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Congresso argentino aprova legalização do aborto até 14ª semana de gestação

O Senado argentino, numa sessão histórica, transformou em lei o projeto que legaliza o aborto, somando a Argentina à lista de lugares onde o aborto é legal na América Latina: Uruguai, Guiana, Cuba e cidade do México. Os movimentos feministas argentinos querem agora influenciar os países vizinhos.

Manifestantes pelo aborto comemoram em Buenos Aires a aprovacao da legalização do aborto até 14ª semana de gestação em 30 de dezembro de 2020.
Manifestantes pelo aborto comemoram em Buenos Aires a aprovacao da legalização do aborto até 14ª semana de gestação em 30 de dezembro de 2020. REUTERS - AGUSTIN MARCARIAN
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Márcio Resende, correspondente em Buenos Aires

Com 38 votos a favor, 29 contra, uma abstenção e quatro ausências, o Senado aprovou o aborto legal até a 14ª semana de gestação, depois de 12 horas de intenso debate.

O resultado não refletiu a paridade de forças que inicialmente os senadores exibiam, fazendo com que a votação tivesse um final incerto. Aos poucos, indecisos decidiram pela aprovação e votos antes contrários tornaram-se favoráveis.

Do lado de fora do Congresso, milhares de pessoas favoráveis e contrárias ao aborto mantiveram-se em vigília para pressionar os senadores.

A luta feminista continua

Assim que os telões anunciaram a vitória da legalização, as "verdes", cor da luta pelo aborto legal, explodiram num grito de vitória seguido de lágrimas e danças de felicidade, enquanto as "azuis", cor símbolo dos movimentos antiaborto, retiraram-se derrotadas.

"A luta vai continuar. Agora será para que a lei seja realidade nos hospitais e para que a regulamentação não coloque novas restrições", indica à RFI a socióloga e militante Valeria Lobos (37).

"A luta será pela implementação da lei. Não basta ter a lei. A Educação sexual, por exemplo, é lei e não se cumpre nas escolas. A lei também abre novos debates na sociedade. A luta começa com o aborto, mas restam muitos assuntos de gênero a serem debatidos", aponta à RFI a estudante de Educação Física e militante Valentina González (20).

Argentina como referência na vizinhança

Na América Latina, apenas o Uruguai, a Guiana, Cuba e a cidade do México permitem o aborto. Com a Argentina, referência regional na luta feminista, o aborto ganha uma projeção inédita.

A lei deve tornar o país uma referência na região. Os movimentos feministas acreditam que podem ser fonte de inspiração para os países vizinhos, especialmente para o Chile que vai redigir uma nova Constituição a partir do ano que vem.

"Esta lei é uma esperança para os demais países da região. É uma demonstração de que é possível. Esse é o maior impulso que a Argentina pode dar aos seus vizinhos: verem o que as companheiras argentinas conseguiram. E nós estaremos aqui para ajudar. Se conseguimos aqui, podemos conseguir em toda a América Latina. É uma esperança para a vizinhança", acredita Valentina González.

Contra-ataque legal

Do outro lado da Praça do Congresso, os contrários ao aborto avaliam recorrer à Justiça. Afirmam que a lei é inconstitucional porque a Constituição argentina define os direitos de uma pessoa a partir da própria concepção.

"Existem vários recursos aos que se pode recorrer, contestando aspectos inconstitucionais. Haverá muita pressão sobre o Poder Judiciário. Vejo um caminho legal sobre inconstitucionalidade e vejo complicada a implementação da lei", diz à RFI o enfermeiro Julián García Irízar (51).

"Que sociedade é essa que permite uma pessoa decidir pela vida de outra totalmente indefesa? Nessa linha, a eutanásia poderia ser proposta na Argentina. Esse não é o caminho", diz Julián.

O Conselho de Advogados de Buenos Aires avaliou que a legalização do aborto "não supera o teste constitucional".

"O direito argentino determina claramente a existência da pessoa humana a partir do momento da concepção", diz o Conselho em nota, detalhando todos os artigos que sustentam a afirmação.

Objeção de consciência

"Num país com fortes carências em saúde e em vários outros aspectos, o aborto vai usar recursos que poderiam ser empregados em outro tipo de coisas a favor da vida", compara o médico patologista Ricardo Sánchez Marull (60).

"Como médico, sei que a vida surge no momento da concepção. Portanto, é nosso dever defendê-la", avisa.

Pela nova lei, os médicos que alegarem ser contra a prática poderão exercer a chamada "objeção de consciência". Essa objeção abrange também hospitais e clínicas, especialmente as que estão ligadas à Igreja católica.

As adolescentes entre 13 e 16 anos de idade deverão estar acompanhadas de um adulto. Essa condição desaparece a partir dos 16 anos.

Na Argentina, a atual lei de 1921 só permite o aborto em caso de estupro ou em casos nos quais a mãe corre risco de vida.

 

 

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