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Destruição em Gaza faz especialistas pedirem que crime de "domicídio" seja criado

Israel volta a ser acusado de “domicídio”, após três meses de ofensiva em Gaza. O termo foi utilizado pela primeira vez por três relatores da ONU em fevereiro deste ano, em relação à destruição de casas na Cisjordânia por colonos israelenses. A noção, que ainda não existe de maneira oficial no mundo jurídico, faz referência à destruição sistemática de domicílios, como explicou à RFI a advogada em direito penal internacional e ex-jurista do Tribunal Penal Internacional, Clara Gérard-Rodriguez.

Palestinos desabrigados, que fugiram de suas casas devido aos bombardeios israelenses em um campo em Rafah, na Faixa de Gaza, em 6 de dezembro de 2023.
Palestinos desabrigados, que fugiram de suas casas devido aos bombardeios israelenses em um campo em Rafah, na Faixa de Gaza, em 6 de dezembro de 2023. REUTERS - IBRAHEEM ABU MUSTAFA
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Com as operações militares israelenses na Faixa de Gaza, a população é obrigada a fugir para o sul do enclave e muitas casas foram destruídas. Alguns comparam esses movimentos a uma segunda Nakba, como é chamado o êxodo dos palestinos na época da criação do Estado de Israel, em 1948. Para Clara Gérard-Rodriguez, é necessária uma investigação para qualificar as ações do exército israelense.

A palavra é usada no meio acadêmico e não é um conceito jurídico inscrito no direito internacional, como genocídio ou crime contra a humanidade. “Mas existem cada vez mais pedidos para ser integrado, para ser objeto de um status, ou de uma revisão do status do Tribunal Penal Internacional para que se transforme em um crime diferente dos outros crimes internacionais que já existem”, explica a advogada.

Segundo a ONU, 1,9 milhão de pessoas, ou cerca de 85% da população, foram deslocadas pela guerra na Faixa de Gaza, onde mais da metade das casas foram destruídas ou danificadas, obrigando os habitantes do enclave a se refugiarem em escolas, igrejas, hospitais e em prédios das Nações Unidas.

Apesar da destruição de casas ser tão antiga quanto a própria guerra, “é realmente a situação tanto em Gaza como na Cisjordânia que está levando alguns especialistas a fazer apelos para a adoção de um novo conceito de lei relativamente a esta destruição maciça e sistemática de locais de residência”, diz Gérard-Rodriguez.

“O que temos de compreender é que o ato de destruição de locais de residência não está autorizado no direito penal internacional. Na realidade existem outros conceitos, outros crimes que podem ser aplicados a tais ações”, diz a especialista. “Em primeiro lugar, existem crimes de guerra que podem ser dirigir ataques contra objetos civis que não são objetivos militares, incluindo, portanto, locais de residência. Ainda existe o ato de lançar ataques que causam danos à propriedade civil, e em particular ao local de residência”, enumera.

Apesar disso, ela defende que faz sentido criar este crime. “O que os especialistas pedem é mais do que a criação, portanto, de um novo crime de guerra, seria a criação ou incorporação deste conceito como crime contra a humanidade. O que deve ser entendido é que os crimes contra a humanidade, ao contrário dos crimes de guerra, visam uma prática, uma ação que pode ser cometida tanto em tempos de guerra, como também em tempos de paz, e que faz parte de um ataque sistemático ou generalizado contra uma população civil”, explica.

O Tribunal Penal Internacional julga crimes contra a humanidade, cometidos contra populações e pessoas, como homicídios, redução a condições de escravidão, estupros, tortura e perseguições. Mas não trata de crimes cometidos contra bens civis.

Israel comete "domicídio"?

Para a advogada, é difícil afirmar que Israel está cometendo “domicídio”, já que o conceito não existe realmente no direito. “Isso está sendo surgindo, mas para poder dizer se um crime é constituído, seria necessário que um crime seja estabelecido especificamente por um texto penal com elementos constitutivos, e depois ser verificado se todos esses elementos estão constituídos no caso”, explica.

Sobre as acusações de que Israel estaria buscando fazer uma nova Nakba, com a expulsão dos palestinos da Faixa de Gaza, a advogada insiste que seria necessário oferecer provas disso. “Mais uma vez, as provas serão necessárias e é por isso que me parece que o que é realmente essencial hoje é pedir investigações internacionais independentes sobre o que está acontecendo hoje em Gaza para que todas as evidências possam ser coletadas e analisadas para serem qualificadas com a maior precisão possível”, insiste.

Desde o começo do conflito, mais de 17.000 pessoas morreram em Gaza, sendo 70% delas mulheres e crianças com menos de 18 anos, mortas por bombardeios israelenses, de acordo com o Ministério da Saúde do Hamas.

Mais de 1.400 pessoas morreram em Israel no ataque do Hamas em 7 de outubro, segundo o governo israelense, e 126 reféns continuam nas mãos do movimento islâmico palestino.  

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