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O Mundo Agora

Índia: Criar taxas de importação para comércio digital é dar tiro no pé

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Desta vez não é Donald Trump que ameaça o comércio mundial. A Índia está pensando em criar tarifas de importação para o comércio digital. Desde de 1998, os países membros da Organização Mundial do Comércio (OMC), vêm renovando uma moratória que proíbe este tipo de imposto para as transmissões eletrônicas, que já atingiram US$ 255 bilhões. Os indianos estão flertando com a ideia de não renovar essa proibição, que vai caducar no fim do ano. Isso pode simplesmente liquidar com a parte do funcionamento internacional da Internet. Além de ser um tiro no pé, sobretudo para os países em desenvolvimento.

Índia cogita criar tarifas de importação para o comércio digital, mas isso pode liquidar a parte do funcionamento internacional da Internet
Índia cogita criar tarifas de importação para o comércio digital, mas isso pode liquidar a parte do funcionamento internacional da Internet reuters
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Ninguém sabe como seria possível instaurar essas tarifas. No meio dos bilhões de bytes por minuto que circulam pelo mundo, como discriminar os que devem ou não serem taxados? Como determinar com certeza a origem de um produto digital? E se o próprio é uma importação ou não?

Mesmo se houver uma solução tecnológica, qualquer tarifa protecionista provocaria uma retaliação imediata por parte dos países lesados. O resultado seria uma fragmentação rápida das redes globais. Pior para os países mais pobres e menos avançados sem grandes capacidades de inovação e de produção de tecnologias de ponta.

Ressuscitar “nacional-desenvolvimentismo”

O argumento das autoridades de Nova Deli tem a ver com a proteção das velhas indústrias e setores econômicos nacionais. O diabo, hoje, parece ser as impressoras em 3D. A Índia acha que a sua indústria vai ser varrida se empresários estrangeiros puderem mandar designs e controlar a produção por Internet, para fabricar produtos baratos e personalizados com pequenas unidades de fabricação em 3D em território indiano. O medo é também dos livros, filmes e softwares importado pela Net. Sem falar na perda de receitas em tarifas de importação.

Na verdade, os indianos estão raciocinando dentro da antiga ideologia do “nacional-desenvolvimentismo”: promover o atraso de produção e dos serviços domésticos com barreiras protecionistas e subsídios públicos. No mundo da quarta revolução industrial, onde a liberdade de comunicação e de transferências de saber e técnicas é fundamental para a competitividade de qualquer país, esse tiro no pé é a melhor receita para afundar na crise econômica.

Parece até que Nova Deli esqueceu que há pouco tempo atrás se vangloriava de ser a “Índia Luminosa”, o país que ia atropelar as façanhas econômicas da China. Com taxas de crescimento do PIB exuberantes – em larga parte devido à exportação de serviços informáticos por Internet – e uma população de mais de um bilhão de habitantes ávidos de consumir, a Índia tinha pinta de país do futuro.

O primeiro-ministro Narendra Modi foi eleito e reeleito propondo reformas domésticas ambiciosas para tirar a população da miséria. A ideia era abrir a economia e acabar com os terríveis clientelismo e corrupção locais.

Indianos sofrem com inflação em alta e queda do PIB

No começo, parecia dar certo, mas o peso dos grupos de interesses provinciais e dentro do aparelho de estado central não deixaram. Hoje, a inflação está em alta, e o crescimento do PIB em forte baixa. Não basta para integrar os 12 milhões de jovens que cada ano precisam entrar no mercado de trabalho. Resultado: o governo retorna à política de subsídios, ao buraco no orçamento e ao velho protecionismo.

Só que desta vez, acha que pode se proteger da revolução digital mundial. O ministro das Finanças teve o desplante de jogar a culpa da queda impressionante das vendas de automóveis indianos nos jovens urbanos que só querem utilizar o Uber em vez de comprar carros!

Fechar o país à liberdade do comércio eletrônico não é só uma maneira de condenar a indústria e os serviços indianos ao atraso. Se a Índia bloquear a renovação da moratória na OMC, a grande maioria dos outros países, sobretudo os mais avançados, simplesmente negociarão uma proibição de tarifas só para eles próprios, deixando os indianos de fora, chupando o dedo.

Alfredo Valladão é professor do Instituto de Ciências Políticas de Paris e assina uma crônica semanal de geopolítica às segundas-feiras na RFI

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