ministério do Planejamento, nessa quinta-feira (5). A ex-senadora assumiu o posto destacando afinidades e divergências com o restante da equipe econômica.

Tebet disse que o social é importante, mas que responsabilidade fiscal também, num discurso que agradou muita gente pelo zelo com as contas, mas decepcionou outros que sentiram falta, por exemplo, de ideias mais à esquerda como a defesa da taxação de grandes fortunas.

O vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, e o presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, durante solenidade de posse no cargo de ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), no Palácio do Planalto.
O vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, e o presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, durante solenidade de posse no cargo de ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), no Palácio do Planalto. © Marcelo Camargo/Agência Brasil

Ministra na berlinda?

A primeira semana do terceiro governo Lula também foi marcada por pressão em cima da ministra do Turismo, Daniela Caneiro (União Brasil/RJ). O PT, que acusa a família Bolsonaro de ligação com milícias, viu a escolhida para a pasta figurar em várias manchetes de jornais que apontaram elos políticos dela com milicianos.

Carneiro diz que não pode ser condenada por erros dos outros e que durante a campanha manteve diálogo com várias pessoas, num caso que respinga no Planalto, embora não seja possível saber qual o alcance do estrago.

“Sem sombra de dúvida, é um fato que arranha a imagem do governo, que poderia passar sem essa. Mas o potencial de impacto pode não ser grande visto que não se trata de um mal que ela fez para a administração petista, não se trata de corrupção, mas de uma relação pessoal dela, mais ligada ao Rio de Janeiro. De toda forma, é um problema nesse alvorecer da nova gestão”, opinou Lionel Cupertino.

O analista político disse que “a pergunta que fica é como o Planalto vai reagir daqui pra frente". "Até o momento, não vi declarações de Lula nem de outros membros do primeiro escalão em defesa da ministra. Nós sabemos que a ministra vem de um partido que não tem identidade ideológica com o PT, mas o marido dela foi um grande entusiasta da campanha de Lula na Baixada  Fluminense. Acredito que a tendência é que o caso vá para a esfera da apuração”, avalia Cupertino.

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