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Nova dinâmica deixa Brics mais 'heterogêneo' para fazer 'frente ao império americano', diz pesquisador

Os representantes do Brics (Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul), em Joanesburgo, anunciaram quinta-feira (24) uma expansão apresentada como "histórica" ​​do bloco de países emergentes com a integração de seis novos membros. São eles: Argentina, Irã, Egito, Etiópia, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos, que também se juntam ao grupo, anunciou o presidente sul-africano, Cyril Ramaphosa.

O grupo do Brics vai passar a contar com mais seis países a partir de 1° de janeiro de 2024.
O grupo do Brics vai passar a contar com mais seis países a partir de 1° de janeiro de 2024. AFP - MARCO LONGARI
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O presidente chinês, Xi Jinping, saudou “uma expansão histórica” e previu um “futuro brilhante para o Brics”. Peso pesado econômico do bloco, Pequim se mostrou favorável ao movimento, no centro desta 15ª cúpula iniciada na terça-feira (22) e que termina nesta quinta-feira (24) à noite.

Em entrevista à RFI, Pedro Salama, professor emérito na Sorbonne, pesquisador do Centro Nacional de Pesquisa Científica da França e autor de "Contágio Viral. Difusão econômica. Riscos políticos na América Latina” (em tradução livre), apontou que vê muito mais uma coerência política do que econômica, entre os novos membros do bloco.

"Economicamente esses países são mais heterogêneos, como o caso da Etiópia em comparação com a Arabia Saudita, a diferença de PIB por habitante é de 30 vezes maior na Arabia Saudita. Eu acho que o Brics já era heterogêneo, mas agora o é excessivamente", opinou.

Cerca de 40 países espalhados por todo o mundo solicitaram adesão ou manifestaram interesse em integrar o bloco, como a Algéria e a Venezuela, que acabaram não sendo aceitos no Brics: "Eu fiquei surpreso com a velocidade dessa decisão de adicionar logo seis países, tão diferentes uns dos outros", relatou o professor, que disse que como o bloco "já haviam aceitado o Egito, seria difícil juntar a Argélia".

Os novos membros do Brics: Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Argentina, Irã e Etiópia.
Os novos membros do Brics: Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Argentina, Irã e Etiópia. © RFI composite

Salama considera que o ator decisivo nas escolhas foi a China, que teria dado preferência aos países mais próximos economicamente de Pequim, o que justificaria a tendência de aceitar, por exemplo, a Argentina - mesmo diante inflação alta e crise econômica - no lugar da candidatura da Venezuela. "Eu creio que seja fundamentalmente uma questão de equilíbrio de poderes", constatou.

Nenhuma informação foi passada sobre o conteúdo das discussões ou os critérios utilizados na escolha estratégica dos novos participantes. As negociações foram conduzidas a portas fechadas durante uma sessão plenária e durante várias reuniões bilaterais.

O grande interesse no Brics é um sinal da crescente influência dos países emergentes no cenário mundial, que juntos produzem um quarto da riqueza e reúnem 42% da população mundial. Imediatamente após o anúncio, Teerã saudou no X (ex-Twitter) “um sucesso estratégico para a política externa do país”.

O primeiro-ministro etíope, Abiy Ahmed, falou de “um destaque” para o seu país. “A Etiópia está pronta para cooperar com todos para uma ordem mundial inclusiva e próspera”, publicou ele nas redes sociais. Os Emirados Árabes Unidos também celebraram, com o presidente Mohammed bin Zayed afirmando “respeitar a visão dos líderes dos Brics”. O mesmo se aplica ao Egito, que disse estar ansioso por “fazer ouvir a voz dos países do Sul”.

Mesmo heterogêneos, os Brics têm em comum a exigência de um equilíbrio global mais inclusivo, em particular no que diz respeito à influência dos Estados Unidos e da União Europeia. 

"[Esta nova aliança] é tradutor político de uma oposição, de uma nova zona, que faz frente ao império americano. Creio que haja uma mudança de império americano para um império chinês. Sou um entusiasta pela vinda deste novo eixo", declarou Salama.

Já o chefe da ONU, António Guterres, observa que “estamos a caminho de um mundo multipolar”, que devem refletir “as realidades econômicas de hoje”.

Dinâmicas futuras

O Irã, que não tem relações diplomáticas com Washington, “é um acréscimo controverso e sem dúvida ligado a um pedido da Rússia”, dependente do Mar Negro para o comércio, explica Gustavo de Carvalho, investigador em Relações Internacionais baseado na África do Sul.

O Irã, a Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos “têm todos um enorme peso econômico e o seu petróleo preserva os seus interesses”, observa Chris Landsberg, especialista em política externa da Universidade de Joanesburgo.

Pretória, que faz campanha por maior representatividade da África, venceu a rodada com a integração de dois países do continente ao bloco. Mas, no geral, “haverá muito a descobrir sobre o impulso futuro criado por esta expansão”, disse Carvalho.

Observadores dizem que os membros do bloco devem equilibrar a proximidade com Pequim e Moscou com o risco de se afastarem de um importante parceiro comercial como Washington. Os líderes do bloco reafirmaram a sua posição “não-alinhada” em Joanesburgo, numa altura em que as divisões foram acentuadas pelo conflito ucraniano. Mas Washington disse esta semana que não vê os Brics como futuros “rivais geopolíticos”.

Importância do bloco continua a crescer

“O papel e a importância dos Brics no mundo continuam a crescer”, disse Vladimir Putin, que possui um mandado de prisão internacional por crimes de guerra na Ucrânia e, portanto, ausente da reunião de cúpula, na qual participou, por videoconferência.

O presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, defendeu abertamente a integração da Argentina, criticando os empréstimos "asfixiantes" de doadores internacionais. A Argentina é atormentada por uma inflação sem precedentes e luta para pagar uma dívida de US$ 44 bilhões ao FMI.

“Os Brics continuarão a se abrir para novos membros”, disse Lula, e “a ser a força motriz de uma nova ordem internacional”.

(Com AFP e RFI)

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