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Bolsonaro silencia enquanto vice-presidente Mourão compara Putin a Hitler

Presidenciáveis como Lula, Moro, Doria e Ciro Gomes usaram as redes sociais para comentar os ataques russos.

Operação militar ucraniana na região separatista de Lugansk. Em 24 de fevereiro de 2022.
Operação militar ucraniana na região separatista de Lugansk. Em 24 de fevereiro de 2022. AFP - ANATOLII STEPANOV
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Raquel Miúra, correspondente da RFI em Brasília

Já perto de meio-dia, horário de Brasília, com o planeta todo comentando a invasão russa na Ucrânia, o presidente Jair Bolsonaro discursou por vinte minutos numa visita ao interior de São Paulo. Vestindo camiseta de time de futebol, ele não fez qualquer menção ao ataque ordenado por seu colega Vladmir Putin. Foi a segunda vez que Bolsonaro falou em público nessa quinta-feira (24). Na porta do Alvorada, mais cedo, ele falou com seus apoiadores de vários assuntos, de MST ao jogo do Palmeiras, mas também não teceu comentários sobre a situação no leste europeu.

Se de Bolsonaro ainda se espera uma posição, o vice-presidente falou e criticou o presidente russo. Hamilton Mourão afirmou que é necessária uma ofensiva militar para frear os ataques contra a Ucrânia, alegando que não vê em sanções econômicas armas efetivas contra esse tipo de atuação militar.

“O mundo ocidental está igual ficou em 1938 com Hitler, na base do apaziguamento. Putin não respeita o apaziguamento. Essa é a realidade. E na minha visão, meras sanções econômicas, que é uma forma intermediária de intervenção, não funciona. Vamos lembrar que o Iraque passou mais de 20 anos com sanções econômicas. Nada mudou. O Irã está há não sei quanto tempo com sanção econômica. Também nada mudou”, afirmou Mourão. Para ele “o sistema internacional pode ser rachado, abalado, e nós vamos voltar ao tempo das cavernas. Cada um faz o que quer e bem entende. Não há respeito entre os povos, às nações. O conceito de soberania se dissolve a partir do momento em que um Estado mais forte julga que pode meter a mão no Estado mais fraco e continuar tudo como antes”.

Por duas vezes o vice-presidente mencionou Hitler para comparar a atual situação dos ucranianos com aquela vivida por nações invadidas pela Alemanha. "Tem que haver o uso da força, realmente um apoio à Ucrânia, mais do que está sendo colocado. Essa é a minha visão. Se o mundo ocidental pura e simplesmente deixar que a Ucrânia caia por terra, o próximo será a Bulgária, depois os Estados bálticos, e assim sucessivamente, como a Alemanha hitlerista fez nos anos 30."

Em um tuíte, o presidente Jair Bolsonaro disse estar "empenhado no esforço de proteger e auxiliar os brasileiros que estão na Ucrânia". Ele afirmou que "a embaixada em Kiev permanece aberta e pronta a auxiliar os cerca de 500 cidadãos brasileiros que vivem na Ucrânia e todos os demais que estejam por lá temporariamente". Um número de telefone foi divulgado para casos de emergência consular.

Muitas autoridades e instituições que se posicionaram até aqui preferiram o apelo pela saída diplomática, apostando que ainda é possível alcançar acordo sem um confronto entre as principais potências. “Reafirmamos a necessidade de um diálogo amplo, pacífico e democrático, com vistas a uma rápida solução negociada que contemple os legítimos interesses das partes envolvidas”, afirmou em nota o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco.

O PT também se posicionou nessa linha, sem uma condenação direta dos ataques, mas pedindo uma saída negociada “A resolução de conflitos de interesses na política internacional deve ser buscada sempre por meio do diálogo e não da força, seja militar, econômica ou de qualquer outra forma”, afirmou o partido em nota.

Presidenciáveis comentam o conflito

O ex-presidente Lula, pelas redes sociais, também comentou os ataques: “"É lamentável que na segunda década do século 21 a gente tenha países tentando resolver suas divergências, sejam territoriais, políticas, ou comerciais, através de bombas, tiros e ataques, quando deveria ter sido resolvido em uma mesa de negociação" . O ex-presidente afirmou que a situação poderia ser outra se a ONU fosse mais respeitada e não uma instituição decorativa, quando defendeu a abertura para novos membros permanentes, como o Brasil. E também afirmou: “​​ninguém pode concordar com a guerra, ataques militares de um país sobre o outro. A gente está acostumado a ver que as potências, de vez em quando, fazem isso sem pedir licença. Foi assim que os Estados Unidos invadiram o Afeganistão, o Iraque, sem pedir licença para ninguém. Foi assim que a França e a Inglaterra invadiram a Líbia. E é assim que a Rússia está fazendo com a Ucrânia".

