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Torcedores iranianos acreditam ter enviado apoio político a manifestantes no país, apesar de eliminação na Copa

A vitória dos Estados Unidos sobre o Irã por 1 a 0, na noite de terça-feira (29), garantiu a classificação dos americanos para as oitavas de final da Copa. O jogo foi cercado de muita expectativa pela tensão histórica entre as duas nações, que estão com relações diplomáticas interrompidas há mais de 40 anos. Muitos torcedores aproveitaram para apoiar protestos no Irã.

Iranianos exibem camisetas da seleção com nomes de ex-jogadores que criticam atual regime de Teerã.
Iranianos exibem camisetas da seleção com nomes de ex-jogadores que criticam atual regime de Teerã. © Elcio Ramalho/RFI
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Elcio Ramalho, enviado especial a Doha

O ambiente era festivo nos arredores do no estádio Al Thumama, com torcedores americanos e iranianos exibindo bandeiras, acessórios e até posando juntos para fotos. O jogo foi considerado o mais político da Copa do Mundo pela rivalidade entre os dois países, que se enfrentaram pela última vez há 24 anos, no Mundial da França. Na ocasião, os iranianos venceram a partida.  

Nesta Copa do Catar, autoridades iranianas se irritaram e pediram a exclusão dos Estados Unidos do torneio por causa de um tuíte da federação americana de futebol, que retirou da bandeira do Irã frases em referência ao Islã. O gesto foi entendido como uma provocação, no momento em que o Irã enfrenta, há dois meses, manifestações contra o regime ultraconservador pela morte de uma jovem curda por uso inadequado do véu islâmico.

No jogo de estreia contra a Inglaterra, jogadores iranianos não cantaram o hino nacional em sinal de apoio aos protestos no país. A atitude gera controvérsias. A iraniana Sherry, que vive nos Estados Unidos e veio com o filho assistir aos dois jogos da seleção iraniana, desaprovou a decisão dos atletas.

“Não estou nada contente. Eles não cantaram o hino nacional e se você não canta o hino nacional, você não tem união. O que eles fizeram na segunda-feira contra a Inglaterra foi absolutamente horrível. Você pode lidar com a política depois, mas agora temos um objetivo aqui. Viemos até aqui para apoiar a equipe nacional. E a equipe nacional não representa a República Islâmica. Ela representa o povo do Irã”, argumentou.

No entanto, para muitos torcedores iranianos, esta primeira Copa em uma país árabe é a ocasião para denunciar a opressão do regime de Teerã. 

Ali Seyedi, iraniano residente no Canadá, veio ao estádio com um grupo de amigos que usavam camisetas de ex-jogadores da seleção atualmente críticos ao governo.

“Não estou aqui para o futebol. Estou aqui para ser a voz do meu povo. Como é possível desfrutar do futebol quando eles matam seu povo, sua família? Nós somos do mesmo sangue. E você sabe o que está acontecendo no Irã. Então, como eles podem se divertir com o futebol? Estou 100% aqui só para mostrar a voz do povo iraniano”, afirmou. 

Iranianas exibem bandeiras dos dois países que se enfrentaram por uma vaga nas oitavas de final da Copa do Catar.
Iranianas exibem bandeiras dos dois países que se enfrentaram por uma vaga nas oitavas de final da Copa do Catar. © Elcio Ramalho/RFI

O jovem iraniano Braed, que vive e trabalha em Londres, também vê no Mundial uma oportunidade para mostrar sua defesa pelas liberdades individuais no país de origem. “Obviamente, estamos aqui por causa do futebol. O futebol é o principal, mas no final, o mais importante é que a liberdade seja garantida para todas as pessoas, acima de tudo. Trata-se de defender os direitos humanos”, declarou.

Agitando bandeiras e exibindo no rosto as cores verde, branca e vermelha, Samaneh é uma das torcedoras que vieram ao Catar para ver os jogos. Assim como outros compatriotas que irão retornar ao Irã, ela prefere não opinar sobre questões políticas e o que está ocorrendo em seu país.

“Acho que é melhor separar política e esporte. Porque o esporte é apenas uma competição e ambas as equipes jogam uma contra a outra, trocam aperto de mãos, fazem um jogo limpo. Quando jogam assim, competitivamente, é melhor deixar a política de lado e se concentrar no jogo”, diz.

Muitos torcedores americanos presentes no estádio relativizaram o contexto político em torno do confronto decisivo para as duas seleções. Mas deram apoio aos que lutam pelas liberdades individuais.

“Para o Irã e seu povo, tem sido uma luta com tudo o que está acontecendo. E nós lhes desejamos o melhor. Este é apenas um jogo de futebol. Mas todos os dias, os iranianos estão lutando em seu país. E esperamos e rezamos para que eles sejam bem sucedidos em seus esforços para encontrar a paz”, diz Jamie Petrick.

Quando soou o apito final da partida, os americanos fizeram festa com a classificação em um ambiente amistoso.

"Acho que eles deixaram a política fora do campo e disputaram um grande jogo. Mas há obviamente muita coisa a ser feita em ambos os países. De certa forma, eles pensarão nisso mais tarde e, por enquanto, o assunto é a vitória”, afirmou Brian MacBride, torcedor dos Estados Unidos.

Muitos torcedores do Irã e dos Estados Unidos tiraram fotos juntos, antes da partida no estádio Al Thumama, em Doha.
Muitos torcedores do Irã e dos Estados Unidos tiraram fotos juntos, antes da partida no estádio Al Thumama, em Doha. © Elcio Ramalho/RFI

A seleção do Irã foi eliminada, mas muitos prometem continuar a luta pelos direitos humanos no país. A iraniana Elham Assadi, residente nos Estados Unidos, exibiu no rosto as palavras "Mulher, Vida e Liberdade", slogan em defesa dos direitos das mulheres no Irã, sua forma de protesto pela situação no país.

“A Fifa não nos ajudou a divulgar nossas mensagens. Eles nos esconderam. Mas, aqueles que vieram aqui nos viram, nos ouviram, e nos apoiarão. Eu não voltarei ao Irã, por isso eles não podem fazer nada comigo. Voltarei aos Estados Unidos, por isso é muito mais fácil para eu falar. A situação dos que voltam ao Irã é bem mais difícil porque outras pessoas vão tirar fotos deles, enviar ao governo, então podem ser detidos, torturados e presos. Espero, sinceramente, que todas as pessoas nos ouçam. Espero”, desabafou.

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