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Brasil-Mundo

Guia brasileira no Catar aposta no turismo e na Copa para quebrar preconceito contra muçulmanos

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Faltando pouco menos de três anos para a próxima Copa do Mundo de futebol, que será disputada entre novembro e dezembro de 2022 no Catar, muitas dúvidas ainda preocupam quem pretende viajar para o Oriente Médio para acompanhar a competição. Pela primeira vez na história, o evento será realizado em um país de maioria islâmica, religião com diferenças culturais marcantes em relação ao que os brasileiros estão acostumados. Restrição de bebida alcóolica, vestimentas, cinco orações diárias e proibição de um casal se beijar em público são alguns dos costumes dos catarianos que os estrangeiros terão de se adaptar.

A brasileira Leila Martinez, trabalha como guia turística e aposta no Mundial de 2022, e no turismo cada vez maior no país, para quebrar o preconceito que existe de parte das pessoas com os muçulmanos.
A brasileira Leila Martinez, trabalha como guia turística e aposta no Mundial de 2022, e no turismo cada vez maior no país, para quebrar o preconceito que existe de parte das pessoas com os muçulmanos. Arquivo Pessoal
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Especial de Doha, Catar

Morando há sete anos em Doha, capital do Catar, a brasileira Leila Martinez, que trabalha como guia turística, aposta justamente no Mundial de 2022 e no turismo cada vez maior no país para quebrar o preconceito que existe contra os muçulmanos.

“Eu não tenho dúvidas de que quem optar por vir para essa Copa não vai se arrepender, vai sair do Catar com uma imagem absolutamente diferente e com a cabeça muito mais aberta, para própria religião. Acho que o grande objetivo do país é esse, é se apresentar para o mundo e tentar diminuir esse grande preconceito que existe contra a religião islâmica, onde as pessoas confundem a religião com terrorismo”, afirmou.

Gaúcha de Porto Alegre, Leila se mudou para o Catar com o marido, que trabalha no ramo da aviação, e os dois filhos. Antes, viveu cinco anos na China, o que facilitou a adaptação no exterior e evitou um grande choque cultural. Quando chegou ao Oriente Médio, ela conta que começou a estudar para entender melhor a cultura do Islã. Com isso, aproveitou a oportunidade e entrou no meio turístico, fazendo passeios guiados para mostrar a cidade e passar o conhecimento adquirido aos visitantes. Desde 2017, o Governo do Catar liberou o visto de entrada para 80 nacionalidades, incluindo brasileiros, o que impulsionou o turismo no país.

Leila Martinez explicou que logo quando chegou em Doha em 2012, ela mesma viveu uma história curiosa por causa da imagem que tinha antes de conhecer de fato a realidade do mundo árabe.

“Chegamos aqui com receio, por preconceito, pelas coisas que as pessoas falavam, e a gente também desconhecia o local e a cultura. Falaram até que eu teria que trocar minha filha por camelo. Estávamos aqui há só uma semana e fomos tirar uma foto na Corniche, que é o calçadão da cidade, e tinha um letreiro. Na hora de descer, eu não conseguia, e meu marido me pegou rapidamente no colo para colocar no chão. Ao mesmo tempo, estacionou um carro e desceu um catariano, com as vestimentas árabes. A primeira sensação foi de medo, porque ele nos olhou e ficamos com uma sensação de ter feito uma coisa errada, achamos que seríamos repreendidos. Mas para a nossa surpresa, ele veio conversar conosco, perguntou de onde a gente era, tirou a nossa primeira foto em família em Doha e ainda deu o cartão de visitas, ofereceu ajuda. Então, naquele momento eu percebi que as pessoas falam muito sem conhecimento, isso é o preconceito, a gente acaba criando medo de uma coisa que não existe por causa de uma imagem que as pessoas têm na cabeça”.

Regras locais

Durante a Copa do Mundo, os turistas estrangeiros terão que respeitar algumas regras e hábitos locais relacionados à religião. No entanto, os catarianos também devem ser flexíveis em alguns pontos.

