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Fato em Foco

Charlie Hebdo volta às bancas com mais dinheiro e conflitos internos

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O jornal satírico Charlie Hebdo volta a partir desta quarta-feira (25) ao seu ritmo normal de publicação, uma vez por semana. As mudanças foram muitas após o atentado de 7 de janeiro, que deixou 12 mortos. A tiragem saltou de 60 mil para 2,5 milhões de exemplares – explosão de vendas que, somada às doações, fizeram o jornal arrecadar pelo menos € 10 milhões. Mas conflitos internos pelo comando e a dificuldade em recrutar novos cartunistas são alguns dos percalços encontrados neste recomeço.

O cartunista Luz (esquerda) apresentando a edição anterior, a primeira após os atentados.
O cartunista Luz (esquerda) apresentando a edição anterior, a primeira após os atentados. REUTERS
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O número 1179 traz na capa o desenho de um cachorro correndo com uma edição do Charlie entre os dentes, enquanto é perseguido por uma multidão de outros cães enraivecidos. Entre as personalidades que integram a matilha estão a líder da extrema-direita francesa Marine Le Pen, o ex-presidente Nicolas Sarkozy, o Papa Franciso e um jihadista. “Eu quis desenhar um cachorro porque queria simbolizar o retorno da crítica alegre ao Charlie Hebdo”, contou o cartunista Luz à rádio France Info. “E também não queríamos ficar obcecados com o que aconteceu.”

A edição que chega hoje às bancas.
A edição que chega hoje às bancas.

A nova edição do Charlie Hebdo satiriza figuras da política francesa, como o ex-diretor do FMI Dominique Strauss-Kahn, e os jornalistas dizem ter se esforçado para evitar o tema islamismo. Missão impossível na Europa atual: a profanação de um cemitério judaico em Sarre-Union e outro ataque por radicais islâmicos na Dinamarca foram temas que se impuseram nesta edição.

Em uma redação nova, com aluguel bancado pelo governo francês, mas blindada contra atentados, os jornalistas tentarão voltar à atividade normal e bem-humorada do passado. Luz classifica o dinheiro arrecadado após o ataque de “maldito”. Uma reportagem do jornal Le Monde afirma que já há uma briga interna pelo controle acionário do jornal entre os cartunistas que sobreviveram e os familiares herdeiros dos que foram assassinados. Também não há consenso dentro da redação sobre como o jornal deverá ser gerido a partir de agora. Diante da fortuna arrecadada, eles exigem uma nova distribuição acionária.

Charlie Hebdo isolado

Para completar, não está sendo fácil recrutar novos cartunistas. Apenas dois veteranos da imprensa francesa toparam se juntar à equipe. Muitos não aceitaram a tarefa por medo de novos atentados. Para Guillaume Doizy, especialista em história da caricatura, a falta de candidatos não chega a surpreender: “Não é apenas falta de cartunistas ou medo de trabalhar no Charlie Hebdo, mas é uma fratura. A grande maioria dos jornalistas não está disposta a ir tão longe na defesa da liberdade de expressão”. Doizy afirma que o Charlie Hebdo era uma publicação isolada antes do 7 de janeiro e que, apesar da comoção, isso não se modificou consideravelmente. “Ele continuou muito isolado nessa convicção de que deveria ir até o fim nas caricaturas de Maomé”, afirma o historiador.

Na redação do Charlie Hebdo, não há nenhum sinal de que o jornal pretenda recuar em suas posições. O cartunista Patrick Pelloux foi taxativo ao afirmar ao Le Monde que “aqueles que acham que não se pode caricaturar tudo escolheram o seu lado”. Para Pelloux, “estamos diante de uma ideologia intransigente e não vamos ceder. O Charlie Hebdo está em guerra pela laicidade”. Resta saber se o dinheiro será o suficiente para o jornal manter esta guerra ou se a falta de soldados poderá ser um problema. Christian Debize, diretor da Escola National Superior de Arte de Nancy, um celeiro de cartunistas da França, nos explica que a realidade mudou entre os estudantes: “Eles descobriram que desenhar pode matar.”

Debize acredita que há uma questão geracional que pode mudar a maneira de se fazer humor a partir de agora: ”Há hoje em dia mais auto-censura do que havia há 20 anos. Os estudantes se perguntam bastante sobre até que ponto se pode ir, onde está o limite. E não tenho certeza de que para a geração do Charlie Hebdo essa questão do limite existia."

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