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“Morte e Vida Severina” é publicado em livro pela primeira vez na França

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O poema mais popular de João Cabral de Melo Neto chega nesta sexta-feira (17) às livrarias francesas pela editora Chandeigne, em uma edição bilingue. A tradução é de Mathieu Dosse que também assina a versão francesa de “Essa Gente”, de Chico Buarque, lançada no início de fevereiro pela Gallimard.

Mathieu Dosse traduziu "Morte e Vida Severina", lançado pela primeira vez em livro na França pela editora Chandeigne.
Mathieu Dosse traduziu "Morte e Vida Severina", lançado pela primeira vez em livro na França pela editora Chandeigne. © RFI
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"Mort et vie sévérine”, de João Cabral de Melo Neto, é lançado em livro pela primeira vez em francês quase 70 anos depois de sua criação, em 1955. Como explicar que o poema mais popular do poeta pernambucano, um dos mais importantes do Brasil, tenha ficado inédito até agora? “Não tenho resposta, não tenho explicação”, confessa Mathieu Dosse.

A incógnita é ainda maior quando se sabe que o poema, escrito como um auto de Natal para o teatro, já tinha sido traduzido para o francês e feito muito sucesso na França. Musicada por Chico Buarque, a montagem da companhia Tuca foi encenada pela primeira vez no país no Festival Internacional de Nancy, em 1966. Foi inclusive na França que João Cabral assistiu à “Morte e Vida Severina” pela primeira vez. Recentemente, em 2017, a peça ganhou uma nova versão e voltou aos palcos franceses.

"Mort et vie séverine" (Morte e Vida Severina), traudizido por Mathieu Dosse e publicado pela Chandeigne, chegou às livrarias nesta sexta-feira, 17 de fevereiro de 2023.
"Mort et vie séverine" (Morte e Vida Severina), traudizido por Mathieu Dosse e publicado pela Chandeigne, chegou às livrarias nesta sexta-feira, 17 de fevereiro de 2023. © Divulgação/Chandeigne

No ano passado, Mathieu Dosse também foi responsável pela versão francesa das primeiras poesias publicadas em livro de João Cabral de Melo Neto: “Poemas Escolhidos” (Gallimard). Ele diz que quando começou a traduzir o poema dramático sobre o retirante Severino se deu conta de que o texto “funciona em francês” e decidiu com a editora Anne Lima, da Chandeigne, publicar o livro, que é lançado em versão bilingue. “A ideia é que o livro possa ser lido tanto pelos brasileiros, franco-brasileiros, quanto pelos franceses que não leem em português”, conta.

A obra também traz um pequeno glossário, no prefácio, com termos regionais, como sertão, engenho, caatinga, bangoué, sesmaria, que tradutor preferiu deixar no original. “O leitor francês não conhece o Brasil do Nordeste e do ciclo da cana de açúcar. Mas são poucas palavras, umas dez ou 12, que não têm tradução”, explica.

O tradutor Mathieu Dosse
O tradutor Mathieu Dosse © RFI

Ainda atual

Quase 70 anos depois, “Morte e Vida Severina”, que é um texto narrativo, continua atual na opinião de Mathieu Dosse. “A situação do retirante, que eu traduzi por ‘migrant’ (migrante) pode ser a história de qualquer migração. É uma história que tem a sua atualidade total. A guerra dos sem terra, tudo isso, não envelheceu nada!”.

Mathieu Dosse desponta como um dos melhores tradutores do momento na França. Ele foi contemplado com o Grande Prêmio de Arles, em 2016, e com o Prêmio Books-Gulbenkian, em 2017, pela tradução de “Meu Tio Iauaretê” (Mon oncle le jaguar & autres histoires), de Guimarães Rosa. Ele considera os dois autores difíceis de traduzir, mas a dificuldade de João Cabral é outra. 

“A dificuldade dele não é tanto encontrar as palavras. É uma outra busca. É mais no ritmo mesmo. Morte e Vida Severina, em português, tem essa oralidade, essas rimas toantes em ‘A’, ‘L’, ‘Ao’ ‘O’, e em francês é dificílimo fazer isso”, revela.

“Essa Gente” de Chico Buarque

Outro autor que requer um modo “diferente” de traduzir é Chico Buarque. Mathieu Dosse fez a tradução de “Essa Gente” (Ces Gens-là), o sexto romance do escritor e compositor que acaba de ser publicado em francês, pela Gallimard.  “O curioso é que esses dois livros, que foram traduzidos em períodos diferentes, saíram com duas semanas de intervalo. Eu escrevo no prefácio do ‘Morte e Vida Severina’ sobre o Chico. Tanto o Chico Buarque deve ao Cabral, quanto o João Cabral deve ao Chico Buarque. Quer dizer, os dois são muito ligados”, salienta.

"Ces gens-là" (Essa Gente", sexto romance de Chico Buarque traduzido para o francês, foi lançado em 2 de fevereiro de 2023.
"Ces gens-là" (Essa Gente", sexto romance de Chico Buarque traduzido para o francês, foi lançado em 2 de fevereiro de 2023. © Divulgação/Gallimard

Os “universos” dos dois escritores são diferentes, mas o Chico “é genial também”, aponta o tradutor. “Essa gente” é um livro contemporâneo que se passa no Rio de Janeiro. A história foi escrita entre 2018 e 2019, após a posse de Bolsonaro. Narrada por Duarte, um escritor sem inspiração e decadente, a tragicomédia espelha a deliquescência do país. De acordo com Mathieu Dosse a estilo de Chico, nessa “crítica que ele faz do Brasil de hoje, é uma escrita muito divertida. É um livro engraçado, que tem um lado muito cômico, humor negro muito forte e é muito bom. Estou feliz que esses dois livros estejam saindo ao mesmo tempo”.

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