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Rendez-vous cultural

Cancelamento de artistas pró-Putin e solidariedade a ucranianos marcam "guerra cultural" na França

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Se em tempos de paz a cultura atua muitas vezes como moeda diplomática, o famoso soft power, em tempos de guerra seu papel assume tons mais sombrios, como mostram as ações movidas pelos atores culturais na França, após a invasão da Ucrânia. Se a guerra atualmente é híbrida, não há combatentes melhores que os artistas, experts em construir narrativas e convocar emoções. Da Bienal de Veneza ao Carnegie Hall, passando pela Filarmônica de Paris, o mundo ocidental manda seu recado à Rússia.

Valery Gergiev, na foto de 1º de maio de 2013, depois de uma "avant-première" para veteranos e altos funcionários do teatro no novo Teatro Mariinsky, na véspera da abertura oficial do mesmo, em São Petersburgo, Rússia. Gergiev, um maestro próximo do Presidente russo Vladimir Putin, não estará mais à  frente da Filarmônica de Viena numa turnê norte-americana de cinco concertos que começa no Carnegie Hall na sexta-feira (4) à noite. Ele também foi excluido de apresentações na Filarmônica de Paris.
Valery Gergiev, na foto de 1º de maio de 2013, depois de uma "avant-première" para veteranos e altos funcionários do teatro no novo Teatro Mariinsky, na véspera da abertura oficial do mesmo, em São Petersburgo, Rússia. Gergiev, um maestro próximo do Presidente russo Vladimir Putin, não estará mais à frente da Filarmônica de Viena numa turnê norte-americana de cinco concertos que começa no Carnegie Hall na sexta-feira (4) à noite. Ele também foi excluido de apresentações na Filarmônica de Paris. © AP - Dmitry Lovetsky
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Na França, da Ópera Nacional de Paris ao Festival de Avignon, muitas instituições culturais expressaram seu apoio "ao povo e aos artistas ucranianos" nos últimos dias. Mas artistas ucranianos que vivem na França também estão se mobilizando.

É o caso, por exemplo, do famoso Quarteto Elysée, que inclui o violinista ucraniano Andrei Malakhov. Com seu grupo, ele decidiu gravar uma peça do repertório de um jovem compositor ucraniano, conforme contou em entrevista à RFI: "A iniciativa seria gravar um quarteto de cordas composto por o compositor e violonista ucraniano, Ilia Bondarenko, que tem 20 anos e está atualmente sob os bombardeios em Kiev", diz. "É uma música muito poderosa e sombria, e que traz um elemento inédito e precursor - os alarmes antiaéreos em primeiro plano", revela Malakhov.

"Primeiro, vamos divulgar um vídeo tocando o quarteto para apoiá-lo, mas também estamos preparando, com músicos ucranianos e franceses e com o apoio da comunidade ucraniana na França, um concerto solidário para ajudar a Ucrânia, será provalemente na subprefeitura do 15° distrito de Paris, no dia 21 de março. E buscamos eventualmente também uma segunda data", declarou o músico.

Nesta sexta-feira, 4 de março, a partir das 20h pelo horário da França, os canais de TV e rádio Culturebox e France Culture, que fazem parte do serviço público francês, farão uma vigília de cinco horas de apoio à Ucrânia no Teatro Nacional da Dança, o Palais de Chaillot, em Paris, que será transmitida ao vivo pela internet.

Combate às fake news e acolhimento de artistas

O cineasta ucraniano Igor Minaiev, 68 anos, que vive em Paris há vários anos, conversou com a RFI sobre sua vida depois da invasão, pontuada por telefonemas para seus amigos em Kiev e Kharkiv.

"Todo dia de manhã eu telefono ou escrevo para todo mundo, começo por Kiev, depois Karkhiv e na sequência Odessa, para ficar por dentro de onde eles estão, e sobretudo como passaram a noite, que é o período mais angustiante", relata o diretor. "Tento trocar informações, porque existem muitas fake news circulando, então tento saber ao certo como as coisas estão acontecendo na realidade, se eles têm o que comer, se têm eletricidade, água, aquecimento", diz Minaiev.

"Há alguns ucranianos que descem para dormir nos abrigos anti-bombardeios, sobretudo em Kiev. Outros que dizem que não descem mais, dormem no corredor, no banheiro", conta o cineasta. "Também repasso informações que temos aqui no Ocidente. Para eles é um incentivo saber que praticamente todos os veículos de imprensa na França falam deles o tempo todo e que não estão abandonados. Não poderíamos imaginar essa ajuda da Europa e do resto do mundo. Passamos por tantas coisas, e agora, todo mundo está conosco", vibra.

Lucie Berelowitsch, diretora do Centro Nacional de Teatro da Normandia, falou sobre o desejo de ajudar os artistas na Ucrânia. "Uma parte dos artistas ucranianos ficou no país e se mobiliza de todas as maneiras possíveis, tomando a palavra e organizando redes de ajuda entre eles. Hoje em dia a questão não é saber que hospitalidade poderemos lhes oferecer, mas como ajudá-los na Ucrânia", sublinha a diretora.

"Estamos criando redes de solidariedade com a Polônia e a Romênia para que possamos ajudar de maneira rápida no acolhimento dos artistas. Eles dizem que sentem uma mobilização muito grande por parte da Europa e que isso é muito importante para eles. Eles dizem sentir a necessidade de lutar para continuarem livres, simplesmente", afirma Berelowitsch.

Cancelamento

Mas não só de solidariedade que a guerra cultural é feita. Na França, o nome Valery Gergiev é o emblema de uma verdadeira ruptura cultural. O maestro russo pró-Putin, ao mesmo tempo diretor geral do prestigioso Teatro Mariinsky em São Petersburgo e até então um dos maestros mais procurados do mundo, foi ostracizado e está enfrentando uma onda de cancelamentos como um sinal de "solidariedade com o povo ucraniano". Depois do Carnegie Hall em Nova Iorque e dos prestigiosos festivais suíços em Verbier e Lucerna, a Filarmônica de Paris cancelou a presença de Gergiev, agendada para 9 e 10 de abril.

Na Bienal de Veneza deste ano não foi diferente: a equipe do pavilhão ucraniano cancelou sua participação, ao mesmo tempo em que convocou no Instagram "a comunidade artística internacional a usar toda nossa influência para deter a invasão russa da Ucrânia". Uma mensagem que foi ouvida. Na segunda-feira 28 de fevereiro, a equipe russa em Veneza renunciou à sua participação no evento, anunciando que o pavilhão russo permaneceria fechado na abertura da Bienal em abril, para não servir de justificativa para uma invasão militar.

Assista a mensagem das artistas ucranianas do cabaré punk Dakh Daughters:

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