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Investigação revela o lucrativo negócio da 'venda' de enfermeiros latino-americanos para a Alemanha

Na Alemanha, há falta de profissionais de saúde e o país contrata mais de 10.000 enfermeiros estrangeiros por ano. Muitas deles vêm da América Latina, por meio de agências intermediárias. O jornal alemão independente Correctiv investigou algumas destas agências e revelou práticas perigosas.

Enfermeiras na ala reservada para pacientes de Covid no hospital DRK Kliniken Berlin Mitte, em Berlim.
Enfermeiras na ala reservada para pacientes de Covid no hospital DRK Kliniken Berlin Mitte, em Berlim. REUTERS - FABRIZIO BENSCH
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Por Melissa Barra

Com propagandas alegres e calorosas, a Alemanha busca atrair enfermeiros estrangeiros de ambos os sexos. Como em vários países europeus, a população alemã está envelhecendo e precisa de pessoal para cuidar dela, ainda mais com a pandemia.

Por isso, hospitais e clínicas alemães recorrem a órgãos privados, responsáveis ​​pela seleção de profissionais de saúde em países da América Latina e da Ásia, ou nos Bálcãs. Estas agências também tornam mais fácil o complicado processo de se encaixar na nova vida alemã.

“Eles oferecem aulas de alemão, preparam os candidatos para viajar para a Alemanha, facilitam os procedimentos na complexa burocracia e, em troca, os hospitais pagam uma comissão em torno de € 10.000 ou € 15.000 (entre R$ 65.000 e R$ 95.000) por pessoa recrutada”, explica Olaya Argüeso, editora-chefe do Correctiv, jornal investigativo independente da Alemanha.

Em um artigo intitulado "Enfermeiros à venda", a equipe jornalística revela que as solicitações de hospitais se tornaram um negócio lucrativo para intermediários inescrupulosos.

“Como tudo na vida, há empresas que se comportam com ética e outras que não”, lamenta Argüeso. Enfermeiras latino-americanas disseram à Correctiv que foram trabalhar na Alemanha por meio de agências com práticas duvidosas e que acabaram pagando caro por isso.

Processo forçado de aprendizagem do idioma

“Tive que vivenciar em primeira mão sua inexperiência em enfrentar os diferentes entes governamentais e sua burocracia. Eles não tinham a menor ideia do que fazer ”, diz uma fonte chamada Johanna Salinas. Um mês após sua chegada a Hamburgo, a enfermeira colombiana foi forçada a retornar.

“Quando a empresa de intermediação não é séria, ela tenta forçar o processo de aprendizagem do idioma em um período curtíssimo de seis e oito meses”, detalha Argüeso. Os processos de homologação de títulos e de vistos são pesados ​​e algumas agências não acompanham adequadamente os profissionais estrangeiros.

O jornalista alerta: “o mais perigoso é que em muitos casos há cláusulas penais que obrigam o enfermeiro a ficar até cinco anos com o mesmo empregador”.

Isso se deve ao fato de que as necessidades de profissionais de saúde muitas vezes se concentram em áreas rurais ou periurbanas e não em pólos de alta atividade.

Alguns profissionais, que pensavam que iam trabalhar em Berlim ou Hamburgo, encontram-se em regiões ou estruturas indesejadas. “Caso queira deixar o trabalho mais cedo, você deve pagar as despesas que o hospital teve que pagar à agência”, explica Olaya Argüeso.

"Escravizada pela dívida"

O jornal conta a história de Anabel Flórez, que descobriu, ao chegar à Alemanha, que iria trabalhar em uma casa de repouso e não em um hospital. “Os donos da residência eram adoráveis, mas para mim foi muito frustrante voltar profissionalmente assim. Depois de três meses, eu saí”, conta a enfermeira.

Por isso teve de reembolsar parte das despesas da agência, ou seja, € 4.500 euros. “É uma forma moderna de escravizar pelas dívidas. Como um empregado vai devolver essa quantia, sendo que talvez não ganhe muito mais que o salário mínimo?”, disse à mídia alemã a advogada trabalhista Christiane Brors.

Especialistas em direito do trabalho afirmam que esses métodos beiram a ilegalidade. “É preciso ter cuidado. Esse negócio movimenta muito dinheiro”, conclui Argüeso. "No final do ano, 10.000 ou 12.000 pessoas vêm trabalhar." Na última década, de fato, o número de cursos de enfermagem estrangeiros aprovados na Alemanha multiplicou-se por 24.

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