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O Mundo Agora

Alemães fogem de restrições sanitárias e criam condomínios antivacina na Bulgária

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Pode parecer uma anedota, mas não é. Grupos de alemães insatisfeitos com o rigor progressivo das medidas sanitárias estão deixando o país e se refugiando na Bulgária, sobretudo às margens do Mar Negro, para escapar das restrições.

Controle do passaporte sanitário em uma praça de Berlim, em 28 de novembro de 2021.
Controle do passaporte sanitário em uma praça de Berlim, em 28 de novembro de 2021. AP - Carsten Koall
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Flávio Aguiar, de Berlim

Segundo uma reportagem publicada na revista Der Spiegel, o principal grupo deste movimento se estabeleceu em um prédio na cidade de Aheloy, na Bulgária. Esse pequeno balneário praiano e centro turístico desde os tempos do regime comunista, foi oficialmente abolido a partir da débâcle da União Soviética no começo dos anos 90 do século passado.

Os militantes se estabeleceu num condomínio que leva o nome da cidade com um sotaque francês - Château Aheloy. Seu líder, Dirk Gelbrecht, criou um grupo da plataforma Telegram, o “Imigrantes Alemães na Bulgária”, que já conta com 2.500 membros. No condomínio - com acesso controlado, portão de ferro e vigias próprios - vivem cerca de 60 pessoas, e o plano é chegar a 100.

Com o apoio do proprietário, Stanko Gyurov, Gelbrecht pretende instalar ali uma segunda piscina, uma rede própria de lojas e o tradicional “Bier Garten” alemão - um grande bar ao ar livre onde se toma preferencialmente cerveja.

Há uma segunda comunidade deste tipo na cidade de Varna, mais ao norte da Bulgária, também às margens do Mar Negro, instalada no condomínio de nome “South Bay”, assim, em inglês. Por que o Mar Negro? Pela excelência do clima considerado ameno diante do rigoroso inverno alemão. Por que a Bulgária? Para fugir do repudiado rigor das medidas sanitárias alemãs.

O povo que busca esse tipo de refúgio detesta vacinas, abomina o uso de máscaras, abriga e divulga toda a gama de teorias conspiratórias sobre a pandemia, a quem chamam pejorativamente “plandemia”, por verem nela apenas uma retórica encobrindo um plano para dominar o mundo por parte de grandes corporações.

O que é que a Bulgária tem? 

A Bulgária tem a menor taxa de vacinação da Europa: apenas 30% da população está imunizada. Embora a posição oficial do governo seja pelo uso de máscaras em lojas e outros locais públicos fechados, e os grandes supermercados sigam a norma, ela não é respeitada nos pequenos comércios, em bares ou restaurantes. Para quem detesta as medidas sanitárias, a Bulgária equivale a um pequeno paraíso.

Registre-se também que, para quem vem da Alemanha, a Bulgária apresenta preços de compra ou aluguel de imóveis extremamente atraentes. Em Aheloy pode-se alugar um apartamento por menos de € 250 mensais, um preço inimaginável nas cidades alemãs, para não falar nas francesas, inglesas, italianas e outras.

A linguagem de Gelbrecht, do Château, lembra a de Donald Trump e de outros líderes da extrema direita: “O desonesto e hipócrita sistema político e midiático alemão deve ser destruído”, declarou ele ao Der Spiegel

O gesto extremo deste grupos de alemães espelha a nova fase do que se pode chamar de “a guerra das vacinas” no continente europeu. Pouco a pouco, mas a passos decididos, vários governos vêm endurecendo as medidas coercitivas contra os que se recusam a ser vacinados.

Na França, a Câmara de Deputados aprovou uma lei que agora vai ao Senado, que na prática proíbe o acesso a um sem número de locais públicos por parte de quem não seja imunizado. A medida está em discussão na Alemanha e em outros países - como na Áustria, Itália, Espanha, Portugal, Reino Unido - a pressão é grande sobre quem recusa a vacinação.

Protestos em vários países

Neste começo de ano registraram-se enormes manifestações de protesto em diversas cidades francesas, também na Áustria, Itália e Alemanha. Em Berlim, o protesto assumiu a forma de uma carreata, acompanhada por bicicletas e motos, aproveitando alguns dias de temperatura mais amena.

A principal alegação para tal endurecimento é a de que os hospitais estão lotados sobretudo por não-vacinados e isto vem prejudicando também pessoas que precisam de outros tratamentos. Há relatos pungentes de esgotamento por parte de profissionais da saúde; crescem os números de demissões e aposentadorias no setor. Sistemas de vacinação e de coleta de dados vêm entrando em colapso por falta de trabalhadores, atingidos pela Covid-19 e suas novas cepas, especialmente a ômicron, de propagação mais rápida. Há um sentimento generalizado de confusão e medo diante do que possa vir a acontecer.

Por sua vez, os partidos de extrema direita vem procurando capitalizar o sentimento antivacina e contrário às medidas sanitárias, acusadas de comprometer a “liberdade de escolha” por parte dos cidadãos. Esgrimem-se termos exagerados como “novo holocausto” e “apartheid” para caracterizar o que veem como uma “discriminação odiosa” contra aqueles que recusam a vacina. Esta tendência assume proporções dramáticas na França, com eleições presidenciais marcadas para abril, mas ela está presente em toda a Europa. 

Os defensores da vacinação acusam os negacionistas de falta de solidariedade e de pretenderem viver num mundo paralelo. No que toca aos alemães que estão se refugiando na Bulgária, realmente há uma busca de construção de um mundo paralelo nos condomínios fechados onde, pelo visto, pretendem passar o resto dos seus dias.

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