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Esporte em foco

Jogos Paris-2024: Comitê Olímpico de Refugiados devolve esperança a atletas sem bandeira

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Eles não podem representar os seus países de origem, de onde fugiram ou foram expulsos. Tampouco os países onde foram acolhidos. Mas existe uma solução: os atletas olímpicos refugiados disputarão medalhas nos Jogos Paris-2024 sob a bandeira do COI, como aconteceu, pela primeira vez, na Rio-2016. A RFI conversou com uma ciclista afegã, representante do Comitê Olímpico de Refugiados, para compreender a importância de recuperar esse direito, quando a vida já lhes tirou quase toda a esperança.

Como em cada edição dos Jogos Olímpicos, a equipe olímpica de refugiados permite a atletas exilados que participem da competição. Imagem da delegação em Tóquio, em 23 de julho de 2021.
Como em cada edição dos Jogos Olímpicos, a equipe olímpica de refugiados permite a atletas exilados que participem da competição. Imagem da delegação em Tóquio, em 23 de julho de 2021. REUTERS - MARKO DJURICA
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Maria Paula Carvalho, da RFI

É através de uma fundação que o Comitê Olímpico Internacional (COI) distribui bolsas para pagar as despesas de treinamento dos atletas refugiados. Atualmente, há 53 esportistas no programa, mas esse número deve aumentar com uma nova seleção, a partir do ano que vem. Eles vêm de 12 países diferentes, praticam 13 modalidades esportivas e atualmente vivem em 19 países de acolhimento.  

"Quando eu conheci a equipe de refugiados, no início não gostei, pois queria participar pelo meu país. Mas depois compreendi o significado da equipe, que é até mais forte do que representar um país, porque nós representamos o mundo e hoje ainda existe o problema da discriminação e a guerra", diz a afegã Masomah Ali Zada, que vive atualmente em Paris.

"Nós somos todos de diferentes países, de diferentes línguas, culturas, mas estamos sob a mesma bandeira pelo mesmo objetivo de participar dos Jogos e levar uma mensagem de esperança", acrescentou a atleta, em entrevista à RFI.   

Ela conta que a maioria das histórias do grupo contém capítulos de sofrimento. "Os refugiados são obrigados a deixar o seu país por causa da guerra. Normalmente, nós temos todos os direitos nos países em que somos acolhidos, mas nos faltava a chance de competir, já que como refugiados não podemos representar o nosso país e nem o de acolhimento. Mas a equipe de refugiados nos permite participar dos Jogos Olímpicos, e isso é muito importante. Agora nossos direitos estão completos", comemora.

Na última quarta-feira (26), Zada recebeu das mãos do presidente do COI, Thomas Bach, o convite oficial para o Comitê Olímpico de Refugiados participar dos Jogos de Paris. Para se tornar membro da equipe, é preciso estar em um programa reconhecido pelo Alto Comissariado da ONU para Refugiados (ACNUR). 

"Eu venho do Afeganistão e cheguei à França em 2017", conta. "No Afeganistão, eu jogava vôlei e comecei a treinar ciclismo. Mas lá, infelizmente, a bicicleta é proibida para mulheres e o meu objetivo era popularizar o ciclismo entre as afegãs e ajudá-las a praticar sem ter medo. E por isso eu coloquei a minha vida em perigo, porque havia muita gente contra, que pensa que impor a bicicleta é impor uma outra cultura, impor algo à nossa religião e por isso fui obrigada a vir para a França para viver em segurança. Mas aqui, eu continuo a praticar o ciclismo e participarei dos Jogos com a equipe de refugiados", afirma.  

