Acessar o conteúdo principal

Entenda o que está em jogo nas eleições legislativas na Índia

A campanha eleitoral para eleições gerais acontece na Índia num ambiente carregado de paixões, debates e protestos, um momento importante na vida política do país que se orgulha de ser “a maior democracia do mundo”. Na véspera da votação, o BJP, partido do primeiro-ministro Narendra Modi, é favorecido por seus resultados econômicos. Um sucesso, no entanto, contestado, inclusive no meio empresarial. Com opositores importantes na prisão, para especialistas o que está em jogo é a própria democracia no país.

O primeiro-ministro indiano Narendra Modi, em campanha por um terceiro mandato nas eleições gerais, em Nova Delhi, na Índia, em 14 de abril de 2024.
O primeiro-ministro indiano Narendra Modi, em campanha por um terceiro mandato nas eleições gerais, em Nova Delhi, na Índia, em 14 de abril de 2024. © AP - Manish Swarup
Publicidade

Com quase um bilhão de eleitores chamados às urnas para eleger, entre 19 de abril e 1 de junho, a 18.ª legislatura do “Lok Sabha”, a câmara baixa do Parlamento, a excitação é real, mesmo que, segundo as sondagens, não haja muitas surpresas na votação deste ano.

A vitória do BJP, o partido dos nacionalistas hindus no poder em Nova Délhi, estaria garantida. Se fosse bem-sucedido, o seu líder Narendra Modi seria automaticamente reconduzido como primeiro-ministro para um terceiro mandato consecutivo, um feito que apenas Nehru, o primeiro de seus 16 antecessores desde a independência, tinha conseguido.

As eleições opõem o Partido Aam Aadmi, cujo líder, Arvind Kejriwal, preso por suposto envolvimento em um caso de corrupção, foi erigido mártir político, e o BJP, de Modi. A oposição espera infligir uma sanção simbólica ao primeiro-ministro, ao menos na capital, Nova Délhi, se posicionando como guardiã da democracia. Resta saber se o tema mobiliza eleitores, mais preocupados com o desemprego.

Potência mundial até 2029

Narendra Modi promete que a Índia se tornará a terceira potência mundial até 2029, ou seja, antes do final do seu próximo mandato. O chefe de governo tem argumentos sólidos a seu favor. O crescimento tem sido vigoroso há vários anos, 6,8% em 2024, de acordo com as previsões do Fundo Monetário Internacional (FMI).

Os grandes projetos lançados desde que chegou ao poder melhoraram significativamente a vida cotidiana dos indianos e impulsionaram a atividade econômica. O país também se beneficia de investimentos de multinacionais que deixaram a China desde a Covid-19.

O BJP e Narendra Modi estão aproveitando da boa fase. Mas, na realidade, a Índia ainda é um país com muita pobreza e esse enriquecimento é muito relativo.

O crescimento ultrarrápido, apesar de sólido, não é suficientemente forte para melhorar o nível de vida dos 1,4 bilhão de habitantes do país. A renda per capita é de apenas US$ 2.600 (cerca de R$ 13.600) por ano. Este é o nível mais baixo dos Brics, e do G20, colocando a Índia no 139º lugar no ranking mundial em termos de riqueza per capita.

Nos últimos dez anos, o número de bilionários triplicou, mas o rendimento da grande maioria dos indianos estagnou. Com tão pouca redistribuição, é difícil ver como o mercado interno pode sustentar o crescimento. O sintoma mais flagrante desta pobreza é o desemprego de 8% – a taxa de atividade é muito baixa, as mulheres estão quase ausentes do mercado de trabalho. A maioria dos indianos ganha a vida graças ao setor informal, a anos-luz de distância da prosperidade da classe média empregada nos serviços.

Recenseador inicia coleta de dados da população em Hatkhuwapara, nordeste da Índia.
Recenseador inicia coleta de dados da população em Hatkhuwapara, nordeste da Índia. Reuters

 

Nenhum milagre chinês no horizonte

A abertura de fábricas orientadas para a exportação, como a da Apple para fabricar iPhones, é um benefício para a indústria e, portanto, para o emprego indiano, mas com efeitos limitados. Os investidores estrangeiros pensam na diversificação, já não querem depender de um único país, mas a Índia só se beneficia de uma pequena parte deste vasto movimento de deslocalização.

O apoio à tecnologia, apresentado como uma prioridade pelo governo, é bom por si só, explica o ex-executivo do Banco Central, Raghuram Rajan, muito crítico da história muito romantizada dos sucessos econômicos do primeiro-ministro indiano. Mas, segundo ele, isso é insuficiente para dar trabalho a todos. Devemos, recomenda ele, olhar para as indústrias tradicionais do país e melhorar o ambiente de investimento. Uma área onde ainda há muito o que fazer, acreditam os empresários indianos.

Alguns preferem ir a Singapura para criar start-ups, devido à falta de confiança no ambiente de seu país. A arbitrariedade política, as medidas protecionistas, ainda demasiado numerosas na indústria, e a fragilidade do mercado interno estão entre os obstáculos mais frequentemente identificados, incluindo entre as grandes dinastias econômicas totalmente conquistadas por Modi.

Democracia em perigo

No comando do país desde 2014 e reeleito em 2019, Narendra Modi é um líder popular e populista. Ele vem do poderoso movimento nacionalista hindu, o RSS (Rashtriya Swayamsevak Sangh), do qual o seu partido, o BJP, é o braço político. Fervoroso defensor do Hinduísmo, a matriz ideológica do "majoritarismo hindu", Modi pretende transformar a Índia moderna e secular em um estado hindu ("Rashtra hindu") onde as minorias religiosas serão relegadas à categoria de cidadãos de segunda classe.

Para muitos especialistas, o processo de hinduização já em andamento no país, juntamente com a tendência autoritária do regime no poder, afasta a Índia de seus valores democráticos e fundadores do secularismo, da liberdade e do pluralismo multicultural.

As mudanças em sua democracia, que se aceleraram desde o segundo mandato de Narendra Modi, fizeram com que a Índia fosse degradada nos rankings internacionais de democracia e descrita como uma “democracia parcialmente livre”, ou mesmo de “autocracia eleitoral”. Por tudo isso, a sobrevivência da democracia na Índia deve ser a verdadeira questão dessas eleições.

NewsletterReceba a newsletter diária RFI: noticiários, reportagens, entrevistas, análises, perfis, emissões, programas.

Acompanhe todas as notícias internacionais baixando o aplicativo da RFI

Compartilhar :
Página não encontrada

O conteúdo ao qual você tenta acessar não existe ou não está mais disponível.