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Meloni quer preservar parcerias estratégicas com europeus, diz analista

Em visita à Itália, o presidente francês, Emmanuel Macron, foi o primeiro líder europeu a ter um encontro informal com a nova chefe de governo nacionalista Giorgia Meloni, poucas horas depois dela assumir suas funções no domingo (23). Na avaliação do cientista político Giulio Levorato, da Universidade de Gênova, os primeiros passos de Meloni demonstram que ela quer tranquilizar os parceiros europeus sobre uma certa continuidade em áreas cruciais, como economia, defesa e relações exteriores. 

Pouco tempo depois de assumir o cargo, Giorgia Meloni estreou no cenário internacional na noite deste domingo, ao receber o presidente francês, Emmanuel Macron, em Roma, seu primeiro encontro com um líder estrangeiro.
Pouco tempo depois de assumir o cargo, Giorgia Meloni estreou no cenário internacional na noite deste domingo, ao receber o presidente francês, Emmanuel Macron, em Roma, seu primeiro encontro com um líder estrangeiro. © via REUTERS - FILIPPO ATTILI/PALAZZO CHIGI PRE
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Melissa Barra, da redação hispânica da RFI

"O caso francês é particularmente emblemático dessa intenção, uma vez que as relações entre Itália e França têm registrado altos e baixos nos últimos anos", destaca Levorato. Um dos momentos mais críticos nas relações entre Roma e Paris aconteceu durante o governo do Movimento das Cinco Estrelas (M5E) e da Liga do Norte, em 2018 e 2019.

O então ministro do Interior, Matteo Salvini, apoiou os protestos do movimento dos coletes amarelos, que durante mais de um ano fez forte oposição a Macron. A relação entre os dois países melhorou substancialmente sob o governo de Mario Draghi (2021-2022) e culminou com a assinatura do Tratado Quirinal em 2021, que afirma a intenção de uma cooperação reforçada entre França e Itália. Para o pesquisador, Meloni tem interesse em manter as parcerias estratégicas no bloco. 

Os dois países são nações amigas e ao mesmo tempo concorrentes. A França é a segunda maior economia da Europa, à frente da Itália, que tem, no entanto, uma indústria mais diversificada.

Existem agendas comuns, tais como a pressão sobre a Alemanha e a Holanda para limitar o preço do gás no bloco ou a construção de um sistema de defesa do bloco, para diminuir a dependência dos Estados Unidos. Mas também há cenários em que Roma e Paris estão em competição, como, por exemplo, em relação aos interesses geopolíticos no norte da África, seja na Líbia, onde inibir a imigração é vital para o novo governo nacionalista italiano, ou na Argélia, um importante fornecedor de gás, assinala o especialista.  

A escolha de políticos como Antonio Tajani, ex-presidente do Parlamento Europeu, para o cargo de ministro das Relações Exteriores, ou de um especialista como Guido Crosetto para a Defesa, é um sinal de continuidade, ressalta Levorato. Entretanto, há divergências em questões de política interna, como se observa com a decisão da primeira-ministra de criar novos ministérios ou renomear os existentes para carimbar valores conservadores, protecionistas e nacionalistas nas pastas. 

Meloni criou o ministério da Empresa e "Made in Italy", para sublinhar o patriotismo comercial. A pasta encarregada do ensino passa a se chamar "da Educação e do Mérito". O ministério da Igualdade de Oportunidades foi transformado em "Família e Nascimentos". A preocupação com a queda da taxa de natalidade fica evidente nessa escolha, mesmo se as italianas não quiserem ter filhos.

O ministério da Agricultura manteve a designação, com o adendo de "Soberania Alimentar". Já o ministério do Meio Ambiente tem o título prolongado com "Segurança Energética". A mensagem enviada por Meloni, de que ela lidera um governo conservador e nacionalista", é clara, nota Levorato.

Afirmação da autoridade

A coalizão populista que Meloni costurou com os aliados Matteo Salvini, da Liga, e o líder da Força Itália, Silvio Berlusconi, dão ao governo maioria na Câmara e no Senado. Mas uma das primeiras preocupações de Meloni foi demonstrar a eles que quem manda é ela. Salvini e Berlusconi não conseguiram os portfólios que esperavam no governo. O partido da premiê, Irmãos da Itália, obteve 24% dos votos contra 8-9% para a Liga do Norte e 7-8% para a Força Itália, o que num primeiro momento garante a Meloni um equilíbrio de poder bastante transparente, analisa o cientista político da Universidade de Gênova. Salvini não conseguiu o Ministério do Interior que ele tanto queria, e da mesma forma Berlusconi não obteve a presidência do Senado.

No entanto, eles receberam alguns ministérios-chave: o novo chanceler italiano é um dos fundadores e líderes do partido de Berlusconi. Salvini recebeu o ministério dos Transportes e da Infraestrutura, que terá bilhões de euros de financiamento da Comissão Europeia. A chefe de governo ainda teve o cuidado de entregar os ministérios da Economia, do Interior, do Trabalho e da Justiça para técnicos, não a políticos. 

Na avaliação de Levorato, ao contrário da esquerda, a direita italiana tem se mostrado historicamente capaz de trabalhar em parceria. Os poucos governos italianos que conseguiram completar cinco anos no poder foram, em sua maioria, de direita.

Depois de assegurar os parceiros europeus e os mercados de que ela será a fiadora da estabilidade na Itália, Meloni buscará imprimir sua marca nas políticas de imigração e segurança pública. Apesar do perfil técnico, o novo ministro do Interior tem declarado posições muito próximas de Salvini. Ele chegou a ser julgado na Itália por ter proibido um navio que transportava migrantes de acostar em portos italianos, colocando em risco a saúde e a vida dos migrantes. Além disso, como Salvini é ministro da Infraestrutura, ele tem o "controle" dos portos, assinala o pesquisador. 

Na dinâmica política interna do bloco, ainda não está clara a posição que o governo Meloni irá assumir. Na gestão da Liga e do M5E, que tinha à frente o premiê Giuseppe Conte, houve uma certa contradição em deter os fluxos migratórios e encontrar aliados. A Hungria e a Polônia eram contra a redistribuição dos migrantes dentro da União Europeia, enquanto a Itália foi a favor, recorda Levorato.

Em relação à segurança energética, o pesquisador acredita que Meloni seguirá o mesmo caminho do governo Draghi. Ou seja, estabelecer um limite de preço para a compra de gás. Ela também deve manter seu apoio à Ucrânia, como repetiu várias vezes durante a campanha, se posicionando ao lado dos Estados Unidos e dos aliados ocidentais.

Em suas primeiras declarações no Twitter, o chanceler Antonio Tajani, embora do partido de Berlusconi, que admitiu ter se reaproximado de Vladimir Putin, procurou enviar uma mensagem de solidariedade ao povo ucraniano e ao presidente Volodymyr Zelensky. As declarações de Berlusconi criaram um certo desconforto, mas sempre fizeram parte do personagem, diz o analista entrevistado pela RFI. O magnata foi imediatamente repreendido e isolado dentro da coalizão. "Acho que Berlusconi ainda está procurando os holofotes. Talvez a idade esteja começando a pesar para ele, então eu não o levaria a sério", conclui o especialista.

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