Masomah Ali Zada é atleta do Afeganistão, que compete pela bandeira dos refugiados. Ela recebeu o convite do COI como representante do Comitê Olímpico dos Refugiados. Em Paris, 26 de julho de 2023.
Masomah Ali Zada é atleta do Afeganistão, que compete pela bandeira dos refugiados. Ela recebeu o convite do COI como representante do Comitê Olímpico dos Refugiados. Em Paris, 26 de julho de 2023. © RFI Maria Paula Carvalho

Estreia nos Jogos Rio-2016

Criada em 2015, a equipe de refugiados do COI entrou em campo pela primeira vez nos Jogos Olímpicos Rio-2016. Fruto dos tempos atuais, a criação do Comitê Olímpico dos Refugiados foi uma necessidade, como explicou à RFI o presidente do COI, Thomas Bach.  

"Nós criamos a equipe de refugiados nos Jogos Rio-2016 porque nos demos conta que entre esses refugiados, há também atletas que têm o sonho olímpico. Queremos apoiá-los e mostrar ao mundo que esses refugiados são um enriquecimento para a nossa sociedade, através da sua resiliência, perseverança, de seu otimismo, apesar de todos os problemas que enfrentam. Nós queremos dar esperança a todos os refugiados do mundo", diz Bach.  

Equipe representa mais de 100 milhões de pessoas 

Desde a Olimpíada no Rio de Janeiro, o número de refugiados aumentou. "Agora são quase 110 milhões de pessoas deslocadas no mundo e a todas essas pessoas nós queremos enviar novamente essa mensagem de esperança, mas também de gratidão por eles enriquecerem a nossa sociedade olímpica", reforça o presidente do COI.

Nos Jogos de Tóquio-2020, a equipe olímpica de refugiados era formada por 29 atletas, que competiram em 12 modalidades.  

A ministra dos Esportes da França, Amélie Oudéa-Castéra, destaca o poder do esporte para a inclusão. "É muito importante. O programa de solidariedade olímpica é extraordinariamente importante aos nossos olhos. Temos nessa futura delegação de refugiados, vários atletas que hoje são acolhidos no nosso país. Nós queremos que para esses refugiados, os Jogos sejam excepcionais e que o esporte seja uma luz em suas vidas e que pelo esporte eles possam expressar coisas que a vida lhes tem, infelizmente, impedido de viver e de esperar", diz. 

A equipe Olímpica de Atletas Refugiados fez história nos Jogos do Brasil, onde foi liderada no desfile de abertura por Rose Lokonyen, corredora do Sudão do Sul, de 23 anos, à frente de uma equipe de 10 atletas. Rose tinha apenas 8 anos quando fugiu da guerra e encontrou segurança no campo de refugiados de Kakuma, no norte do Quênia. Além dela, esportistas de países como Síria, República Democrática do Congo e Etiópia completavam a equipe que foi ao Brasil.  

A passagem do grupo suscitou calorosos aplausos no estádio do Maracanã. Até o Papa Francisco e o ex-presidente americano Barack Obama se juntaram a milhões de pessoas em todo o mundo que desejavam sorte para a equipe Olímpica de Atletas Refugiados.  

Porém, outras urgências ligadas à Rio-2016 acabaram dominando a atenção, analisa Thierry Terret, historiador do desporto e do Olimpismo, entrevistado pela RFI. Para ele, a epidemia do vírus da zika, além de escândalos políticos e de corrupção podem ter apagado o brilho da estreia da equipe de refugiados nos Jogos do Rio. 

Oito anos depois, Ali Zada estará em Paris para dizer que o esporte é mais forte do que tudo. "Quando eu vejo a equipe Equipe Olímpica de Refugiados, eu penso em todos os refugiados, esse número tem aumentado recentemente, pessoas que fogem da guerra, especialmente do Afeganistão, pois desde a chegada do Talibã, muitas pessoas foram obrigadas a deixar o país, muitas mulheres. E eu penso no sofrimento dessas pessoas que passam um caminho muito difícil para viver em outro país em segurança. Eu fico emocionada e honrada de representar os refugiados do mundo", conclui. 

A equipe de refugiados formada pelo COI se transformou em um símbolo de paz e determinação, diante de catástrofes humanitárias.

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