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Eric Zemmour: o rosto de uma extrema direita ainda mais radical preocupa a França

Ele (ainda) não é candidato, mas tem sido o centro do debate sobre as eleições presidenciais de 2022 na França. A sete meses do pleito, o jornalista e escritor de extrema direita Éric Zemmour aparece em terceiro nas pesquisas de opinião para o Palácio do Eliseu em uma evolução alucinante que abala o apoio a Marine Le Pen.

Eric Zemmour, durante convenção da Direita, em que fez um discurso raivoso contra imigrantes e muçulmanos.
Eric Zemmour, durante convenção da Direita, em que fez um discurso raivoso contra imigrantes e muçulmanos. AP Photo/Michel Euler
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Após dezenove anos de grande exposição em jornais, rádios e canais de televisão e uma longa lista de processos por discursos de ódio, Zemmour está em pré-campanha para a Presidência francesa.

Ainda que não declare suas intenções políticas, desde setembro, quando lançou seu último livro, “A França Não Disse sua Última Palavra” (em tradução livre), o jornalista tem dividido seus dias entre entrevistas e eventos pelo país, enquanto um exército autonomeado de “Geração Z” espalha adesivos e cartazes com seu rosto pelas ruas de Paris a Bordeaux, de Marselha a Lille.

As pesquisas de opinião mostram o sucesso da empreitada. Em uma pesquisa do Ipsos divulgada no dia 1° de outubro, Zemmour aparece em terceiro, com 15 pontos percentuais nas intenções de voto, pouco atrás dos 16 pontos da representante da extrema direita Marine Le Pen (Reunião Nacional). O novato está à frente de Xavier Bertrand (14 pontos), candidato pelo partido Os Republicanos, que já elegeu Jacques Chirac e Nicolas Sarkozy.

O atual presidente, Emmanuel Macron, lidera as pesquisas, com 24% das intenções de voto, mas já começa a alterar seu discurso com vistas ao novo opositor.

Quem é Eric Zemmour

Ex-jornalista político do jornal Figaro, estrela do canal de notícias CNews, autor de grandes sucessos de venda e condenado por emitir discursos de ódio e incitação à discriminação.

Aos 63 anos, Zemmour é conhecido por suas posições contrárias aos migrantes, à religião muçulmana, frases racistas e sexistas e também por sua grande capacidade de atrair os holofotes para si.

Foi assim que a partir de meados dos anos 2000, ele conquistou cada vez mais espaço como convidado em programas de televisão e rádio, até ganhar um programa diário de uma hora para comentar as notícias em horário nobre na CNews, televisão alinhada à direita.

Com frases chocantes e preconceituosas, Zemmour construiu uma carreira como figura nacionalista e reacionária sempre disposta ao confronto. Em 2010, participando como comentarista em um debate na TV, Zemmour defendeu que patrões tinham o direito de discriminar negros e árabes, frase que lhe rendeu uma condenação na Justiça.

Em 2016, após uma série de atentados jihadistas que chocaram a França, o polemista afirmou que os terroristas “são considerados por todos os muçulmanos, eles digam ou não, como bons muçulmanos”. Nova condenação judicial.

Apesar das derrotas na Justiça, ele continuou a arregimentar admiradores e, em 2020, ele chega a reunir 800 mil espectadores diante da televisão em dias da semana para ouvir suas opiniões.

Nessa trajetória, o nacionalista adota a estratégia de radicalizar suas posições para chamar atenção. Em seu último livro, Zemmour anunciou a intenção de obrigar a escolha de um nome francês na hora declarar o nascimento de uma criança pois “dar o nome de Mohamed a um filho, é colonizar a França”, escreveu.

O que fez dele um sucesso na mídia continua a funcionar em sua pré-candidatura. No último dia 23 de setembro, um dos principais canais de televisão da França transmitiram um debate entre o presidenciável de esquerda Jean-Luc Mélenchon (França Insubmissa) e o não-candidato Zemmour. Ao longo de duas horas, os dois discutiram acaloradamente, passando pelo tema de preferência da extrema direita: a migração de muçulmanos. Na noite de uma quinta-feira, 3,8 milhões de franceses pararam diante da TV para assistir ao espetáculo.

O percurso lembra o do ex-presidente norte-americano Donald Trump. “Os dois têm uma estratégia similar: a audiência deles faz que eles subam nas pesquisas”, comenta Alexis Pichard, autor do livro “Trump et les médias”, ao jornal Le Monde.

Zemmour ocupou espaço radical deixado por Le Pen

O avanço do polemista nas intenções de voto acontece simultaneamente à queda de Marine Le Pen, que perdeu quase dez pontos nas pesquisas desde junho. Para Jean-Marie Le Pen, símbolo da extrema direita francesa e pai de Marine, esse é o resultado da tentativa de Marine de apaziguar seu discurso.

“Marine abandonou suas posições fortes e Eric ocupou o território que ela deixou”, afirmou o antigo líder da Frente Nacional aos 93 anos ao jornal Le Monde.

Nos últimos anos, Marine Le Pen tem reduzido o conteúdo antimigratório e islamofóbico de seu discurso para atrair novos eleitores. Foi assim que, em 2017, ela obteve 33,9% das preferências no segundo turno contra Emmanuel Macron.

Até há pouco, a possibilidade de dois candidatos de extrema direita nas eleições presidenciáveis de 2022 agradava a muitos políticos da esquerda, mais uma vez fragmentada, e mesmo do partido do presidente, A República em Marcha.

As apostas eram que Le Pen e Zemmour pudessem dividir votos, deixando o caminho aberto para a chegada de um outro candidato ao segundo turno, na leitura da esquerda, ou facilitando a reeleição de Macron, segundo a LREM.

Contudo, o rápido avanço de Zemmour assustou os possíveis opositores e acende o alerta para um outro cenário. Desde 2002, quando o pai Le Pen chegou ao segundo turno da disputa pelo Eliseu contra Jacques Chirac, eleitores de esquerda e direita sempre se uniram no sprint final para barrar a extrema direita, formando uma espécie de cordão sanitário.

A estratégia voltou a ser implementada em 2017, quando Macron saltou de 8,6 milhões de votos no primeiro turno para 20,7 milhões de votos na disputa direta contra Le Pen. No entanto, contra Zemmour, ainda é incerto se eleitores políticos de direita e esquerda se uniriam para barrá-lo.

O pai Le Pen já entendeu isso e, na entrevista  publicada no último final de semana, disse que apoiará a candidatura de Zemmour caso “ele esteja melhor colocado”.

“A única diferença entre Éric e eu é que ele é judeu. É difícil qualificá-lo de nazista ou de fascista. Isso lhe dá mais liberdade”, afirma, experiente.

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