Acordo de troca de presos entre EUA e talibãs causa tsunami político
O acordo fechado pelos Estados Unidos no Afeganistão para conseguir a libertação do sargento Bowe Bergdahl, há cinco anos em poder de talibãs deixou a oposição - e mesmo partidários do governo - em polvorosa. Mike Rogers, presidente republicano da Comissão de Inteligência da Câmara dos Representantes, acusou a administração Barack Obama de barganhar com terroristas ao aceitar trocar o militar americano por cinco líderes do regime fundamentalista que governou o país entre 1996 e 2001. Eles estavam presos na base naval de Guantánamo e foram enviados para o Qatar, país que mediou a negociação.
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Essa tratativa inédita foi divulgada no sábado pelo presidente e pelo ministro da Defesa, Chuck Hagel. "Quando negociamos desta maneira, enviamos uma mensagem a todos os braços da Al-Qaeda no mundo - alguns deles certamente tem reféns americanos - segundo a qual estes reféns têm (ainda mais) valor do que antes", disse Mike Rogers em entrevista à CNN.
Mudança de política
"Preocupa-nos esta mudança na política dos Estados Unidos de não negociar com terroristas", lamentou o republicano. De fato, Washington sempre repreendeu países que, por exemplo, pagam resgate para recuperar seus cidadãos sequestrados por grupos extremistas. O acordo de sábado muda esta perspectiva e, aos olhos de Rogers, "encoraja terroristas do mundo inteiro a optar pelo sequestro de americanos".
Até um antigo conselheiro de segurança nacional do presidente Obama, o general da reserva Jim Jones, criticou a troca. Para ele, ela coloca em risco militares e civis americanos em zonas de conflitos: "Se (inimigos) percebem que este tipo de ação pode ser frutífera, eles o farão".
Decisão arbitrária
A associação americana IntelCenter emitiu um comunicado afirmando que "isso aumenta de maneira espetacular a ameaça contra todos os americanos do mundo que são os alvos prioritários da Al-Qaeda e suas filiais". Para o senador republicano John McCain, que enfrentou Barack Obama nas urnas em 2008, pediu que o presidente garanta que "esses extremistas talibãs cruéis e violentos não voltarão jamais a combater os Estados Unidos e seus parceiros". Para ele, os cinco islamitas de Guantánamo são de alta periculosidade e "podem ser responsáveis pela morte de milhares".
Outros opositores acusaram ainda o presidente de tocar o procedimento de maneira arbitrária, por não ter informado o Congresso com um mês de antecedência. "Ao executar essa transferência, o presidente viola claramente as leis que estipulam que ele deve informar o Congresso 30 dias antes da transferência de terroristas de Guantánamo e explicar por que razão a ameaça que estes terroristas representam foi consideravelmente atenuada", argumentou o senador James Inhofe.
Processo de paz
O argumento foi descartado pelo todo-poderoso do Pentágono, Chuck Hagel: "O presidente dos Estados Unidos, como comandante-em-chefe, tem o poder e a autoridade para tomar a decisão que tomou, de acordo com o artigo II da Constituição. O sargento Bergdahl era um prisioneiro de guerra. Isso é uma troca de prisioneiros. Como secretário de Defesa, eu autorizo a libertação de cinco detentos talibãs".
Na mesma entrevista, concedida à rede de televisão NBC durante uma visita surpresa ao Afeganistão no domingo, Hagel afirmou que o gesto pode significar a reabertura de um processo de paz. Mas essa possibilidade foi imediatamente descartada pelos talibãs afegãos que afirmaram tratar-se de um procedimento simples, sem qualquer conotação política, ainda que a libertação destes cinco militantes fosse uma das principais condições impostas pelos talibãs para retomar os diálogos, suspensos desde 2012.
O Afeganistão, que talvez fosse a parte que poderia ficar mais satisfeita com o acordo, também tem suas críticas. Em nota, o ministério das Relações Exteriores condenou o fato de que "a administração americana envia cidadãos afegãos ao Qatar sem acordo prévio com o governo afegão, o que contraria as regras internacionais". Por isso, o governo exige a libertação imediata dos prisioneiros, em solo afegão.
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