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1° de Maio na França: ato 'histórico' contra reforma da Previdência consolida tradição de megaprotestos

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Dia 1° de maio é feriado na França, mas, ao contrário do Brasil, a data é também um dia de megamanifestações, no contexto dos protestos contra a reforma da Previdência, defendida pelo presidente francês, Emmanuel Macron. Após 12 dias de manifestações contra a mudança, que aumenta a idade legal de aposentadoria de 62 para 64 anos, os sindicatos exigem a "revogação" do texto. A historiadora e conselheira departamental franco-brasileira Silvia Capanema conversou com a RFI sobre a mobilização.

Manifestante usando um adesivo do PCF, o Partido Comunista Francês, e um ramo de lírio-do-vale, uma tradição do Primeiro de Maio, durante o Dia do Trabalho de 2022 em Lille, no norte da França.
Manifestante usando um adesivo do PCF, o Partido Comunista Francês, e um ramo de lírio-do-vale, uma tradição do Primeiro de Maio, durante o Dia do Trabalho de 2022 em Lille, no norte da França. AFP - DENIS CHARLET
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"O Primeiro de Maio na França é um grande feriado, até os museus fecham, mas é também um dia de manifestações historicamente, porque começa a ser instalado enquanto marco de protestos a partir de uma greve geral nos Estados Unidos, no fim do século XIX", lembra a historiadora, professora da Universidade Sorbonne Paris Nord e conselheira departamental franco-brasileira, Silvia Capanema. "Hoje não é mais o feriado lá nos EUA, mas na França e em vários países, continua sendo desde a Segunda Internacional Socialista, em 1889, quando é instaurado então um dia de luta", diz a pesquisadora.

"A ideia era defender a jornada de trabalho de oito horas, defender a redução do tempo de trabalho. Era a defesa de uma jornada de trabalho de 8h durante seis dias, porque naquela época se trabalhava até sábado, que será finalmente conquistada somente no entreguerras", aponta Capanema. "Nos Estados Unidos, em alguns países e na França, até mesmo depois da Segunda Guerra, essa data do Primeiro de Maio se torna um marco", detalha.

Silvia Capanema lembra que o Primeiro de Maio na França é um dia de "manifestações dos sindicatos, dos partidos, das esquerdas", mas que também é apropriado "até pelas direitas". "Historicamente tem sido assim, até na época da ocupação nazista. E, com o colaboracionismo do Marechal Pétain [líder do vergonhoso governo de Vichy] a data foi reapropriada, retomada como uma data para homenagear o corporativismo do trabalhador. Mas a que fica mesmo é a data dos sindicatos. Mas hoje até a extrema direita também faz atos utilizando a data", afirma.

Joana D'Arc

Na França, muitas vezes a classificação "identitária" se refere a manifestações vindas de grupos da extrema direita. É o caso, como lembra Capanema, da atual tentativa de Marine Le Pen de instrumentalizar o Primeiro de Maio homenageando símbolos de uma passado distante francês, resgatados pela extrema direita enquanto afirmação de um ultranacionalismo utópico, como a figura de Joana D'Arc. "É bem menor do que as manifestações dos sindicatos. Mas tem sim essa disputa de memórias", aponta. 

Após 12 dias de mobilizações contra a reforma da Previdência, que aumenta a idade legal da aposentadoria de 62 para 64 anos na França, os sindicatos franceses planejam então realizar uma mobilização histórica, criando um "maremoto" nas ruas nesse Primeiro de Maio, exigindo a revogação do texto defendido por Macron e por sua primeira-ministra, Élisabeth Borne. "Hoje, então, teremos a 13ª jornada de luta", diz Capanema. "Haverá grandes mobilizações intersindicais nos desfiles, é esperado uma manifestação histórica com 300 cidades, com participação maior que nos últimos anos", antecipa.

"E a pauta vai ser como era [na época da Revolução Industrial, quando o Primeiro de Maio foi criado]: a redução do tempo de trabalho no dia, mas também no tempo de vida dos trabalhadores", compara a conselheira. "Então a redução da idade para a aposentadoria continua sendo a pauta num clima de tensões, porque o Emmanuel Macron e sua primeira-ministra. apostam que eles vão ganhar", diz Silvia, que hoje é filiada ao partido França Insubmissa (esquerda radical), que faz parte da legenda NUPES, uma grande coligação que reúne partidos de esquerda na França no Parlamento.

"Os sindicatos e os movimentos sociais apostam na luta contínua e que hoje está nas ruas. Por exemplo. ontem no jogo de futebol [decisão da Copa da França, vencida pelo Toulouse], houve um momento de distribuição de cartões vermelhos de sindicatos na porta da entrada, porque era a final. É uma tensão das forças, o Emmanuel Macron não pôde se exibir publicamente, porque em todo lugar que ele tem ido publicamente, ele é vaiado", considera. "Agora os franceses também adaptaram o ritual dos panelaços; inclusive um dos ministros, o do Interior, tentou proibir o uso de objetos que fazem barulho nos protestos", lembrou.

Trabalhador em pauta no Brasil

Os trabalhadores também estão em pauta neste Primeiro de Maio brasileiro. Capanema avalia que "o presidente Lula anunciou essas duas medidas que são importantes: aumento salarial e a questão da isenção de impostos progressiva até o fim do mandato", destaca.

"A ideia é melhorar o poder de compra dos brasileiros, porque a inflação tem corroído bastante os salários e uma das questões muito sérias que ele prevê, nas entrelinhas, é o desaparecimento do emprego formal, né? Ele reconhece esse diagnóstico e vai trabalhar pelo emprego formal, para que o crescimento e a geração de empregos esteja de volta no Brasil", analisa.

"Então ele tem uma posição bem consciente de que os problemas conjunturais, principalmente nos últimos anos, foram agravados e que é preciso agir para modificar isso. Ele assume a situação e faz propostas agora. Mas o que todos esperam é como elas vão ser aplicadas. O aumento do salário mínimo, por exemplo, é insuficiente", conclui a pesquisadora.

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