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Brasil-Mundo

Cineasta lança documentário crítico sobre as heranças que a Copa do Mundo de 2014 deixou para o Brasil

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Uma mistura de sentimentos: a paixão pelo futebol, a emoção de receber o mundo para a Copa e o impacto com consequências para toda a vida. O documentário "Os Donos da Casa" mostra como a Copa de 2014 transformou o dia a dia de diversos brasileiros e teve estreia mundial nesta sexta-feira (2), no Festival Internacional de Cinema de Santa Bárbara (SBIFF), na Califórnia. Por causa da pandemia, a projeção aconteceu em um cinema drive-in.  Este é o primeiro longa-metragem da cineasta brasileira Carla Dauden, que mora em Los Angeles. 

Ivanildo Lopes (centro) morreu antes de receber uma nova casa.
Ivanildo Lopes (centro) morreu antes de receber uma nova casa. © Divulgação
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Cleide Klock, correspondente da RFI em Los Angeles

A diretora começou as filmagens 50 dias antes do início dos jogos. Ela registrou os protestos pré-Copa em quatro cidades, acompanhou a população assistindo aos jogos pelas ruas e também a vida de quatro brasileiros impactados antes, durante e depois do evento. A obra traz questões para reflexão: valeu a pena essa Copa do Mundo no Brasil? O que significa esse contraste de um país com as nossas carências e os megaestádios que construímos?

Carla Dauden, diretora
Carla Dauden, diretora © Divulgação

"É difícil falar que é uma crítica à Copa do Mundo. Eu acho que é tão complexo. É uma questão tão complicada porque tem isso: o amor pelo esporte, o amor pelo futebol", define a diretora. "Eu diria que é uma crítica à maneira como a Copa foi realizada no Brasil e, com certeza, é uma crítica à Fifa, ao poder monopolista da federação internacional, que tem todo o poder no mundo do futebol, dita as regras. É uma instituição corrupta, que chega aos países, arma seu circo, faz seu dinheiro e é considerada uma organização sem fins lucrativos com bilhões na conta. Esse é um dos pontos bem fortes do documentário", diz. 

Os personagens

O nome do filme faz uma menção aos quatro personagens principais que abriram as próprias casas para contar suas histórias.

Ivanildo Lopes teve a casa destruída por estar no caminho de uma das obras de infraestrutura em Fortaleza, que não ficou pronta a tempo da Copa, e faz parte das 250 mil pessoas afetadas pelas remoções. Marta Gomes trabalhou como ambulante no Fifa Fan Fest e viu no evento a esperança de mudar de vida e comprar o tão sonhado carro. Daniel Leon é agente de turismo, leva fãs para todas as Copas e é um dos fundadores da torcida canarinho. O menino Matheus Esteves, de 11 anos na época, era morador de uma comunidade no Rio de Janeiro, com vista para o Maracanã, e sonhava em ser jogador de futebol. 

Além de acompanhá-los por quase três meses em 2014, Carla os encontrou, novamente, durante a Copa de 2018, na Rússia.

"Para mim, acabar esse filme agora é surreal porque é uma parte muito grande da minha vida que termina. A gente continuou em contato com os personagens, quatro anos depois voltamos para filmar, foi um processo muito longo mesmo. Mas muito gratificante também, porque à medida que o filme foi crescendo e maturando, eu também fui. Eu aprendi muito com esse processo, com as pessoas e grupos que eu conheci", relata Carla. 

As histórias pessoais são alinhavadas com comentários de importantes nomes do jornalismo esportivo e investigativo, como o britânico Andrew Jennings e os brasileiros Juca Kfouri, Jamil Chade e Fernanda Gentil, além do ex-líder do comitê de governança da Fifa Miguel Maduro e o ativista Argemiro Almeida.

O começo

A ideia de fazer o documentário surgiu a partir da vontade da cineasta de não ir ao Brasil durante a Copa do Mundo. Vivendo nos Estados Unidos, Carla assistia de longe, com um olhar crítico, ao que acontecia no Brasil na época. A construção de obras gigantescas e caríssimas num país que dá pouca infraestrutura para a maioria de seus habitantes e a explosão de manifestações pelas ruas fez com que a diretora postasse, nas redes sociais, um vídeo dizendo as razões pelas quais não iria para a grande festa do futebol, tão esperada pelos brasileiros.

O vídeo viralizou em poucas horas e Carla acabou se envolvendo com o assunto, o que fez com que ela mudasse de ideia e quisesse ver de perto o que estava acontecendo, para entender o sentimento que pairava no país. 

A diretora começou a falar com os grupos locais, os comitês populares e de articulação nacional que estavam na linha de frente de apoio a pessoas afetadas. "Depois de um tempo, vendo a Copa de aproximando, eu falei 'quero ir e ver essas histórias de perto, deixar essas pessoas contarem as histórias delas'", revela Carla.

O documentário mostra a simbologia da quebra da ilusão de que tudo iria mudar, que o Brasil iria para frente, sem esquecer dos inesquecíveis e insuperáveis 7 x 1, que também deixaram a realidade ainda mais dura.

"O filme mostra essa esperança do brasileiro e infelizmente, na minha opinião, as coisas só pioraram desde então. E a gente tem hoje em dia não só politicamente um caos no país, mas estádios abandonados, obras de infraestrutura que não foram terminadas e muitas pessoas que tiveram as vida impactadas para sempre. Delas, a gente não pode esquecer", ressalta a diretora. 

 

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