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Planeta Verde

Eleição francesa: crise ambiental é ignorada até por Macron na campanha para a presidência

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A 10 dias do primeiro turno das eleições presidenciais francesas, um tema crucial acabou negligenciado na campanha, ofuscado pela guerra na Ucrânia: a crise climática. Apesar de a França desempenhar um papel protagonista sobre a questão no âmbito internacional, no plano interno os desafios ambientais foram pouco abordados pela maioria dos candidatos.

Franceses protestam pelo clima nas ruas de Paris, em manifestação de 12/03/2022.
Franceses protestam pelo clima nas ruas de Paris, em manifestação de 12/03/2022. AFP - ALAIN JOCARD
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Antes mesmo do conflito no leste europeu, o assunto só ocupava 3% do tempo de fala na corrida presidencial, apontou um levantamento da organização Amigos da Terra. Já em fevereiro, a ausência da ecologia no debate presidencial francês levou um grupo de mais de 1,4 mil pesquisadores da área a publicar um apelo por mais destaque à crise climática. A diretora emérita de pesquisas do CNRS (Centro Nacional de Pesquisas Científicas), Amy Dahan, especialista nas relações entre a política e os estudos do clima, foi uma das signatárias do texto.

“Eles entram pouco nos verdadeiros problemas que estão colocados. Reduzem demais o debate a polêmicas como a favor ou contra a energia nuclear, a favor ou contra as eólicas, mas os perigos que nos ameaçam não se resumem a essas questões”, afirma Dahan. "Quem vai pagar os investimentos que precisaremos fazer? Precisamos entrar numa nova perspectiva e, para isso, saber quais são as novas políticas que nos preparam melhor para enfrentar esses novos desafios – mas isso não está, definitivamente, na ordem do dia da campanha”, lamenta a especialista.

Programas de governo vagos ou inexistentes

O ecologista Yannick Jadot, em sexto lugar nas pesquisas de intenções de voto, é o único a colocar as preocupações ambientais no centro das suas propostas, qualquer que seja a área de atuação. O candidato da esquerda radical, Jean-Luc Mélenchon (França Insubmissa), cotado entre 12 a 15% dos votos, é considerado o segundo mais “verde" entre os que disputam a presidência, com um ambicioso programa ambiental, enquanto a socialista Anne Hidalgo (2%), conhecida pela transformação ambiental na prefeitura de Paris, também dá atenção especial ao tema, embora com propostas menos consistentes.

Entretanto, em meio à maior alta da inflação em 14 anos no país e aos preços exorbitantes dos combustíveis, os dois têm preferido centralizar o foco nas políticas sociais.

Os 12 candidatos nas eleições presidenciais francesas de 2022, em ordem alfabética de cima à esquerda para baixo à direita: Nathalie Arthaud, do partido "Luta Operária, François Asselineau, do França De Pé, Anne Hidalgo, do Partido Socialista, Yannick Jadot, do Europa Ecologia - Verdes, Jean Lassalle, do Resistamos!, Marine Le Pen, do Reunião Nacional, Emmanuel Macron, do República em Marcha, Jean-Luc Melenchon, do França Insubmissa, Valerie Pécresse, do Republicanos,  Philippe Poutou, do Novo Partido Anticapitalista, Fabien Roussel, do Partido Comunista Francês (PCF), Helene Thouy, do Partido Animalista, e Eric Zemmour, do Reconquista!
Os 12 candidatos nas eleições presidenciais francesas de 2022, em ordem alfabética de cima à esquerda para baixo à direita: Nathalie Arthaud, do partido "Luta Operária, François Asselineau, do França De Pé, Anne Hidalgo, do Partido Socialista, Yannick Jadot, do Europa Ecologia - Verdes, Jean Lassalle, do Resistamos!, Marine Le Pen, do Reunião Nacional, Emmanuel Macron, do República em Marcha, Jean-Luc Melenchon, do França Insubmissa, Valerie Pécresse, do Republicanos, Philippe Poutou, do Novo Partido Anticapitalista, Fabien Roussel, do Partido Comunista Francês (PCF), Helene Thouy, do Partido Animalista, e Eric Zemmour, do Reconquista! © AFP - JOEL SAGET,ERIC FEFERBERG,PATRICK KOVARIK

Confortável com cerca de 30% de intenções de votos nas pesquisas, o atual presidente, Emmanuel Macron (República em Marcha), tem se preocupado mais em exercer o cargo do que em fazer campanha. Seu programa de governo, revelado a menos de um mês do primeiro turno, não propõe medidas à altura dos desafios do clima, lamentam organizações ambientalistas.

Ao analisar em detalhes os programas de todos os candidatos, a rede de organizações ambientalistas Ação Clima colocou o projeto de Macron entre os últimos colocados, julgando que “não apresenta solução a curto e a médio prazo para as energias renováveis e tem propostas limitadas para os transportes”.

Já os candidatos da direita conservadora, Valérie Pécresse, do Republicanos, e principalmente da extrema direita, Marine Le Pen, do Reunião Nacional e Éric Zemmour (Reconquista!), dedicam pouco ou nenhum espaço ao assunto em seus programas de governo.

Desconexão com preocupações da população

“Para começar, acho que alguns dos candidatos, sejam de direita ou de esquerda, são bastante incompetentes sobre o assunto, não conhecem nada. Respondem que a França é pequena, é responsável por apenas 1% das emissões e por isso não haveria nada a ser feito”, critica a professora emérita do CNRS. “Porém o clima, a biodiversidade e outros aspectos são cada vez mais importantes para o nosso país e a população – e ela está claramente preocupada com isso, como mostram todas as pesquisas. Um terço dos habitantes da França já foi atingida por ondas de calor, tempestades, enchentes, e se preocupa em saber o que vai acontecer”, ressalta.

Uma sondagem do instituto Ipsos mostrou que, entre os eleitores de até 30 anos, a crise climática é o segundo problema que gera mais preocupação, atrás apenas do poder aquisitivo. A pesquisadora sublinha que, apesar de praticamente ignorados na campanha, os desafios diante de qualquer presidente serão cada vez maiores para o enfrentamento não só das causas do aquecimento do planeta – ou seja, a redução de emissões de gases de efeito estufa –, como as consequências do problema.

Os próximos anos, frisa Amy Dahan, serão determinantes para os países conseguirem limitar a alta de temperaturas a menos de 2ºC até o fim do século, como estipula o Acordo de Paris sobre o Clima.

"Se os franceses não têm a chance de escolher e a palavra deles não é ouvida sobre tudo isso e todos os riscos envolvidos, como podemos considerar que uma democracia está funcionando bem? Eu também acho que os candidatos, por uma certa covardia, evitam abordar assuntos que incomodam e que exigiriam algumas reorientações drásticas na sociedade, e então preferem se calar sobre os grandes problemas que teremos de enfrentar”, analisa a cientista.

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