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Islã

Faz sentido usar a expressão “islamofascismo”?

As palavras do primeiro-ministro francês, Manuel Valls, de que os europeus lutam contra o "islamofascismo", ecoaram pela França. Para o professor Jean-Yves Camus, pesquisador associado to think thank francês Institut de Relations Internationales et Stratégiques, Valls “tentou abrir o debate”, mas “do ponto de vista científico, o termo islamofascismo, ou fascismo islâmico, tem pouca validade”. O especialista em nacionalismos e extremismos na Europa conversou sobre o tema com a Agência France-Presse:

Jean-Yves Camus, especialista em extremismos e nacionalismos na Europa.
Jean-Yves Camus, especialista em extremismos e nacionalismos na Europa. Youtube
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De onde surgiu o termo islamofascismo?

Surgiu nos anos 1990, no universo jornalístico anglo-saxão e chegou aos meios conservadores franceses depois do 11 de setembro de 2001. Mas a expressão jamais havia sido utilizada por um dirigente governamental, seja de esquerda ou de direita. Marine Le Pen chegou a falar em “fascismo verde”. Com este termo, o primeiro-ministro Manuel Valls tentou abrir um debate, como fez com a expressão apartheid. De um ponto de vista científico, o termo tem pouca validade, mas Manuel Valls não estava em um colóquio universitário.

O termo é utilizado no campo científico?

Pouquíssimas universidades o empregam, pois quando observamos o Islã radical e o fascismo, as divergências parecem levá-los a convergências. Nas convergências, podemos evocar o projeto societal totalitário, a discriminação contra um certo número de grupos minoritários, o antissemitismo, o gosto pela teoria conspiratória, a estetização da violência… Mas há divergências irredutíveis. Para começar, o fascismo e o nacional-socialismo são produtos da modernidade, da irrupção das massas na vida política. O Islã radical não é um produto da modernidade: é a vontade de abandonar a sociedade islâmica regida por códigos invariáveis, aqueles da primeira época do Islã, vista como a Era de Ouro. Segunda diferença: enquanto o fascismo quer criar um novo homem, o islamismo quer que o homem se comporte de acordo com o texto do fundador. Além disso, há um elemento economicamente estatista no fascismo, enquanto o islamismo se adapta muito bem às regras do mercado e do capitalismo. O ponto cego do projeto islamista é o de não de pensar o Estado, não dizer como se gera o Estado uma vez que se chega ao poder.

Então ele é globalizante demais?

O que me incomoda nesta expressão é que ela é a prova de que o Ocidente não sabe pensar falar em totalitarismo sem pensar no fascismo. É lamentável, pois, de uma certa maneira, podemos chegar a dar menor importância a ideologias totalitárias só porque consideramos que ela não é fascista. O Khmer Vermelho, Srebrenica, o genocídio armênio, Ruanda… não tem muito a ver com a ideologia do nacional-socialismo. Precisamos parar de ter essa referência do fascismo e do nazismo, que, no fundo, é uma referência ao Shoah (holocausto). Isso não quer dizer diminuir a importância deles ou esquecê-los, mas podem surgir no futuro fenômenos totalitários ou genocidas que têm o mesmo resultado em termos de extermínio sem, no entanto, funcionar no mesmo mecanismo.

 

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