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Um pulo em Paris

Metade das francesas já foi forçada a práticas sexuais inspiradas no pornô

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Uma pesquisa do Instituto Francês de Opinião Pública (Ifop) revelou dados preocupantes nessa semana: uma a cada duas francesas diz ter sido submetida, contra sua vontade, a práticas sexuais baseadas em pornografia. O estudo vêm à tona em um momento em que a Assembleia de Deputados do país analisa um projeto de de lei sobre segurança digital que pretende lutar contra o acesso de menores a conteúdos inapropriados.

A má influência da pornografia. Metade das mulheres da França afirmam terem iniciado suas vidas sexuais com práticas inspiradas em pornografia
A má influência da pornografia. Metade das mulheres da França afirmam terem iniciado suas vidas sexuais com práticas inspiradas em pornografia AFP - STEPHANE DE SAKUTIN
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Daniella Franco, da RFI

A exposição de menores à pornografia “é um escândalo de saúde pública”, segundo o ministro francês encarregado das Questões Digitais, Jean-Noël Barrot. A afirmação não é exagerada: a cada mês, dois milhões de crianças são expostas a conteúdos pornôs aqui na França, principalmente meninos. Com 12 anos, a metade dos garotos franceses já tiveram acesso aos chamados “vídeos X”.

Não é à toa que o projeto de lei mira em plataformas pornôs, encarregando a Autoridade da Regulação da Comunicação Audiovisual e Digital da França a garantir que conteúdos pornográficos online não possam ser acessíveis a menores. Atualmente, para entrar em plataformas que disponibilizam “vídeos X” basta clicar em um botão afirmando que o usuário tem mais de 18 anos. Uma situação “irresponsável e covarde”, diz Barrot, que lembra que em sites como o Pornhub cerca de 20% dos acessos são feitos por crianças.

O principal desafio das autoridades francesas é controlar a idade dos usuários de sites pornôs. No entanto, os consumidores de conteúdos X são anônimos.

O relator do projeto de lei, o centrista Paul Midy, preconiza o fim do anonimato na internet, que segundo ele, dá aos internautas “um sentimento de imunidade”. Por isso o deputado defende que para a criação de perfis ou contas na internet seja exigido um comprovante de identidade, uma ideia que, para muitos parlamentares franceses, fere as liberdades individuais.

Ainda assim, as gigantes do setor digital terão de ser mais transparentes sobre o seu funcionamento. Os algoritmos de empresas como Google, Amazon e Apple, deverão passar frequentemente por auditorias independentes. Essas companhias precisarão compartilhar os dados coletados e também tornar mais acessível o processo de sinalização de conteúdos considerados “problemáticos”.

O texto também apresenta medidas para combater a disseminação de material pedófilo na internet. As empresas do digital vão ter que ser mais reativas ao detectarem pornografia infantil, retirando conteúdo do ar em um prazo de 24 horas, sob o risco do pagamento de uma multa de €250 mil.

Segundo um estudo do Instituto Francês de Opinião Pública, 34% de consumidores regulares adultos de filmes pornôs admitem que nem sempre solicitaram o consentimento de suas parceiras ou parceiros sexuais para certas práticas.
Segundo um estudo do Instituto Francês de Opinião Pública, 34% de consumidores regulares adultos de filmes pornôs admitem que nem sempre solicitaram o consentimento de suas parceiras ou parceiros sexuais para certas práticas. AFP - GABRIEL BOUYS

Consequências da pornografia a menores

Especialistas advertem que a exposição precoce a conteúdos pornográficos pode ter graves consequências para o desenvolvimento e a saúde mental das crianças e adolescentes: traumas, crises de ansiedade, distúrbios do sono, e, em casos mais graves, até depressão. O neurocientista americano Donald Hilton defende que a pornografia pode modificar até o cérebro de crianças, definindo certos comportamentos e preferências. Segundo ele, o acesso a conteúdos pornôs na infância e adolescência também resultará em uma imagem errônea da sexualidade, banalizando as violências psicológicas, físicas e sexuais.

A pesquisa divulgada pelo Ifop também mostra que crianças e adolescentes expostos à pornografia desprezam o não-consentimento. Entre os entrevistados, 34% de consumidores regulares adultos de filmes pornôs admitem que nem sempre solicitaram a permissão de suas parceiras ou parceiros sexuais para certas práticas.

O ginecologista e pesquisador francês Israel Nisand, um dos maiores especialistas em sexualidade na França, vai mais longe e classifica a pornografia como “uma educação ao não-consentimento”. Em entrevista ao jornal Le Figaro, ele aponta que meninos ou adolescentes que têm acesso a conteúdos pornôs desenvolvem uma imagem extremamente degradante das mulheres.

Já as garotas, segundo Nisand, criam uma imagem completamente deturpada de seus corpos. “Há um aumento de jovens, até meninas de 16 anos, que vêm nos consultar sobre cirurgia de vulva”, diz, ao relatar o desejo de garotas que suas genitálias se assemelhem às das atrizes de filmes pornôs.

Vídeos com sinalização de “comportamento ilegal”

O texto do projeto de lei também prevê uma imposição às plataformas de conteúdo pornô de um aviso de “comportamento ilegal” em vídeos que simulam crimes ou delitos. Um relatório divulgado no final de setembro pelo Alto Conselho para a Igualdade Entre Mulheres e Homens apontou que 90% dos conteúdos pornográficos se caracterizam pela violência física, sexual ou verbal, o que os torna “penalmente repreensíveis”.

Essa instância independente trabalhou durante um ano e meio sobre as violências contra as mulheres que atuam na indústria pornográfica, onde são “estereotipadas, desumanizadas, violentadas e torturadas”. O relatório também denuncia as consequências do acesso de adultos a conteúdos pornôs, como a disseminação da cultura do estupro, das violências contra as mulheres, da apologia ao incesto e da pedofilia.

O Alto Conselho para a Igualdade Entre Mulheres e Homens destaca que dezenas de personalidades da indústria pornô francesa estão sendo investigadas por vários crimes, entre eles estupros coletivos, proxenetismo e tortura. O relatório lembra que a plataforma Pornhub, uma das mais acessadas na França, também está na mira da justiça dos Estados Unidos, acusada de tráfico sexual e pedocriminalidade.

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