No Mundial de Clubes disputado em Doha no último mês de dezembro, quando o Liverpool venceu o Flamengo na final, já foram observadas algumas mudanças. Por exemplo, normalmente bebidas alcoólicas só podem ser vendidas e consumidas em bares dentro de hotéis internacionais de quatro ou cinco estrelas, com preços altos (em média R$ 45 por um copo de 500ml de cerveja). Porém, a Fifa criou uma Fan Zone para a competição, onde os torcedores podiam beber cerveja por um preço inferior e fazer a festa assistindo aos jogos em um telão. No Mundial de 2022, existirão vários espaços como esses espalhados pelo pequeno país.

“Os catarianos estão super conscientes que vão ter que abrir mão durante um período dessas restrições, com relação ao beber fora de áreas autorizadas, a manifestação de afeto em público. Isso tudo eles têm consciência e estão se preparando. Durante o Mundial de Clubes, eles foram menos rigorosos com a coisa da roupa, as pessoas puderam andar com o ombro de fora, bermudas, roupas mais decotadas. Eles fizeram vista grossa, não incomodaram ninguém, não pediram para ninguém se cobrir. A demonstração de afeto exagerado em público não é permitida aqui. Acredito que eles vão ser mais flexíveis com isso também, mas não tem como liberar total e deixar todo mundo fazer pegação em público nas ruas”, disse Leila Martinez.

A organização da Copa também deve adotar uma medida interessante. Há um projeto para liberar a venda e consumo de álcool e também cassinos dentro de navios de cruzeiro, que ficarão atracados no porto de Doha. Eles funcionarão como hotéis e terão bares e boates.

“Isso vai aumentar as opções de diversão, de coisas que não têm normalmente aqui. Quem quiser, vai para os navios. Eu achei bem inteligente, porque quando acabar a Copa esses navios vão embora e, eu brinco, o pecado vai embora junto. São coisas que dentro da religião eles consideram “haraam”, que é pecado em árabe. Eles estão se preparando, vai ser preciso, porque são muitas culturas diferentes. E eles obviamente vão estar mudados, porque não tem como um país passar por uma Copa do Mundo sem ter transformações, sem assimilar um pouco das outras culturas”, afirmou.

Paraíso

Leila Martinez também destacou a ótima estrutura do Catar, uma nação rica economicamente, localizada praticamente no meio do deserto e que se está se desenvolvendo rapidamente. Modernos estádios estão sendo construídos, e, recentemente, foram inauguradas três linhas de metrô em Doha. Ela acredita que o país estará pronto para sediar o evento esportivo, diz que será “uma Copa histórica”, uma Copa diferente, mas não vai ser uma Copa barata” para os turistas, pois o custo por lá é alto.

A dona do perfil “Turistando em Doha” nas redes sociais contou que o que mais gosta no Catar é a “segurança e a limpeza”, e o que menos gosta é “o calor dos meses de verão”, de junho até a metade de setembro, quando é obrigada a viver dentro do ar condicionado. E segundo ela, todos os brasileiros que ela recebe saem do país só com impressões positivas e querendo voltar.

“O lugar que o pessoal mais gosta de conhecer é o Souq Waqif, um mercado árabe tradicional. Mas eu também sempre tento mostrar o lado do investimento em cultura, saúde e bem-estar da população. E todas as pessoas todas, sem exceção, saem daqui me perguntando como se faz para arrumar um emprego e morar aqui. Porque a sensação que a gente tem é que o Catar é um paraíso. É difícil hoje em dia imaginar um país que tenha segurança, saúde, educação, um país limpo, que dê oportunidade de emprego para outras nacionalidades, que respeite outras religiões. A gente não sente falta de nada, a não ser das pessoas, da família. É um país realmente muito seguro, e acho que o que a gente mais sente falta no Brasil é essa segurança”, finalizou.

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