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Nagorno-Karabakh: separatistas anunciam cessar-fogo e negociam com Azerbaijão

Os separatistas armênios do Alto Karabakh anunciaram a deposição de suas armas, nesta quarta-feira (20), e concordaram com um cessar-fogo com o exército do Azerbaijão, 24 horas depois de Baku ter iniciado uma ofensiva para restaurar o controle total de seu território. O acordo foi alcançado após uma mediação das forças russas de manutenção da paz. 

Uma imagem mostra carros danificados em frente a um edifício residencial, após o lançamento de uma operação militar pelas forças armadas do Azerbaijão na cidade de Stepanakert, em Nagorno-Karabakh, uma região habitada por armênios, em 19 de setembro de 2023.
Uma imagem mostra carros danificados em frente a um edifício residencial, após o lançamento de uma operação militar pelas forças armadas do Azerbaijão na cidade de Stepanakert, em Nagorno-Karabakh, uma região habitada por armênios, em 19 de setembro de 2023. via REUTERS - SIRANUSH SARGSYAN/PAN PHOTO
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Segundo essa resolução, confirmada por ambos os lados e em vigor a partir das 13h00 pelo horário local (9h00 GMT), as forças separatistas serão dissolvidas e as conversas sobre o futuro da região e dos armênios que lá vivem começarão nesta quinta-feira (21). Após vitória sobre os separatistas, o Azerbaijão garantiu que quer uma “reintegração pacífica” de Nagorno-Karabakh.

Os separatistas que dirigem a autodenominada “República de Artsakh” disseram que foram forçados a concordar com os termos do Azerbaijão – retransmitidos pelas forças de paz russas – depois que o Exército de Baku tomou uma série de locais estratégicos.

“As autoridades da República de Artsakh aceitam a proposta do comando do contingente russo de manutenção da paz de cessar-fogo”, afirmaram em um comunicado.

Em entrevista à RFI, Elchin Amirbayov, representante para missões especiais do presidente do Azerbaijão, Ilham Aliyev, explicou as razões para o país ter iniciado a operação militar no Alto-Karabakh. “Faz alguns dias que há provocações da parte do Exército Armênio na região do Alto-Karabakh, que é reconhecida internacionalmente como pertencente ao Azerbaijão. Essas tropas atacaram postos militares, implantaram minas e tentam interferir na navegação de aviões civis, colocando em perigo a vida de centenas de pessoas”, afirma.

Para o representante do Arzebaijão, a operação militar foi necessária. “Faz quase três anos que temos um contingente militar ilegal no nosso território soberano, cerca de 10.000 pessoas armadas e a Armênia financia, com o seu orçamento nacional, essa entidade separatista ilegal”, denuncia. “É um risco grande em termos de segurança e por isso decidimos lançar esta operação limitada e antiterrorista”, completa Elchin Amirbayov.

A Armênia, por sua vez, denunciou uma “agressão em grande escala” para efeitos de “limpeza étnica” e garantiu não ter tropas em Nagorno-Karabakh, sugerindo que os separatistas lutam sozinhos contra os soldados azerbaijanos. Baku negou a acusação de praticar uma limpeza étnica. O cessar-fogo, entretanto, pode abrir caminho para que o Azerbaijão integre cerca de 120 mil armênios em sua sociedade.

Na terça-feira (19), 5 pessoas morreram e outras 80 ficaram feridas em Nagorno-Karabakh, em consequência da operação “antiterrorista” lançada pelo Azerbaijão nesta zona montanhosa do Cáucaso, uma área disputada pela Armênia e pelo Azerbaijão desde a década de 1990.

Os separatistas alegaram que várias cidades de Nagorno-Karabakh, incluindo a sua capital Stepanakert, foram alvo de "fogo intensivo" das forças militares de Baku, também visando infraestruturas civis. Na manhã de quarta-feira, a prefeitura de Stepanakert pediu aos moradores que permanecessem em abrigos e não fugissem.

“Não há conexão, nem telefone", contou à RFI Mary, uma estudante armênia que mora em Yerevan. A família dela está em Nagorno-Karabakh, mas a jovem tem dificuldade em falar com os parentes. "Há vítimas e feridos, os militares do Azerbaijão bombardearam escolas”, relata. “O Azerbaijão continua a praticar ações agressivas militares e achamos que só a República da Armênia, o governo da Armênia, pode mudar alguma coisa”, aponta.

