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Morre Robert Badinter, ícone dos direitos humanos e promotor do fim da pena de morte na França

A França perdeu nesta sexta-feira (9) um ícone dos direitos humanos: o ex-ministro da Justiça Robert Badinter, que promoveu a abolição da pena de morte no país em 1981, morreu aos 95 anos. O presidente Emmanuel Macron homenageou “uma figura do século, uma consciência republicana, o espírito francês”.

Robert Badinter foi ministro da Justiça e presidente do Conselho Constitucional da França. Foto de 9 de setembro de 2013.
Robert Badinter foi ministro da Justiça e presidente do Conselho Constitucional da França. Foto de 9 de setembro de 2013. © Bertrand Guay / AFP
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Badinter levantou a bandeira contra a pena de morte em uma época em que a opinião pública francesa se opunha a qualquer mudança nos costumes. "A pena de morte significa que o Estado assume o direito de dispor da vida do cidadão; isto implica secretamente o poder de vida ou morte do Estado sobre o cidadão. E eu recuso isso”, disse, quatro anos antes de o Parlamento do país aprovar o fim da pena capital.

Em 17 de setembro de 1981, já como ministro da Justiça do governo do socialista François Mitterrand, ele fez um discurso inflamado na Assembleia Nacional que entrou para a História da França. Durante duas horas, convenceu os parlamentares a irem na contramão da opinião pública e na direção que começavam a caminhar os demais países europeus. O pioneiro foi a Áustria, em 1968.

“A França é grande porque foi a primeira na Europa a abolir a tortura, apesar das mentes cautelosas que, no país, exclamaram alto que, sem tortura, a justiça francesa estaria desarmada, que sem tortura os bons súditos seriam entregues aos vilões. A França foi um dos primeiros países do mundo a abolir a escravatura, crime que ainda desonra a humanidade. Acontece que a França foi, apesar de tantos esforços corajosos, um dos últimos países, quase o último da Europa Ocidental, a abolir a pena de morte”, argumentou. “[...] "Amanhã, graças a você, a justiça francesa não será mais uma justiça que mata. Amanhã, graças a vocês, não haverá mais, para nossa vergonha comum, execuções furtivas, de madrugada, nas prisões francesas. Amanhã, as páginas sangrentas da nossa justiça serão viradas."

Homenagens

Badinter também foi presidente do Conselho Constitucional, que seria o equivalente ao Surpremo Tribunal Federal, e depois "investiu até o seu último suspiro de vida na abolição universal da pena capital", conforme indicou sua colaboradora Aude Napoli na manhã desta sexta, ao anunciar a morte do colega. "Robert Badinter nunca deixou de defender o Iluminismo”, ressaltou Emmanuel Macron, no X.

"Ele terá dedicado cada segundo da sua vida à luta pelo que era justo, à luta pelas liberdades fundamentais. A abolição da pena de morte será para sempre o seu legado para a França", escreveu o primeiro-ministro Gabriel Attal, também na rede social.

"A morte de Robert Badinter, que foi meu amigo durante quase 50 anos e meu antecessor como presidente do Conselho Constitucional, é uma perda imensa para a justiça e para a França. Robert Badinter não foi apenas um jurista notável, mas um justo entre os justos”, homenageou Laurent Fabius, em comunicado enviado à AFP.

História marcada pelo antissemitismo 

Badinter cresceu em uma família judia da Bessarábia – região localizada entre a Romênia e a Ucrânia, no território da atual Moldávia – e sua família foi assombrada pelo antissemitismo. A sua avó materna fugiu para o Ocidente no século 19 devido às perseguições aos judeus do regime czarista, e seu pai emigrou para a França após a revolução bolchevique. Robert nasceu francês em 1928.

A família morava em Paris, onde o pai, Simon Badinter, tinha uma loja de peles. Durante a ocupação nazista, refugiaram-se na região de Lyon. Simon foi preso em 1942 e morreu um ano depois, em um campo de concentração na Polônia. Aos 15 anos, Robert chegou a tentar localizar o pai, em vão.

Depois da guerra, estudou direito, literatura e sociologia. Aos 22 anos, se tornou advogado e teve uma carreira fulgurante: defendeu famosos como a estilista Coco Channel, mas jamais deixou de lado réus do direito comum.

Muito rapidamente, ele se envolveu contra a pena de morte. Primeiro nos tribunais e depois, a partir de 1981, como ministro da Justiça.

Em 2021, aos 93 anos, ele não havia perdido nada de sua combatividade. Por ocasião do quadragésimo aniversário da abolição da pena capital na França, afirmou: “A pena de morte deverá desaparecer deste mundo porque é uma vergonha para a humanidade".

Além deste combate, ele também promoveu os direitos dos homossexuais, sendo um dos notáveis defensores da autorização do casamento homoafetivo. Após sair do governo e presidir ao Conselho Constitucional durante nove anos (1986-1995), tornou-se senador socialista de 1995 a 2011, e teve a satisfação de ver a abolição da pena de morte  entrar na Constituição francesa, em 2007.

Divorciado de uma atriz, com quem havia se casado nos anos 1950, ele era casado desde 1966 com a filósofa Elisabeth Badinter, com quem teve três filhos. O presidente Macron anunciou que uma homenagem nacional será organizada para o ex-ministro nos próximos dias.

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