Exposição de fotos sobre protestos no Irã mostra como superar censura em regimes autoritários
A revolta popular desencadeada no Irã após a morte da jovem curda Mahsa Amini está próxima de completar um ano, em 16 de setembro de 2023, e é tema de uma das exposições que mais chamam a atenção do público na 35ª edição do Festival Internacional de Fotojornalismo Visa pour l'Imagem, em Perpignan.
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Adriana Moysés, enviada especial da RFI a Perpignan
Em uma visita guiada pela exposição, as curadoras Ghazal Golshiri, jornalista iraniana, e Marie Sumalla, editora de fotografia do jornal Le Monde, contam que a morte de Mahsa Amini, então com 22 anos, foi aparentemente causada por policiais que espancaram a jovem por violar o rígido código de vestimenta imposto às mulheres na República Islâmica.
Mahsa foi abordada por agentes da polícia de costumes quando passeava na rua em Teerã. Acusada de estar com o véu muçulmano mal colocado, ela foi levada para uma delegacia. Mas apareceu morta três dias depois, num hospital da capital. O regime declarou que ela morreu por causa de uma doença pré-existente.
A morte de Mahsa foi o estopim para um levante popular inédito no Irã, que dura vários meses, se espalha para todo o país e é documentado na exposição “Revoltas no Irã – Você não morrerá”.
Os espectadores se veem diante de imagens fortes, como o abraço do pai e da avó de Mahsa, quando descobrem sua morte no hospital em Teerã; o corpo da jovem inerte em um leito hospitalar, com o rosto inchado, após as prováveis agressões cometidas por agentes da polícia de costumes.
O conjunto de 50 imagens – algumas feitas por fotógrafos e jornalistas profissionais, outras por cidadãos iranianos que se tornaram fotojornalistas ao documentar a rebelião nas redes sociais – mostram os protestos que reuniram milhares de manifestantes na capital e em regiões remotas do Irã. Algumas imagens se referem às cenas em que mulheres, apoiadas por homens, rasgam ou queimam o véu muçulmano nas ruas, em uma atitude de desafio ao regime islâmico ultraconservador do Irã – uma população disposta a morrer pela liberdade.
Outras sequências registram momentos em que agentes da polícia, à paisana, dão pauladas e chutes na cabeça e no corpo de manifestantes, antes de embarcá-los em porta-malas de carros não identificados. Corpos torturados e ensanguentados de manifestantes, vítimas da repressão, são abandonados nas ruas.
Apesar deste clima de terror, Mahsa Amini tornou-se o símbolo da resistência à opressão cotidiana de uma teocracia no poder desde 1979.O regime dos aiatolás tentou impedir que imagens da repressão sangrenta saíssem do país, mas fracassou.
A exposição selecionada para o Festival Visa pour l’Image mostra como o jornal Le Monde pôde continuar documentando essa revolta, a partir de milhares de fotografias publicadas e verificadas pela equipe do veículo nas redes sociais de cidadãos iranianos.
Para isso, na redação em Paris, a jornalista Ghazal Golshiri, que nasceu, cresceu e estudou no Irã, fez um esforço contínuo de ampliar sua rede de contatos no país, no último ano. Com o apoio da editora de fotografia Marie Sumalla, elas conferem e autenticam a procedência das fotos, além de proteger seus autores, antes de oferecê-las como uma informação de confiança aos leitores do Le Monde.
As curadoras e a direção do jornal agradecem a todos os iranianos que, em nome da liberdade, continuam fornecendo imagens para relatar ao mundo o que acontece no país, apesar dos riscos que correm se forem descobertos pelo regime. Fazem também um agradecimento especial às jornalistas Elaheh Mohammadi e Niloufar Hamedi, que imortalizaram a morte e o enterro de Mahsa Amini. Ambas estão detidas no Irã e podem ser condenadas a duras penas de prisão.
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