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Para advogado, acusação de genocídio contra Israel é ‘instrumentalização' da Justiça pela África do Sul

No segundo e último dia de audiências para a Corte Internacional de Justiça avaliar a acusação de genocídio feita pela África do Sul contra Israel, foi a vez de os advogados de Tel Aviv defenderem o país em Haia, na Holanda. Os defensores alegaram, nesta sexta-feira (12), que a denúncia era “totalmente distorcida" e “mal-intencionada”.

O conselheiro jurídico do Ministério das Relações Exteriores de Israel, Tal Becker, na Corte Internacional de Justiça, em Haia, em 12 de janeiro de 2024.
O conselheiro jurídico do Ministério das Relações Exteriores de Israel, Tal Becker, na Corte Internacional de Justiça, em Haia, em 12 de janeiro de 2024. AFP - REMKO DE WAAL
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No mais alto tribunal da ONU, Israel disse que, ao iniciar uma ofensiva contra a Faixa de Gaza, não procurou destruir o povo palestino. Em dezembro, a África do Sul recorreu, em regime de urgência, à corte com o argumento de que o governo israelense está violando a Convenção das Nações Unidas sobre o Genocídio, assinada em 1948 após o Holocausto.

De acordo com Tal Becker, um dos advogados do Estado judeu, Pretória "infelizmente apresentou ao tribunal uma imagem factual e jurídica completamente distorcida" do conflito. Mostrando vídeos e imagens, Becker apresentou aos magistrados uma série de crimes cometidos, segundo ele, durante o ataque do Hamas. Os membros do Hamas “torturaram crianças na frente dos pais, pais na frente dos filhos, queimaram pessoas” e foram culpados de violação e mutilação, ressaltou.

Na audiência em Haia, Becker enfatizou que a resposta de Israel foi um ato de legítima defesa e não tinha como alvo civis. “Israel está envolvido numa guerra de defesa contra o Hamas, não contra o povo palestino”, disse Becker. Nestas circunstâncias, “não pode haver acusação mais falsa ou mais maliciosa do que a acusação de genocídio contra Israel”, declarou.

Para Yaacov Garson, advogado israelense e especialista em direito internacional, a intenção de Pretória visa sobretudo poder acusar Israel em um tribunal internacional – e os resultados da ação, favoráveis ou não, são menos importantes.

Bloco anti-EUA

"Não temos a impressão de que a África do Sul esteja querendo socorrer os palestinos, mas sim que está instrumentalizando o sistema jurídico internacional para passar uma mensagem. A mensagem é que Israel está sujeito a uma acusação como essa, de genocídio, mesmo que tenham sido Israel e os judeus que tenham ‘introduzido' este conceito no direito internacional, depois da Segunda Guerra Mundial, por terem sofrido, eles mesmos, um genocídio”, analisa Garson, entrevistado pela RFI.

Para ele, ao mover a ação, a África do Sul deseja "se posicionar contra os Estados Unidos", aliados de Israel. "Mas também dizer à parte do mundo que se opõe aos Estados Unidos – Irã, Rússia, China – que está do lado deles”, salienta o advogado.

Pretória espera que os juízes da Corte ordenem a Israel a parar “imediatamente” a campanha militar lançada em Gaza após o ataque sem precedentes do Hamas em solo israelense, em 7 de outubro, que deixou cerca de 1.140 mortos. Em retaliação, Israel lançou uma ofensiva no território palestino que deixou pelo menos 23.469 mortos, a maioria mulheres, adolescentes e crianças, segundo o último relatório do ministério da Saúde do Hamas.

“A Corte Internacional de Justiça pode adotar medidas de preservação, que podem representar um impacto muito rápido nos eventos. Ela pode servir como uma carta para os Estados que desejam acentuar a pressão pelo fim dessa guerra o mais rapidamente possível”, indica o jurista François Dubuisson, professor de Direito Internacional na Universidade Livre de Bruxelas, à RFI. "Mas devemos sublinhar que isso não é muito frequente”, observou.

Israel e o seus aliados Estados Unidos classificaram a acusação como infundada. Em Tel Aviv, o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, disse na quinta-feira, primeiro dia de audiências, que seu país “é acusado de genocídio num momento em que luta contra o genocídio”.

"Uma organização terrorista cometeu o pior crime contra o povo judeu desde o Holocausto e agora alguém vem defendê-los em nome do Holocausto. Que coragem!", ironizou.

Decisão da corte pode ser rápida

Como se trata de um procedimento de emergência, a CIJ poderá decidir dentro de algumas semanas sobre o caso. As suas decisões são definitivas e juridicamente vinculativas, mas a instituição não tem poder para aplicá-las. Em um exemplo recente, ela ordenou que a Rússia suspendesse a invasão da Ucrânia.

Por outro lado, o tribunal ainda não se pronunciará sobre o mérito do caso – se Israel está efetivamente cometendo um genocídio –, mas apenas sobre a questão de saber se os direitos fundamentais dos habitantes de Gaza estão sendo ameaçados.

Na quinta-feira, o Ministro da Justiça sul-africano, Ronald Lamola, disse aos magistrados que Israel tinha "cruzado a linha" e violado a Convenção do Genocídio, assinada pelos dois países, e que nem mesmo a "brutalidade" do ataque do Hamas poderia justificar tal violação.

Apoio da África do Sul à causa palestina é antigo

“Os genocídios nunca são declarados antecipadamente”, disse Adila Hassim, uma advogada sul-africana. “Mas este tribunal tem o benefício das últimas 13 semanas de provas que mostram, indiscutivelmente, um padrão de comportamento e intenção que apoia uma alegação plausível de atos genocidas”, acrescentou.

O Congresso Nacional Africano (ANC), no poder na África do Sul, há muitos anos apoia a causa palestina. O ex-presidente sul-africano e herói da luta anti-apartheid Nelson Mandela disse que a liberdade da África do Sul seria “incompleta” sem a dos palestinos.

As autoridades locais em Belém, na Cisjordânia, hastearam a bandeira sul-africana na sexta-feira, o que provocou aplausos da multidão. Pretória “mostrou o nosso sofrimento em todo o mundo”, disse à AFP o prefeito da cidade, Anton Salman, que espera que este caso traga “resultados frutíferos para o povo palestino e para a humanidade em geral”.

Noite de ataques em Gaza 

Na noite desta quinta para sexta-feira, dezenas de pessoas foram mortas na Faixa de Gaza, bombardeada por Israel, principalmente entre Rafah, no extremo sul do território palestino, e Khan Yunes, a maior cidade do sul. Segundo o Ministério da Saúde do Hamas, “mais de 59 mortos e dezenas de feridos foram levados para hospitais na sequência dos ataques realizados” durante a noite “em vários setores”.

No hospital Najjer, em Rafah, um jovem que não informa o nome mostra corpos à AFPTV em lonas plásticas. "As mulheres estão viúvas, as crianças órfãs. Alguém se importa conosco? Por que todos estão calados?", pergunta.

Com uma média de 250 mortes por dia, segundo os cálculos do Hamas, a taxa de letalidade média desta guerra é “significativamente superior” à de “qualquer outro conflito recente”, “na Síria (96,5 mortes por dia), no Sudão (51,6) , Iraque (50,8), Ucrânia (43,9), Afeganistão (23,8) e Iêmen (15,8)”, denunciou a organização Oxfam.

(Com informações da AFP)

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