Acessar o conteúdo principal

Eleição presidencial francesa: Macron e Le Pen correm atrás dos votos dos candidatos derrotados

No dia seguinte ao primeiro turno da eleição presidencial na França, os dois finalistas, Emmanuel Macron (LREM) e Marine Le Pen (RN) saíram a campo nesta segunda-feira (11) para conquistar os votos dos eleitores, especialmente da esquerda. A medida é vista como estratégica para uma possível vitória no segundo turno, em 24 de abril, que promete ser apertado.

Emmanuel Macron em campanha em Denain, no norte da França, em 11 de abril de 2022, um dia após o primeiro turno.
Emmanuel Macron em campanha em Denain, no norte da França, em 11 de abril de 2022, um dia após o primeiro turno. REUTERS - POOL
Publicidade

O atual presidente que busca a reeleição chegou na liderança, no domingo, com 27,85% dos votos, mais de quatro pontos à frente da candidata da Reunião Nacional (RN), que obteve 23,15%. Emmanuel Macron começou a semana em Denain, no norte do país, onde a sua rival de extrema direita tem fortes raízes.

Durante uma caminhada, o centrista foi questionado sobre o seu polêmico plano de adiar a idade de aposentadoria de 62 para 65 anos. "Eu votei em você, mas me arrependo. Você não gosta muito de aposentados", desafiou uma senhora, a quem o candidato respondeu que queria trabalhar por uma "aposentadoria mais digna". "Tento esclarecer o meu programa mostrando que é justo e social. Vi muitos jovens que me disseram ter votado em Mélenchon e tento convencê-los", explicou Macron, em referência ao líder da direita radical, que ficou em terceiro lugar no pleito.

Com 21,95% dos votos, Jean-Luc Mélenchon, chefe do partido França Insubmissa (LFI), fez a melhor pontuação da esquerda, com um eleitorado jovem e popular, cortejado pelos dois classificados para o segundo turno.

Do lado de Marine Le Pen, a presidenciável sabe que pode contar com o expressivo eleitorado de Eric Zemmour, o outro candidato da extrema direita, que conquistou 7,07% dos votos. Já a reserva de votos para Macron não é tão clara. Embora ele continue sendo favorito, nada é certo ainda e a frente republicana contra a extrema direita não será tão automática. Além disso, embora Mélenchon tenha clamado por um voto para “barrar a extrema direita”, isso não significa que todos os eleitores da França Insubmissa votarão em Emmanuel Macron na próxima etapa.

Reedição de 2017, mas em outro contexto

Esta é a terceira vez na quinta República (que começou em 1958) que a extrema direita chega à final de uma eleição presidencial. Jean Marie Le Pen, pai de Marine, concorreu no segundo turno em 2002 e sua filha na eleição passada, em 2017.

Contudo, se os nomes dos candidatos se repetem, a comparação com o passado termina aí, analisa Bruno Cautrès, do Centro de Pesquisas Políticas (Cevipof) do Instituto de Ciências Políticas de Paris (Sciences Po), entrevistado pela RFI. “O contexto mudou completamente porque a pulverização do sistema partidário francês aumentou durante esta eleição. Só os três primeiros candidatos somam quase três quartos dos votos, símbolo de uma tripartição do espaço político francês”, observa.

Os partidos históricos tiveram baixa representatividade. Os Republicanos, da direita trandicional (Valérie Pécresse, 4,7%), assim como os Socialistas, da esquerda (Anne Hidalgo, 1,8%) não conseguiram sequer reembolsar suas despesas de campanha, uma vez que não atingiram a marca de 5% dos votos como exige a legislação eleitoral sobre financiamento público de campanha.

Uma extrema direita em constante progressão

Marine Le Pen poderá contar com os 7% de votos obtidos pelo concorrente na extrema direita, Eric Zemmour, que ficou em quarto lugar. O ex-jornalista do Le Figaro, que fez campanha baseada no radicalismo de ideias, contribuiu para a mudança de imagem de Marine Le Pen, que "aparece como a candidata do radicalismo apaziguado", conforme descreve Stewart Chau, chefe de estudos políticos e sociais do instituto de pesquisas Viavoice.

Ela continua sendo a líder da extrema direita na França e Zemmour lhe traz a sua cota de votos. De acordo com uma pesquisa da Ipsos Sopra-Steria para a RFI, 85% dos eleitores de Eric Zemmour serão eleitores de Le Pen em 24 de abril. A líder do partido Reunião Nacional também poderá contar com os votos de seu aliado de 2017, Nicolas Dupont-Aignan, conservador de direita e que concorreu este ano pelo partido A França de Pé, conquistando 2,1%.

“Marine Le Pen tem suas apostas e seus desafios a cumprir, mas sem dúvida aumenta sua pontuação e tem uma reserva de votos, ou seja, tem uma situação melhor do que em 2017”, resume Valérie Gas, chefe do serviço político da RFI. Ao todo, a extrema direita soma 32% dos votos.

"Nunca Marine Le Pen esteve tão perto de vencer a eleição presidencial", acrescenta Bruno Cautrès. Segundo as primeiras pesquisas, Emmanuel Macron venceria por uma pequena diferença. Considerando uma margem de erro, ele teria entre 51% e 55% dos votos no segundo turno, contra 45 a 49% de sua oponente. Em 2017, o presidente francês alcançou a vitória com mais de 66% dos votos, contra 33,9% para Le Pen.

Nos discursos de vários derrotados, a frente republicana contra a extrema direita é a coisa certa a fazer. A socialista Anne Hidalgo, a conservadora Valérie Pécresse, o ecologista Yannick Jadot e o comunista Fabien Roussel pediram claramente para votar em Emmanuel Macron. Não por aprovar o seu programa, avisaram, mas para "bloquear" o projeto da extrema direita.

