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Rendez-vous cultural

Legendária banda Azymuth comemora 50 anos de carreira com shows na Europa

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Em cinco décadas de estrada, os brasileiros do Azymuth conquistaram o seu espaço entre as bandas cult na França e em muitos países. O cartão de visitas do trio é um jazz-funk com pitadas de samba, que atrai admiradores no mundo todo. A RFI Brasil conversou com eles em Biarritz, onde o grupo foi um dos convidados do Festival de Cinema Latino-Americano, encerrado no domingo (2).

O trio Azymuth comemora 50 anos de estrada com shows na Europa. Eles conversaram com a RFI Brasil no Festival de Cinema Latino-Americano de Biarritz.
O trio Azymuth comemora 50 anos de estrada com shows na Europa. Eles conversaram com a RFI Brasil no Festival de Cinema Latino-Americano de Biarritz. © RFI Maria Paula Carvalho
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Maria Paula Carvalho, enviada especial à Biarritz

Longe de descansar sobre os louros, os integrantes do Azymuth continuam a inovar e a fazer shows, como conta o baterista Ivan Conti, mais conhecido como “Mamão”, único integrante da formação original presente nessa turnê europeia. “Tocar é muito bom, ainda mais aqui. A gente viaja, as pessoas nos recebem muito bem e a gente troca emoção com o público. Isso é fabuloso”, diz o carioca, de 76 anos, que nem pensa em aposentadoria. “A gente tem bastante fãs, eu acho que aqui no exterior um pouco mais do que no Brasil. Mas temos bastante público”, disse, poucos minutos antes de subir ao palco da Gare du Midi, antiga estação de trens de Biarritz, balneário no sudoeste da França.

“Eu diria que eles estão mais jovens: Mamão, Alex Malheiros (76 anos), meus parceiros”, reforça o tecladista mineiro Kiko Continentino, que entrou no grupo após a morte de um dos fundadores, José Roberto Bertrami, em 2012. “A energia é cada vez maior. E cada vez mais alta. Uma densidade. Porque para tocar jazz, temos que estar juntos e emanar aquilo”, disse à reportagem da RFI Brasil durante o ensaio para o show que a banda faria como um dos destaques musicais da programação do Festival de Cinema Latino-Americano de Biarritz. Este ano, o evento homenageou o Brasil.

“E agora, temos esse cara maravilhoso, salvando a gente, um paulistano”, completa, ao apresentar o baixista Moyses dos Santos, que assumiu o lugar de Malheiros em certas apresentações. “É um sonho, porque eu cresci ouvindo eles. É como tocar com os seus heróis”, compara Moyses, que atualmente vive em Londres.  

Assim como ele, muitos músicos da nova geração cresceram ouvindo Azymuth. Em uma carreira tão longeva, o grupo tem mais de 30 álbuns gravados e já tocou em diversos países. Em 1976, foi a primeira banda brasileira a se apresentar no tradicional Festival de Jazz de Montreux, na Suíça. “Foi sensacional, um evento maravilhoso porque acabamos de tocar e nos convidaram para ficar mais uma semana”, lembra Ivan Conti.

Capas dos discos do grupo brasileiro Azymuth.
Capas dos discos do grupo brasileiro Azymuth. © RFI Maria Paula Carvalho

O início de tudo

Boa parte do repertório do Azymuth foi composta nos intervalos de gravações para outros artistas, já que os três músicos de estúdio acompanhavam grandes estrelas da MPB. “Chico Buarque, Milton Nascimento, Elis Regina, Clara Nunes, Raul Seixas, Rita Lee”, cita Ivan Conti, ao relembrar a lista de nomes com os quais já trabalhou. “O interessante é que o primeiro Azymuth que nós fizemos já foi praticamente autoral. Começamos a fazer no estúdio, nos intervalos que a gente tinha, porque tocávamos com todos esses artistas”, diz.  

Formado no início dos anos 1970, o Azymuth “se beneficiou da onda do jazz-funk internacional ao mixar esses gêneros ao soul, samba e bossa nova”, contextualiza Hugo Casalinho, programador musical da Rádio França Internacional (RFI), que conheceu o grupo ainda nos anos 1990, época em que a banda foi redescoberta por DJs internacionais. “Era o grupo brasileiro preferido dos americanos”, observa Casalinho, comparando o talento dos brasileiros a nomes como Herbie Hancock, um dos mestres do jazz nos Estados Unidos.

