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Prática de tortura impede qualquer processo em Guantánamo que completa 20 anos

Nesta terça-feira (11), a prisão de Guantánamo completa 20 anos. Apesar das críticas internacionais contra o desrespeito aos direitos humanos e das promessas de fechamento feitas pelos democratas Obama e Biden, Guantánamo continua a funcionar até hoje.

Foto de arquivo de prisioneiiros no centro de detenção de Guantánamo, em 2002.
Foto de arquivo de prisioneiiros no centro de detenção de Guantánamo, em 2002. © Lynne Sladky / AP Photo
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Por Véronique Gaymard,

Após os atentados de 11 de setembro de 2001, que deixaram 2.977 mortos, o então presidente americano George W. Bush lançou a guerra contra a Al-Qaeda e seu chefe Bin Laden. No dia 11 de janeiro de 2002, os primeiros 20 prisioneiros chegaram ao campo de detenção montado na base naval americana em Cuba.

Há 20 anos, as imagens da abertura da prisão de Guantánamo, de prisioneiros vestidos com uniformse alaranjados, acorrentados e fotografados em celas parecidas com jaulas, marcaram o mundo inteiro. Essas imagens simbolizaram as prisões arbitrárias, a tortura e outras violações dos direitos humanos cometidas pelos Estados Unidos em nome da “guerra contra o terrorismo”.

Centros secretos da CIA

Desde 2002, quase 780 homens muçulmanos, suspeitos de ligações com a rede Al-Qaeda passaram pela prisão de Guantánamo. Eles foram capturados no Afeganistão, no Paquistão, no Iraque ou no Iêmen. Muitos deles transitaram por centros secretos da CIA, localizados em países aliados dos Estados Unidos. Nesses locais, os detidos eram vítimas de muitos abusos, como a simulação de afogamento. Ao chegar a Guantánamo, a tortura continuava.

Na base naval americana, os prisioneiros eram considerados com “inimigos combatentes”, sem data de julgamento ou liberação. Segundo a administração Bush, nem o direito americano, nem o direito internacional, se aplicava a eles.

A grande maioria dos 780 homens, de várias nacionalidades, incluindo a francesa, foram liberados. Eles passaram anos em Guantánamo, sem indiciamento, nem processo. Nenhum deles recebeu indenizações ou pedidos de desculpas. Essa é a expectativa de Lakhdar Boumediene, que passou sete anos em Guantánamo, sem razão. “Não ligo para as indenizações, mas espero um dia ouvir a palavra ‘desculpa’. Perdi uma parte da minha vida por causa deles”, afirma o ex-detento.

Quantos prisioneiros ainda estão em Guantánamo?

A prisão americana da Baía de Guantánamo tem ainda 39 detentos. “Entre eles, 27 já foram ou devem ser declarados liberáveis”, indica a advogada e conselheira de direitos humanos Alka Pradhan. Ela atua nas comissões militares criadas em 2006 para julgar os prisioneiros. Mas até o momento, a administração americana bloqueia qualquer transferência para Estados que ela julga arriscados, como o Iêmen, a Somália, a Síria ou a Líbia.

Os outros detidos são considerados muito perigosos. “Dez presos são acusados por comissões militares em quatro processos diferentes. Cinco são julgados pelos atentados de 11 de setembro. O governo diz que não abrirá nenhum processo contra alguns detentos, mas ao mesmo tempo diz que não vai liberá-los”, informa Alka Pradhan

Paródia de justiça

Assim que foi eleito em 2008, o presidente Barack Obama prometeu que iria fechar Guantánamo em um ano. O atual presidente Joe Biden foi mais prudente e indicou que esse era apenas seu objetivo. O centro de detenção continua aberto.

O processo dos cinco acusados pelos atentados de 11 de setembro não avança justamente por causa da utilização de métodos arbitrários de interrogatório. As confissões obtidas sob tortura não são aceitas pela justiça. Além disso, as administrações sucessivas dos Estados Unidos se recusam a julgar os suspeitos em solo americano. Se eles forem julgados, podem ser condenados à morte.

O brigadeiro John Baker foi de 2015 até dezembro do ano passado o advogado principal da defesa nas comissões militares de Guantánamo. Ele denuncia um sistema tendencioso, uma paródia de justiça, desde o início. "Quaisquer que tenham sido as intenções originais, hoje ninguém pode dizer seriamente que Guantánamo não tenha sido um experimento fracassado", afirma. “Os Estados Unidos escolheram torturar pessoas que estavam sob sua custódia. Isso torna a justiça impossível. O campo de Guantánamo está aberto há vinte anos e apenas um caso foi julgado em vinte anos! A tortura tornou impossível qualquer processo associado a Guantánamo. Com isso, os Estados Unidos deixaram de ser o exemplo que eram para o mundo. É uma farsa da justiça", acusa o brigadeiro.

US$ 540 milhões por ano

Todos os processos estão bloqueados, frustrando as famílias das vítimas dos atentados de 11 de setembro que queriam ver os suspeitos julgados. Os Estados Unidos gastam US$ 540 miilhões por ano para manter os 39 prisioneiros na base naval de Cuba, o que representa US$ 13 milhões por cada detento.

“Mesmo na administração Biden, que havia prometido fechar Guantánamo, vimos na semana passada que uma nova sala de audiência está sendo construída na prisão para manter essa justiça tendenciosa”, reage Alka Pradhan. A não ser por razões políticas, nada justifica a tentativa de continuar esses processos em Guantánamo”, protesta a advogada.

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