Lula também criticou a visita feita por Bolsonaro, semana passada, à Rússia, quando declaraou apoio ao povo daquele país. “Parece até uma piada, o Bolsonaro foi lá falando que ia resolver a paz e agora eu acho que é importante mandar ele lá pra Ucrânia, para ver se ele consegue resolver o problema. Como ele adora falar mentira, fazer fake news, ele foi lá e tentou passar para sociedade que foi lá numa missão. Até hoje a gente não sabe o que ele foi fazer lá”.

Outros presidenciáveis também se pronunciaram pelas redes sociais sobre os ataques russos. “Repudio a guerra e a violação da soberania da Ucrânia. A paz sempre deve prevalecer”, disse o ex-juiz Sérgio Moro (Podemos/PR). Ele também cutucou o PT, ao mencionar a nota do partido: “Em entrevista agora há pouco, critiquei a nota do PT sobre a invasão da Ucrânia. Mais uma vez é a ideologia prevalecendo sobre a realidade. Mais uma vez repudio fortemente a guerra e a violação da soberania da Ucrânia.”

Ciro Gomes (PDT/CE) falou de possíveis reflexos do conflito, como o preço do combustível. “No mundo atual não existe mais guerra distante e de consequências limitadas. Precisamos nos preparar, portanto, para os reflexos do conflito entre Rússia e Ucrânia. Muito especialmente por termos um governo frágil, despreparado e perdido. Para ficar em um só aspecto preocupante, basta lembrar que o barril do petróleo já passou dos US$ 100, o que vai nos atingir em cheio por termos uma política absurda de preços rigidamente atrelada ao mercado internacional”. Para Gomes, “a sociedade e outros poderes precisam estar alertas para fiscalizar um executivo com políticas interna e externa cheias de equívocos e desvarios. O desequilíbrio na ordem internacional pode gerar efeitos de um outro tipo de pandemia, em especial neste Brasil hoje tão vulnerável”.

Outro presidenciável, o governador de São Paulo, João Dória (PSDB) condenou os bombardeios russos. “Condenável a invasão da Ucrânia pela Rússia. Guerra nunca é resposta a nada. Ninguém ganha quando a violência substitui o diálogo. Muitos acabam pagando pelas decisões de poucos. O que está em jogo são milhões de vidas humanas. Mais do que nunca o mundo precisa de paz”.

O presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, Aécio Neves, assinou uma nota em nome do colegiado, dizendo que “os bombardeios russos contra a Ucrânia, país soberano que conquistou sua Independência em 1991, viola as regras e normas internacionais e deve ser fortemente condenado pelas instâncias multilaterais e os governos democráticos”. O deputado, numa referência à vaga temporária ocupada pelo Brasil no Conselho de Segurança da ONU, pelo sistema de rodízio, afirmou que o país deveria agir em busca de uma solução. “Reiteramos que o Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas é a instância adequada para a resolução pacífica dos conflitos e encorajamos o Brasil, por meio de sua diplomacia e com assento neste órgão da ONU, para que atue de forma objetiva e clara em benefício do diálogo e da construção de uma agenda de paz e segurança duradouros”.

O vice-presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara cobrou uma posição mais firme do governo brasileiro: “O Brasil não pode fazer vista grossa para megalomania do presidente da Rússia Vladimir Putin. Ele invadiu um país soberano e está colocando em risco toda estabilidade mundial. Não adianta nessa hora fazer apenas discurso de candidata a miss pregando a paz mundial. Todas as nações precisam condenar esse ato de guerra e intensificar as sanções contra a Rússia nesse primeiro momento. A história nos mostra que deixar uma situação dessas sem resposta pode ter consequências catastróficas", afirmou Rubens Bueno (Cidadania/PR).

Diante do silêncio do presidente, quem toma à frente na posição oficial do Brasil é o Itamaraty, que não ficou calado, mas também não criticou os ataques. "O Brasil apela à suspensão imediata das hostilidades e ao início de negociações conducentes a uma solução diplomática para a questão, com base nos Acordos de Minsk e que leve em conta os legítimos interesses de segurança de todas as partes envolvidas e a proteção da população civil", disse em nota a diplomacia brasileira.

"O Brasil apela à suspensão imediata das hostilidades e ao início de negociações conducentes a uma solução diplomática para a questão, com base nos Acordos de Minsk e que leve em conta os legítimos interesses de segurança de todas as partes envolvidas e a proteção da população civil". 

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