Acessar o conteúdo principal
Linha Direta

Para onde vão as armas enviadas pelo Ocidente à Ucrânia após a guerra?

Publicado em:

Na expectativa de avanço nas negociações por um cessar fogo definitivo na Ucrânia, analistas alertam para uma problemática bélica complicada: o destino das armas enviadas para o país e o risco desse arsenal abastecer grupos extremistas no futuro.

Sem mandar soldados temendo desencadear uma terceira guerra mundial, a saída dos Estados Unidos e países europeus foi armar o Exército ucraniano.
Sem mandar soldados temendo desencadear uma terceira guerra mundial, a saída dos Estados Unidos e países europeus foi armar o Exército ucraniano. AFP - HANDOUT
Publicidade

Raquel Miura, correspondente da RFI em Brasília

Um volume abundante de armas e munições tem sido enviado por países do Ocidente para a Ucrânia desde a invasão russa. Sem mandar soldados sob alegação de que isso poderia ensejar uma terceira guerra mundial, a saída dos Estados Unidos e países europeus nessa encruzilhada foi armar o Exército ucraniano, mas não apenas os militares. Civis engrossam a resistência, inclusive voluntários de vários outros países, até do Brasil. Muitos pegaram o rumo de Kiev após um apelo do presidente Volodymyr Zelensky, que convocou ajuda para a luta contra as forças de Vladimir Putin.

O cenário suscita em muitos analistas a pergunta sobre o destino de todo esse armamento quando o conflito acabar. Rafael Alcadipani, professor da FGV e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, teme que tal legado bélico abasteça grupos extremistas, principalmente do leste europeu. “Essas armas de fogo, algumas delas muito potentes, podem ser vendidas depois. Você tem um país que precisará ser reconstruído, com pessoas com necessidades financeiras. Essas armas podem ser vendidas e mesmo cair nas mãos de grupos organizados do leste europeu”.

Alcadipani diz que a situação é delicada porque nessa região “há algumas facções criminosas de peso, numa área com histórico de guerra civil, de grupos extremistas que cometem ataques contra outros grupos”. Para o analista, a geopolítica atual torna compreensível que os países tenham optado por armar os ucranianos frente à invasão da Rússia. “Mas há um risco e isso infelizmente já vimos outras vezes na história, como no Iraque, no Afeganistão. Quando você arma um grupo para defender interesses pró-Ocidente, esses grupos podem se rebelar, mudar de oposição e até mesmo atacar o próprio Ocidente”.

Do lado russo, há informação também de recrutamento, no caso de sírios e mercenários, para reforçar o campo de batalha. Embora para os analistas o risco maior é de que armas e munições alcancem forças paralelas radicais daquela região do conflito, existe também a chance de estragos do lado ocidental, visto por exemplo o 11 de setembro nos Estados Unidos.

Augusto Veloso Leão, doutor em Relações Internacionais e pesquisador da PUC Minas, afirmou à RFI que o olhar mais amigável da Europa para os ucranianos, na comparação com refugiados de outras partes que hoje chegam ao continente, pode favorecer a difusão desse armamento. “O que podemos esperar é que os países vizinhos da Ucrânia estabeleçam uma verificação eficaz na fronteira para evitar que armas sejam contrabandeadas para dentro do território europeu. Porém, a dupla moral que podemos observar sendo aplicada aos refugiados da Ucrânia pode relaxar o trânsito de pessoas e facilitar o contrabando”, disse Leão.

Citando outros especialistas, como Edwin Bakker e Jeanine van Zuijdewij, Veloso Leão diz que as chances de ataques globais e em outros países não é grande pois, segundo ele, ex-combatentes encontram dificuldades de movimentar uma grande quantidade de armas para outros países sem serem detectados pelo monitoramento dos órgãos de segurança, especialmente nos países desenvolvidos. “Então o risco é maior para os países vizinhos daquela região, inclusive onde existe resistência contra o governo russo”.

Sequelas psicológicas e ideais extremistas

Mas Veloso Leão também chama a atenção para o recrutamento de civis de várias partes do mundo pelo governo ucraniano, algo que pode trazer consequências para além da questão das armas. “São pessoas que ao retornarem para seus países podem sofrer com as consequências psicológicas de terem vivenciado o conflito e se tornarem até mais propensos a atos violentos em seus países, mesmo sem acesso a armas mais letais. Muitas dessas pessoas têm visões romantizadas sobre o conflito e vão encontrar uma realidade mais dura do que imaginavam”.

Ele acredita que muitos deles podem se tornar referências para a extrema direita em seus países de origem. “Especificamente para o Brasil, a gente pode debater alguns riscos. Essas pessoas recebem um reconhecimento especial por terem participado do conflito e funcionam como pontos focais para aumentar a rede de pessoas compartilhando ideais extremistas no país”, analisa Leão.

NewsletterReceba a newsletter diária RFI: noticiários, reportagens, entrevistas, análises, perfis, emissões, programas.

Acompanhe todas as notícias internacionais baixando o aplicativo da RFI

Veja outros episódios
Página não encontrada

O conteúdo ao qual você tenta acessar não existe ou não está mais disponível.