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Dinamarca aprova lei para terceirizar acolhimento de migrantes fora da Europa

Um centro dinamarquês de acolhimento de refugiados transferido para Ruanda ou Eritreia, no continente africano? Conhecida por sua linha dura em relação à imigração, a Dinamarca aprovou nesta quinta-feira (3) uma lei que permite a abertura de centros para requerentes de asilo fora da Europa. Os migrantes seriam enviados para lá enquanto seus casos estivessem sendo processados pela administração europeia, e mesmo depois de serem reconhecidos como refugiados.

Migrantes escapam de um centro para requerentes de asilo reprovados na Jutlândia, Dinamarca, em 26 de março de 2019.
Migrantes escapam de um centro para requerentes de asilo reprovados na Jutlândia, Dinamarca, em 26 de março de 2019. REUTERS - ANDREW KELLY
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Trata-se da última novidade anti-migração do governo social-democrata da primeira-ministra dinamarquesa Mette Frederiksen para dissuadir qualquer imigrante de pôr os pés neste rico reino nórdico. O texto prevê que o requerente permaneça num país terceirizado, mesmo que, no final do processo, obtenha o status de refugiado.

Com o apoio da direita e da extrema direita, e apesar da oposição de alguns partidos de esquerda, a lei foi aprovada confortavelmente na manhã desta quinta-feira (3), por 70 votos a 24.

A União Europeia imediatamente se distanciou da decisão dinamarquesa. O projeto "levanta questões fundamentais sobre o acesso aos procedimentos de asilo e o acesso efetivo à proteção dos migrantes", disse o porta-voz da Comissão Europeia, Adalbert Jahnz.

Tal procedimento de terceirização "não é possível" sob as regras europeias, frisou, observando, no entanto, que a decisão dinamarquesa deve ser analisada "com mais profundidade" à luz das exceções ("opt-outs") de que o país beneficia com as questões de migração.

"Zero refugiados"

 Em Copenhague, o Executivo de centro-esquerda está atualmente administrando uma das políticas de migração mais restritivas da Europa, com a retirada das autorizações de residência para sírios - porque suas regiões de origem estariam "seguras" -, endurecimento de uma lei anti-gueto que visa limitar o número de habitantes "não ocidentais" nos bairros, ou mesmo o objetivo oficial de alcançar a meta de "zero refugiados".

De acordo com a nova lei, qualquer requerente de asilo na Dinamarca, uma vez que o seu pedido tenha sido registado e com algumas raras exceções, como uma doença grave, seja enviado para um centro de acolhimento fora da União Europeia.

Se ele não obtiver o status de refugiado, o migrante será convidado a deixar o país de acolhimento.

Pago pela Dinamarca

“Os migrantes que obtiverem o direito de asilo não terão permissão para voltar para a Dinamarca, mas teriam simplesmente a condição de refugiados no país terceirizado”, sublinha Martin Lemberg-Pedersen, especialista em questões migratórias da Universidade de Copenhague.

Todo o procedimento será confiado ao país de acolhimento, um processo integralmente financiado pela Dinamarca.

Por enquanto, nenhum país aceitou hospedar tal projeto, mas o governo dinamarquês garante que está discutindo com cinco a dez países não identificados.

Os nomes do Egito, Eritreia e Etiópia circulam na imprensa dinamarquesa. Mas é especialmente com Ruanda - que por um tempo considerou acolher os requerentes de asilo em nome de Israel - que as discussões parecem estar mais avançadas.

No final de abril, foi assinado um memorando de entendimento sobre cooperação em asilo e migração com Ruanda, sem mencionar a terceirização do procedimento de asilo.

O sistema "deve, obviamente, ser estabelecido no âmbito das convenções internacionais. Este será um pré-requisito para um acordo" com um outro país, disse o ministro dinamarquês da Migração, Mattias Tesfaye. No mês passado, ele justificou que as parcerias não seriam feitas necessariamente com democracias, "como as entendemos".

Reviravolta da sociedade dinamarquesa

O projeto, representado pela primeira-ministra, marca a reviravolta completa da social-democracia dinamarquesa em questões de migração, com o apoio de grande parte da opinião pública e da maioria do espectro político. Além de reforçar a "generalização de propostas antes reservadas à extrema direita", observa o cientista político Kasper Hansen, professor da Universidade de Copenhague.

Cinco anos após a adoção de uma polêmica lei que permite a apreensão de objetos de valor de migrantes que entraram na Dinamarca, as autoridades dinamarquesas continuam sua estratégia de dissuasão.

Apenas 761 pessoas obtiveram asilo em 2019 e 600 em 2020, contra mais de 10.000 em 2015. Em relação à sua população, a Dinamarca recebe dez vezes menos refugiados do que seus vizinhos alemães ou suecos.

“Este projeto é a continuação de uma política simbólica, é um pouco como Donald Trump e seu muro”, disse o secretário-geral da ONG ActionAid Dinamarca, Tim Whyte.

O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados já o havia julgado "contrário aos princípios em que se baseia a cooperação internacional no âmbito dos refugiados".

De acordo com o Instituto Nacional de Estatística, 11% da população dinamarquesa (5,8 milhões de habitantes) é de origem estrangeira, da qual 58% vêm de um país "não ocidental".

(Com AFP)

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