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Radar econômico

FMI é mais compreensivo com a Grécia do que foi com Brasil e Argentina

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O primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras, aponta o Fundo Monetário Internacional (FMI) como o principal responsável pelo bloqueio das negociações de um acordo entre Atenas e os credores internacionais sobre a continuidade da ajuda financeira ao país. Especialistas, no entanto, indicam que o FMI jamais foi tão flexível quanto está sendo com os gregos – ao ponto de os países que receberam ajuda financeira no passado, como o Brasil e a Argentina, hoje reclamarem dessa diferença de tratamento.

O ministro das Finanças francês, Michel Sapin, durante coletiva da reunião da zona do euro sobre a situação econômica na Grécia.
O ministro das Finanças francês, Michel Sapin, durante coletiva da reunião da zona do euro sobre a situação econômica na Grécia. REUTERS/Yves Herman
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O FMI se recusou a ampliar os prazos de reembolso do empréstimo por Atenas. Nesta segunda-feira (29), o ministro francês das Finanças, Michel Sapin, negou que o fundo monetário esteja travando o diálogo. Sapin destacou que a instituição tem sofrido pressões internas dos países latino-americanos.

“O Fundo Monetário Internacional não responde somente aos países europeus: ele deve responder aos países do mundo todo. E, entre eles, você sabe quais são os mais exigentes? A Argentina, o Brasil”, disse, em entrevista à rádio France Inter. “Países que, no passado, se beneficiaram da ajuda do FMI e que perguntam para a diretora-geral: por que você é mais flexível com um país europeu do que você foi conosco? Por que você é mais legal com os gregos, sob o pretexto de que são europeus, do que você foi conosco?”

Prioridades

O professor universitário Paulo Roberto de Almeida, diplomata em Hatford (EUA) e ex-responsável pela divisão de política financeira do Itamaraty, constata que essa diferença entre os países é verdadeira. O tratamento depende da situação política e econômica de cada um, assim como dos objetivos estratégicos dos organismos internacionais de crédito em cada região.

É por isso que manter a estabilidade da zona do euro foi uma tarefa muito mais primordial para o FMI do que salvar os países latinos da crise da dívida externa, nos anos 1980. Sem contar que a credibilidade de cada país vai se construindo com o passar das décadas.

“O Lula só foi eleito em 2002 quando fez uma carta ao povo brasileiro prometendo honrar todos os seus compromissos, no mesmo momento em que o Brasil fazia o seu terceiro acordo com o FMI”, explica o professor, que recentemente publicou um artigo sobre a história das relações entre o Brasil e o fundo. “Em agosto daquele ano, o Brasil fez um acordo emergencial de empréstimo de US$ 30 bilhões. Ele cumpriu os termos do fundo monetário até 2005, quando quitou o que devia ao FMI e ficamos sem mais nenhum compromisso.”

Reformas não saem

O economista Christophe Destais, diretor-adjunto do Centro de Estudos e Prospectivas de Informações Internacionais (CEPII), ressalta que os europeus são os principais provedores do FMI, uma razão essencial para explicar a postura mais compreensiva em relação à Grécia.

“Há uma influência europeia no FMI que suscita amargura nos países emergentes. As reformas na governança do fundo monetário para dar mais peso a esses países avançaram muito pouco – embora isso tenha ocorrido não por causa dos europeus, mas dos Estados Unidos, que, em 2010, bloquearam a ratificação das mudanças”, constata.

Ajuda inédita à UE

Desde o início da crise na zona do euro, os países asiáticos questionam o financiamento, pelo FMI, de parte do resgate financeiro fornecido para a Grécia, Irlanda, Portugal e Chipre. Destais observa que o fundo se encontra em uma situação inédita: atualmente, 72% do crédito do FMI foi para países europeus. A exposição alta gera riscos elevados à instituição internacional.

“É verdade que o FMI não aplicou aos países latinos e outros, como os asiáticos, as mesmas regras que à Grécia e também não aceitou uma concentração tão importante dos seus próprios riscos quanto fez com a zona do euro. O tratamento, pelo FMI, da crise da zona do euro é uma completa transgressão em relação à sua história e à sua vocação inicial”, afirma o pesquisador francês.

Para Almeida, Atenas não se encontra na impossibilidade de honrar seus pagamentos: trata-se, sobretudo, de um caso de enfrentamento político, encabeçado pelo governo de esquerda radical de Tsipras.

“O governo grego aceitou esses termos cinco anos atrás, e o governo atual não quer honrar esse compromisso: é uma questão de faltar à palavra dada. Os credores estão muito lenientes, muito compreensivos, mas chega um momento em que você precisa dizer: os termos acertados foram estes e você precisa honrá-los”, analisa.

Hoje, o Banco Central Europeu é a única fonte externa de recursos da Grécia, que não tem mais acesso aos mercados financeiros internacionais.

 

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