Emmanuel Macron promete ter entendido o recado: "Alguns vão fazer isso para bloquear a extrema direita e não para me apoiar, e eu respeito", declarou o presidente e candidato em seu discurso, no domingo, no Parque de Exposições da Porta de Versalhes, em Paris.

Para onde irão os votos de Mélenchon?

O fato de Emmanuel Macron retornar à campanha tão rapidamente, nesta segunda-feira de manhã, talvez seja um sinal de que o partido LREM compreenda a situação atual. Logo cedo, o presidente já estava em Hauts-de-France, uma região mais sensível a votar nos extremos. Em Denain, Caevin e Lens, as três cidades visitadas por ele, o partido de Le Pen obeteve 41,6%, 40,7% e 39,7% dos votos, respectivamente. “Vou fazer campanha de manhã, de tarde e à noite”, prometeu Macron.

"Para Emmanuel Macron, é uma nova campanha que começa”, explica à RFI Stewart Chau. O analista diz que o presidente demorou para entrar na batalha, com uma candidatura declarada no último momento da guerra na Ucrânia. No entanto, o presidente ainda tem um histórico a defender, incluindo duas crises, a da Covid-19 e dos “coletes amarelos”, além da inflação atualmente em alta.

“Parece muito mais apertado desta vez entre Emmanuel Macron e Marine Le Pen porque Emmanuel Macron cumpriu um primeiro mandato. Ele não é mais o mesmo Macron aos olhos dos franceses. Ele teve a oportunidade de decepcionar”, analisa Bruno Cautrès.

Alguns dos eleitores de esquerda que escolheram votar Macron em 2017 podem ter ficado desapontados com o ex-ministro da Economia do presidente socialista François Hollande. A reforma da Previdência, considerada antissocial e paralisada pelo surto da pandemia, foi alvo de protestos massivos nas ruas. No entanto, ainda é uma das medidas emblemáticas do programa do presidente, que pretende retomar esse debate. Em todo caso, não é com essa reforma que ele seduzirá o eleitorado de Mélenchon.

No lado da França Insubmissa, a convocação de uma barragem republicana contra Le Pen assumiu uma forma ambivalente. Jean-Luc Mélenchon tentou ser "claro" ao dizer "não devemos dar uma só voz à senhora Le Pen", martelando a frase quatro vezes depois do anúncio dos resultados. Contudo, o candidato derrotado não pediu explicitamente o voto em favor de Emmanuel Macron, odiado por grande parte de seu eleitorado.

Tal como está, a abstenção ou o voto em branco reforçam matematicamente Marine Le Pen. De acordo com a pesquisa Ipsos Sopra-Steria, entre os franceses que votaram no candidato da esquerda radical no primeiro turno da eleição presidencial de 2022, 34% votariam em Emmanuel Macron e 30% em Marine Le Pen. Outros 36% não quiseram comentar.

A política pró-nuclear do presidente francês também é contestada por toda uma franja ambientalista do eleitorado que escolheu o ecologista Yannick Jadot (4,5%). A “inação climática” é fortemente criticada por um eleitorado mais urbano. No entanto, de acordo com a pesquisa da Ipsos, 60% dos eleitores de Yannick Jadot concordariam em dar a Macron um segundo mandato de cinco anos.

Emmanuel Macron: desafio de renovação

“Quero entrar em contato com qualquer pessoa que queira trabalhar para a França. Estou pronto para inventar algo novo para reunir convicções e sensibilidades”, disse Emmanuel Macron. Mas ele terá muito o que fazer para reunir alguns dos 7,7 milhões de eleitores de Jean-Luc Mélenchon. Para o pesquisador Bruno Cautrès, trata-se de “uma recuperação de última hora que não criará um forte impulso em relação a Macron. Há um verdadeiro ponto de interrogação sobre a sinceridade dessa virada à esquerda que Macron tomaria”, resume.

E por que todas as vozes derrotadas da direita não estão automaticamente com Macron? As opiniões divergem dentro do partido Os Republicanos. “Durante cinco anos, lutamos contra a política de Emmanuel Macron, é por incoerência que não votarei nele. Não votarei nem em Emmanuel Macron nem em Marine Le Pen”, anunciou na RFI Guilhem Carayon, porta-voz de Valérie Pécresse e presidente dos Jovens Republicanos. Dentro do movimento, ele diz "expressar a sensibilidade gaulista, que não é a mesma que a sensibilidade liberal" encarnada por Emmanuel Macron.

Mesma atitude por parte de Eric Ciotti, representante da direita e que ficou em segundo lugar nas primárias republicanas: “Não votarei em Emmanuel Macron, que falhou". Mas o fato é que, segundo a pesquisa da Ipsos, 45% dos eleitores de Valérie Pécresse seguirão o candidato da República em Marcha.

Em relação ao "desafio climático e ecológico", "as desigualdades que persistem" e ao "separatismo islâmico", o discurso de Emmanuel Macron na noite do primeiro turno foi tingido de apelos para persuadir a extrema esquerda e a direita. É uma tentativa de reabilitar uma frente republicana inegavelmente rachada, mas ainda de pé. “Emmanuel Macron terá de ir buscá-los com os dentes, especialmente entre os eleitores de Jean-Luc Mélenchon”, conclui Valérie Gas, do serviço político da RFI.

NewsletterReceba a newsletter diária RFI: noticiários, reportagens, entrevistas, análises, perfis, emissões, programas.

Acompanhe todas as notícias internacionais baixando o aplicativo da RFI

Compartilhar :
Página não encontrada

O conteúdo ao qual você tenta acessar não existe ou não está mais disponível.