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Dia Mundial dos Oceanos: Entenda por que que eles ainda são pouco conhecidos e tão cobiçados

O Dia Mundial dos Oceanos é comemorado nesta quarta-feira (8). Eles cobrem mais de 60% da superfície do planeta, mas nós sabemos mais sobre a superfície da Lua do que sobre as profundezas dos mares e oceanos. Último espaço inexplorado na Terra, eles atraem um interesse crescente e levantam questões geopolíticas, econômicas e ambientais.

Um tubarão nada ao largo das Ilhas Midway, localizadas no Oceano Pacífico, a noroeste do Havaí (Ilustração).
Um tubarão nada ao largo das Ilhas Midway, localizadas no Oceano Pacífico, a noroeste do Havaí (Ilustração). AP - Wyland/NOAA
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O fundo do mar se estende pela esteira oceânica profunda, um verdadeiro subsolo sob o oceano. A 200 metros abaixo do nível do mar, quase não há luz. A partir de 1.000 metros, trata-se de um mundo de escuridão absoluta e um frio entre zero e quatro graus Celsius. A pressão é 100 a 1.000 vezes maior do que na superfície.

Há uma variedade de relevos: vastas planícies, montanhas, vulcões, cânions e trincheiras vertiginosas – a 11.000 metros de profundidade para a Fossa Mariana, por exemplo – e ocasionais infiltrações frias ou "chaminés" que cospem lavas extremamente quentes de sulfuretos, além de alguns tipos de lagos de salmoura onde a concentração de sal é muito alta.

"São tantas limitações que toda vez que o homem se aventura nesses espaços, é uma verdadeira proeza tecnológica e humana", escrevem os pesquisadores do Ifremer, um dos mais respeitados institutos de tecnologia marinha do mundo, situado na França.

Mas apesar destas condições extremas, a vida, embora muito rara, pôde se desenvolver ali, como explicou Éric Lesavre, vice-presidente da Advention, que acaba de publicar um estudo sobre o mar profundo para a Fondation de la Mer ("Fundação do Mar", em português). 

Uma carcaça de baleia a cada 10 km

O relatório descreve de maneira realista o fundo dos oceanos: "há alguns peixes imensos e grandes mamíferos abaixo de 1000 metros [você já ouviu falar do blobfish?], e a cada 10 km mais ou menos, há uma carcaça de baleia ou um tubarão muito grande que cai quase intacto no fundo do mar, e que oferece muito alimento para a biodiversidade local, que floresce sobre ele. Muitos organismos irão decompor a carcaça", publica a Fondation.

Interesses farmacêuticos e industriais

Perto das "chaminés" marinhas que expelem lavas, "fomos capazes de identificar uma série de formas de vida que são muito diferentes do que aquela que encontramos na Terra. Esta não é uma vida baseada na fotossíntese, mas na quimiossíntese, por exemplo. São seres muito diferentes e variados, e provavelmente só conhecemos menos de 1% delas", continua Éric Lesavre.

Para Sabine Roux de Bézieux, presidente da Fondation de la Mer, os abismos, seus mistérios e maravilhas são "a grande fronteira do desconhecido no século 21". Por enquanto, é como o "Faroeste selvagem", diz ela. "Ao mesmo tempo, é uma área desconhecida que faz as pessoas sonharem, que desperta todo tipo de fantasias, um Eldorado incrivelmente rico. E é também uma zona sem leis, na qual o Direito internacional ocupará gradualmente seu lugar", enquanto o progresso tecnológico escancara as portas para este mundo subaquático.

As apostas são imensas. "Existem potenciais extremamente importantes em termos de saúde", diz Vincent Bouvier, ex-Secretário Geral do Mar, uma organização dependente do governo francês. Os cientistas esperam encontrar os medicamentos do futuro: antibióticos, anti-cancerígenos, analgésicos, etc. Além disso, "90% das patentes depositadas hoje sobre recursos genéticos marinhos provêm de fontes hidrotermais", observa o relatório da Fondation de la Mer, e "52% são detidas pela empresa alemã BASF".

"Estas águas profundas também são estratégicas de um ponto de vista militar. Por exemplo, para a proteção dos cabos submarinos", continua Vincent Bouvier. A grande maioria de nossas trocas não passa por satélites, mas por estes cabos. Trata-se de um imperativo que exigirá a adaptação e evolução das marinhas nacionais, diz.

E talvez o aspecto mais cobiçado das profundezas do mar seja sua riqueza em metais e terras raras. Estes minerais "estratégicos" são essenciais para a transição ecológica e digital que o planeta se comprometeu. Eles são usados na fabricação de baterias para carros elétricos, turbinas eólicas, drones e painéis solares", diz o estudo. A demanda está explodindo e a Europa, em particular, está buscando conquistar a independência da China, que abastece quase todas as terras raras que consome.

Ambiente frágil e complexo

No último Congresso Mundial de Conservação, mais de 60% dos Estados e agências macionais votaram a favor de uma moratória [fim] sobre a mineração dos fundos marinhos. A França se absteve. Agora, as opiniões e ações estão se tornando mais urgentes, observa a Fondation de la Mer.

Os cientistas acreditam que a exploração destes recursos minerais afetaria irreversivelmente este ambiente frágil e complexo que levou tanto tempo para se desenvolver. A poluição gerada pelo ruído e pelas nuvens de sedimentos teria um impacto na vida em águas profundas, e talvez mesmo nas espécies em águas mais rasas que conhecemos e das quais nos alimentamos. Outra conseqüência possível é a liberação de CO2 armazenado no fundo do oceano.

Enquanto em suas respectivas zonas econômicas exclusivas (ZEEs), os Estados são livres para organizar sua exploração de recursos marinhos, no alto mar, ou seja, a mais de 200 milhas náuticas da costa, em águas internacionais, cabe à Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos decidir. O fundo do mar foi declarado "patrimônio comum da humanidade" pela ONU, numa tentativa de protegê-lo da ganância dos Estados e empresas privadas. E para Sabine Roux de Bézieux, presidente da Fondation de la Mer, é importante conhecer e entender, antes de explorar.

"A urgência é proteger essas áreas antes que elas sejam danificadas. Hoje conhecemos o estado dos recifes de corais e dos manguezais, e não podemos deixar que o mesmo aconteça com o mar profundo", disse ela. "Encorajamos a França e a Europa a trabalharem para propor uma moratória sobre a exploração do fundo marinho, pois não sabemos como extrair a terra e os metais raros que lá se encontram sem causar danos irreversíveis". 

"A corrida pelo fundo do mar já começou", diz ela. Cerca de 30 países já têm programas de exploração sob o controle da Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos e os primeiros pedidos de exploração já foram apresentados. A corrida, agora, é contra o relógio, para criar uma legislação robusta que consiga colocar um freio na ganância de exploradores de diversos tipos e origens.

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