Quase um mês depois dos atentados terroristas que deixaram 17 mortos em Paris, o governo francês decidiu lançar uma campanha de prevenção contra a radicalização dos jovens que decidem abandonar escola, família e amigos para lutar ao lado dos jihadistas do grupo Estado Islâmico na Síria e no Iraque.
Os irmãos Saïd e Chérif Kouachi, autores do massacre na redação do jornal Charlie Hebdo, e Ahmed Coulibally, o extremista que atacou o supermercado kosher parisiense, têm esse perfil. Nascidos e educados na França, tinham a liberdade de circular livremente nas fronteiras -o que dificultou o controle da polícia e dos serviços secretos.
De acordo com o Ministério do Interior francês, cerca de 1300 franceses estão envolvidos em operações na Síria e no Iraque, onde o grupo Estado Islâmico controla uma parte do território. Para lutar contra o aliciamento dos jovens, o governo lançou no fim de janeiro a campanha “Stop Jihadisme”, que inclui um spot na TV e um site inteiramente dedicado à questão.
A campanha
O objetivo da campanha é desconstruir a propaganda jihadista na Internet, considerado como o primeiro “vetor” de radicalização dos futuros extremistas. "Eles dizem : "Sacrifique-se ao nosso lado, você defenderá uma causa justa". A campanha rebate : "Mas, na verdade, você descobrirá o inferno na terra e morrerá longe de sua casa", diz um dos trechos do vídeo produzido pelo governo francês.
De acordo com dados do governo, entre 80 % e 90 % dos franceses envolvidos em grupos terroristas foram recrutados na Internet e nas redes sociais. O lançamento do site é acompanhado de uma série de medidas para lutar contra o terrorismo, que incluem também uma legislação mais adaptada ao monitoramento da Internet. Segundo o primeiro-ministro Manuel Valls, serão investidos mais de 60 milhões de euros contra a radicalização.
“Hoje estamos enfrentando uma verdadeira guerra, e esse combate passa também pelas ideias. Lançar essa campanha foi uma boa iniciativa. As imagens, as mensagens escritas que acompanham essas imagens e os sons que acompanham essas mensagens, são significativos. De certa forma, utilizamos os mesmos argumentos daqueles que querem vender o jihad. É uma maneira eficaz de desmontar esse raciocínio imoral”, diz o general francês Marc Watin-Augouard, consultor em Segurança Cibernética do Ministério do Interior.
As duas faces da Internet
Hoje o governo francês, assim como outros países, enfrenta as dificuldades de agir no espaço cibernético, onde não existem fronteiras e uma legislação que unifique as ações dos Estados. Além disso, as ideias circulam livremente –uma das características positivas da web, mas que também alimenta o doutrinamento extremista. A cooperação policial e judiciária, diz o especialista francês, é, desta forma, limitada.
A proteção da privacidade na Internet, objeto de discussões acaloradas, é outra questão. Na França, a adoção de uma lei nos moldes do "Patriot Act" americano, que autoriza a estocagem de dados, é vista com revolta pelos movimentos que defendem as liberdades individuais, como explica Watin-Augouard.
"Tentamos fazer essa coleta visando alvos mais específicos. Mas isso está longe de ser simples. Justamente por isso, o governo francês reforçou seu contigente de policiais e equipes de segurança cibernética. É na Internet que acontece a maior parte das infrações terroristas ligadas aos conteúdos: a apologia, a provocação e a distribuição de instruções. É assim que o sistema terrorista funciona, pela capacidade de uma rápida mobilização", explica.
Cerca de duas semanas após os atentados, o ministro do Interior francês, Bernard Cazeneuve anunciou que pretende reforçar o monitoramento da Internet, principalmente nas redes sociais. Mas, para o general francês, o papel do governo nãodeve ser o de um "censor." "É preciso encontrar um equilíbrio justo entre as investigações e a liberdade absoluta na Internet”, conclui o entrevistado.
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