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Em carta aberta a Lula, ex-eurodeputado critica posição do líder brasileiro sobre guerra na Ucrânia

O economista e ex-eurodeputado ecologista Alain Lipietz publica nesta terça-feira (2) uma carta aberta no jornal Le Monde endereçada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. No texto, Lipietz questiona a posição do líder brasileiro em relação à guerra na Ucrânia e convida o petista a "não se enganar de combate".

O presidente brasileiro é alertado por ex-eurodeputado ecologista sobre polêmica tentativa de mediação da guerra na Ucrânia que irritou Kiev e aliados ocidentais.
O presidente brasileiro é alertado por ex-eurodeputado ecologista sobre polêmica tentativa de mediação da guerra na Ucrânia que irritou Kiev e aliados ocidentais. AP - Eraldo Peres
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Lipietz e Lula se conhecem desde 1984. O político ecologista francês afirma ter ficado "espantado" ao ouvir Lula criticar o presidente americano, Joe Biden, por "encorajar a continuidade da guerra na Ucrânia". Lipietz discorda do petista, a quem chama de companheiro, e afirma que o que Biden faz é "ajudar a magnífica resistência do povo ucraniano contra o invasor russo, que afirma insistentemente que só concebe uma paz: a que ratifica a conquista de cinco regiões da Ucrânia". Lipietz recorda ao presidente brasileiro que essas regiões [Lugansk, Donetsk, Kherson e Zaporíjia], incluindo a Crimeia, votaram a favor da independência da Ucrânia. 

"Pode ser difícil elogiar a ação dos Estados Unidos quando o povo brasileiro foi submetido a uma ditadura militar de 1964 a 1985, assim como os seus vizinhos Chile, Argentina e outros, no âmbito da Operação Condor, dirigida pela CIA por baixo do pano. Para estar do mesmo 'lado' dos Estados Unidos. Mas você sabe que não são os países que formam os 'campos', mas sim os trabalhadores, os democratas, as feministas, os ecologistas, contra os que exploram, oprimem, pilham. Um país pertence a um 'campo' de acordo com o seu governo. E a Rússia de Putin está no 'campo' de Bolsonaro, Médici, Videla, Galtieri, Pinochet, etc.", diz a carta.

O ex-eurodeputado, que foi vice-presidente da Assembleia Parlamentar Euro-latino-americana, critica o fato de Lula se recusar a aplicar simples sanções econômicas contra um país [a Rússia] "que viola escandalosamente o direito internacional, cujas tropas saqueiam, violam, executam, torturam, roubam milhares de crianças e cujos bombardeios privaram voluntariamente um povo inteiro de aquecimento e electricidade durante o inverno ucraniano".

Dirigindo-se ao petista, Lipietz argumenta em tom indignado: "Ao invés de criticar o invasor, o senhor critica aquele que mais ajuda o país invadido e censura [os Estados Unidos] por retardar a rendição da Ucrânia!".

Na sequência, o ecologista afirma com ironia que Lula se oferece para ser um mediador no conflito, mas considera a iniciativa desnecessária, uma vez que a "Turquia e o secretário-geral das Nações Unidas fazem esse papel e nunca interromperam o diálogo com a Ucrânia e a Rússia para trocar prisioneiros e assegurar o fornecimento de trigo pelo Mar Negro".

Mediação brasileira desnecessária

"Atualmente, a agressividade russa coloca todos os governos e povos do mundo contra a parede. Assim como entre 1936-1939, a não intervenção diante do pronunciamento de Franco [ditador espanhol], a agressão da Etiópia e o desmantelamento da Tchecoslováquia levaram à guerra mundial, encorajando os excessos fascistas. A não intervenção daqueles que condenam mas nada fazem, ou mesmo ajudam comercialmente o agressor, nos conduz a uma nova guerra mundial", destaca Lipietz na carta. 

O ex-deputado francês recorda que Vladimir Putin não esconde seus objetivos: ele quer reconstituir o grande Império Russo de Catarina 2ª e de Stálin. "Depois da Ucrânia, será a Geórgia, a Moldávia, os Estados Bálticos, a Polônia, a Finlândia etc." Estes países compreenderam muito bem esse risco, por isso ajudam a resistência ucraniana na medida de suas possibilidades, destaca o texto.

Ao concluir seu questionamento, Alain Lipietz pergunta ao presidente Lula se ele vai deixar "na história a memória do líder de um grande país que soube, a tempo, dizer a Vladimir Putin: "Pare! Recue", além de adotar medidas para obrigá-lo a fazê-lo. Ou se, pelo contrário, será lembrado por ter dito: "Deixem Putin anexar o que já conquistou, e tanto mais quanto quiser e puder...?". 

Por fim, Lipietz escreve: "Do homem, do companheiro que conheci, só espero a primeira resposta. E que ela venha o mais depressa possível, senhor Presidente".

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