Na tarde desta quarta-feira, milhares de manifestantes se reuniram em frente à sede do governo armênio. 

Armênia e Azerbaijão fazem parte de uma região que liga a Rússia ao Oriente Médio e que hoje é conhecida como Cáucaso do Sul, um território de muitas etnias, dentre as quais se destacam os armênios, em sua maioria cristã, e os azeris, majoritariamente islâmicos. Porém, as guerras ocorridas neste enclave montanhoso não são puramente religiosas. Elas dão conta de uma delicada reorganização de fronteiras, especialmente com o fim da União Soviética. 

Putin pede “solução pacífica”

O presidente russo, Vladimir Putin, afirmou nesta quarta-feira esperar uma “solução pacífica” para o conflito em Nagorno-Karabakh, em declarações transmitidas pela televisão estatal, pouco depois do anúncio do cessar-fogo. “Estamos em contato muito próximo com as partes em conflito (…) Espero que possamos conseguir uma desescalada e uma solução pacífica do problema”, declarou Putin durante uma reunião com o chefe da diplomacia chinesa, Wang Yi. Contudo, não foi possível afirmar se estas declarações foram registradas antes ou depois do anúncio do acordo de cessar-fogo.

Poucos minutos antes, o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, não havia comentado nada sobre o acordo de cessar-fogo, anunciado pelos separatistas de Karabakh e pelo Azerbaijão.  “Não tenho quaisquer detalhes neste momento”, disse ele durante o seu briefing diário, que ocorreu logo após o anúncio de que as forças de Karabakh se rendiam.

No fim da tarde, o Kremlin declarou que a crise no Alto Karabakh é um assunto interno do Azerbaijão. 

Armênia não participou do acordo

A Armênia “não participou” na elaboração do acordo de cessar-fogo, esclareceu nesta quarta-feira o seu primeiro-ministro, Nikol Pashinian, considerando, no entanto, “muito importante” que os combates cessem. “Tomamos conhecimento da decisão das autoridades de Karabakh de cessar as hostilidades e de depor as armas”, disse ele num discurso à nação, transmitido pela televisão, um dia após o lançamento de uma ofensiva por parte do Azerbaijão.

Aliada tradicional de Moscou, nos últimos meses a Armênia acusou os soldados russos de inação em Nagorno-Karabakh, enquanto se aproximava do Ocidente. No entanto, é “muito importante preservar a estabilidade e suspender as operações militares” na região separatista, acrescentou Pashinian. Ele disse esperar o fim da “escalada militar” e que as forças de manutenção da paz russas “cumpram plenamente as suas obrigações”.

Nesta quarta-feira, as forças de paz russas afirmam ter retirado mais de 3.100 pessoas em Karabakh.

De acordo com Moscou, dois soldados das forças de paz russas foram mortos por tiros que atingiram o veículo em que eles estavam. 

Estas tropas russas estão destacadas na região desde novembro de 2020, após o fim de uma guerra de seis semanas vencida pelo Azerbaijão. “A intensidade das operações militares diminuiu consideravelmente”, mas não “caiu a zero”, concluiu o primeiro-ministro armênio. De acordo com Nikol Pashinian, a Armênia não tem unidades militares na região desde agosto de 2021, embora Baku afirme o contrário.

Reações internacionais

Antes do anúncio de cessar-fogo, a retomada das hostilidades neste território foi assunto na Assembleia Geral da ONU, em Nova York. O secretário-geral, António Guterres, pediu “nos termos mais veementes, ao fim imediato dos combates, à desescalada da violência e ao respeito mais estrito pelo cessar-fogo de 2020 e pelos princípios do direito humanitário internacional”.

A França, por sua vez, denunciou uma ofensiva “ilegal” e “injustificável” de Baku.

No final de sua audiência semanal no Vaticano, nesta quarta-feira, o Papa Francisco também apelou para “silenciar as armas”.

A União Europeia pediu ao Azerbaijão que garanta a segurança dos armênios no Alto Karabakh. 

(Com informações da RFI e da AFP)

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