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Brasil/Crise

Reportagem do Le Monde aponta tendência de regressão social no Brasil

A edição do Le Monde com data de quarta-feira (30) traz mais uma matéria de página inteira sobre a crise econômica e política no Brasil. Pessoas que perderam o emprego testemunham a violência da recessão e manifestam revolta com a regressão social em andamento. Economistas apontam erros no modelo de desenvolvimento do país. 

Agência de empregos ilustra reportagem sobre a crise no Brasil, na edição de hoje do jornal Le Monde.
Agência de empregos ilustra reportagem sobre a crise no Brasil, na edição de hoje do jornal Le Monde. Fotomontagem RFI/ cachoeirinha.rs.gov.br
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A correspondente do Le Monde em São Paulo, Claire Gatinois, não poderia ter encontrado um personagem mais típico e justo para iniciar sua matéria. Na introdução do texto, ela conta a história da baiana Dilma Tavares Andrade - a coincidência do nome é proposital -, que deixou o interior da Bahia aos 13 anos para trabalhar em São Paulo. Ela acumulou todos os trabalhos possíveis (vendedora, garçonete, faxineira, costureira, babá, consultora de produtos cosméticos) e hoje, aos 38 anos, está desempregada há dois meses.

A baiana Dilma, que mora em Diadema, "é uma lutadora", diz o Monde. Como milhares de mulheres brasileiras, ela não deixa a peteca cair porque "tem dois filhos para criar, está se separando do marido, mas faz, sempre bem-arrumada, duas horas de transporte todos os dias, em busca de um trabalho em São Paulo". E não encontra nada, nem sem carteira assinada. Para a Dilma de Diadema, a culpada por essa crise é a Dilma no poder em Brasília.

Violência da recessão

"O Brasil afunda na recessão desde o início do ano, com uma projeção de queda do PIB prevista entre 2% e 3%, preços em alta, uma moeda em queda livre e uma taxa de desemprego que chegou a 7,6% em agosto, praticamente o dobro em 12 meses", informa o Le Monde.

A baiana Dilma conta que os brasileiros estão furiosos com a presidente. "Ela mentiu, aumentou os preços da luz e do gás logo depois de ser reeleita. Nos tempos do Lula, eu consegui comprar TV, máquina de lavar roupa e até uma casa", relata Dilma com nostalgia.

Ouvido pela reportagem, o sociólogo Daniel Pereira Andrade, professor na FGV-SP, diz que essa nova classe média formada por ex-domésticas e operários, "esse subproletariado que havia saído do circuito informal da economia, agora corre o risco de retornar" à precariedade.

O jornal constata que a atual crise brasileira, descrita como "súbita e violenta", também atinge a classe média.

O segundo personagem entrevistado na matéria é Fernando Penavel, engenheiro de 49 anos, que até pouco tempo ganhava um salário de R$ 11 mil; Ele perdeu recentemente o emprego que tinha há dez anos. A empresa em que o engenheiro trabalhava, no setor têxtil, demitiu 1.000 trabalhadores em um ano; "Mas com a queda das vendas, a medida foi insuficiente", lamenta Fernando. O brasileiro conta que nem no ápice da crise financeira internacional de 2008, o baque foi tão violento.

Norman Gall, diretor-executivo do Instituto Fernand-Braudel, de São Paulo, avalia que o Brasil corre grande perigo. "Vinte anos de progresso estão ameaçados", diz o especialista. Ele afirma que a crise é estrutural, mas é clemente com a presidente Dilma. "Ela piorou as coisas, mas não é a única responsável", afirma Gall.

Modelo errado

O economista André Nassif, da Fundação Getúlio Vargas, explica à reportagem do Le Monde que a estratégia de crescimento adotada pelos sucessivos governos brasileiros desde a década de 90 está errada. Segundo Nassif, basear o crescimento na atração de capital estrangeiro é um erro.

"Para impedir o capital estrangeiro de sair do país, o governo é obrigado a manter a moeda em um nível artificialmente elevado", diz. Essa apreciação do real "é alta o suficiente para seduzir o capital volátil, mas prejudica a competitividade do país", resume.

Na opinião de Nassif, com um modelo nesses termos, o Brasil está condenado a depender dos especuladores. "Se o Brasil não mudar profundamente de modelo econômico, o país vai alternar períodos de crescimento efêmeros, pontuados de crises frequentes", avalia. Nassif considera que uma moeda forte é luxo de país desenvolvido. "Um luxo que o Brasil ainda não pode se permitir", conclui o economista.

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