Foi nas ondas das “rádios livres”, um sinônimo de rádio pirata na França dos anos 1970, quando estações clandestinas funcionavam para exigir liberdade de expressão e o fim dos monopólios estatais na transmissão de rádio e televisão, que o DJ Domissoul conheceu o som do Azymuth. “Eles tinham essa aura de qualidade, essa beleza única de discos muito bem produzidos, como os grandes jazzistas americanos”, compara o colecionador e programador francês, que diz já ter esquentado muitas pistas de dança em Paris com Azymuth.

O Dj francês Domissoul é um admirador do grupo brasileiro Azymuth.
O Dj francês Domissoul é um admirador do grupo brasileiro Azymuth. © RFI Maria Paula Carvalho

Remixes

Foi só em 1994, com a explosão do acid jazz de bandas que cultuavam o som do Azymuth, como Jamiroquai e Incognito, que a gravadora inglesa Far Out Recordings, do empresário e produtor Joe Davis, especializada em música brasileira, ofereceu um contrato para o Azymuth gravar novamente. Assim, a partir de 1996, começaram a sair discos que se tornaram clássicos, como "Carnival".

Ainda hoje, o Azymuth exerce uma influência decisiva na dance music. Uma das principais razões desse novo interesse pelo grupo se deve aos remixes de suas canções por importantes DJs da cena eletrônica europeia. “Os DJs são fantásticos, pois empurraram o barco de muita gente”, observa Ivan Conti. “A primeira vez que fizeram uma mix da gente foi nos anos 1990, logo no começo, feito pelo Rony Size. Quando a gente tocava com outros artistas, você não tem a ficha técnica, mas eles sabem quem está tocando, são pesquisadores”, completa o baterista do Azymuth.

O LP original do hit "Jazz-Carnival" é muito procurado por colecionadores de discos, como o francês Laurent Signoret. “Eu tenho cerca de 80% dos discos deles. Me faltam só um ou dois, os mais raros e difíceis de encontrar”, diz em entrevista à RFI Brasil. “Eu conheci o Azymuth ouvindo a rádio BBC de Londres, em programas de DJs como Gilles Peterson e logo gostei, porque adoro jazz, soul, funk e música brasileira, e eles misturam tudo isso”, define.    

"Como músicos de jazz, eles podem tocar praticamente tudo, eles têm o feeling. E o interessante é que eles levam toda essa técnica para um estilo muito pessoal”, observa Signoret. “É bem instrumental, mental, que faz viajar e que te dá vontade de dançar. Evoca o Brasil, a paisagem, o calor, e é isso que faz a gente sonhar na música deles”, completa. “Eles continuam na moda porque não seguem moda. Eles têm um estilo próprio, por isso são tão populares”, finaliza.

O francês Laurent Signoret mostra os álbuns do Azymuth que tem em sua coleção de LPs, em Paris.
O francês Laurent Signoret mostra os álbuns do Azymuth que tem em sua coleção de LPs, em Paris. © Maria Paula Carvalho

Renovação de plateias

Além da originalidade, o carinho do público e a qualidade do trabalho foram importantes para o Azymuth continuar a ser uma referência ininterrupta na cena jazz no Brasil e no resto do mundo, 50 anos após a sua estreia.

“O que mostra que a qualidade é permanente, perene. Pode passar um tempo, mas ela é redescoberta”, observa o tecladista e compositor Kiko Continentino. “Os DJs foram importantes nessa cena e o público também. Um público cada vez mais jovem e isso é uma coisa linda. Outra coisa que mudou é que tem havido mais brasileiros nos shows, isso eu tenho observado de dois anos para cá”, diz o músico que trabalha incansavelmente para manter vivo o espírito do Azymuth.

Além da França, a turnê europeia passou pelo Reino Unido, Alemanha e Suécia, numa prova de que o Azymuth não mostra absolutamente nenhum sinal de desaceleração e olha para o futuro.

Cartaz do show do trio brasileiro Azymuth no Festival de Cinema Latino-Americano de Biarritz.
Cartaz do show do trio brasileiro Azymuth no Festival de Cinema Latino-Americano de Biarritz. © RFI Maria Paula Carvalho

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