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O Mundo Agora

Emergentes não aproveitaram sucesso para criar crescimento sustentável

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Os dirigentes dos países ditos « emergentes » são particularmente ciclotímicos. Flutuam entre momentos de exaltação arrogante e depressão ressentida. Quando tudo vai bem e o crescimento econômico é pujante, é sempre graças à sua grande sabedoria e competência. Quando vai mal e começa a cheirar à crise, é culpa dos outros. Isto é: dos países ricos malvados que não deixam os pobrezinhos se desenvolver. Tem tudo a ver com uma atitude adolescente que se recusa a olhar para os problemas de maneira fria e racional, para tentar resolvê-los sem malabarismos semânticos e passes de mágica que não enganam ninguém.

Países Emergentes  passam por instabilidade.
Países Emergentes passam por instabilidade. REUTERS/Bobby Yip
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A choraminga dos emergentes era uma constante da vida internacional durante toda a última metade do século XX. De vez em quando, aparecia algum curto “milagre econômico”, devido ao aumento das matérias primas exportadas ou à abertura dos mercados europeus e americanos para a produção industrial barata dos pobres. Mas bastava a conjuntura enfraquecer para que os ganhos destes períodos de bonança fossem para a cucuia.

Tanto é verdade que com pouquíssimas exceções, os países em desenvolvimento não aproveitavam os tempos de vacas gordas para preparar os de vacas magras. Ninguém pensava em investir na competitividade do próprio parque produtivo, acumular reservas para reduzir a vulnerabilidade aos movimentos de capitais bruscos, e sobretudo utilizar os bons momentos para realizar as reformas estruturais necessárias para sustentar o crescimento.

A classe política, empresarial e sindical dos emergentes só queria aproveitar a boa fortuna para gastar o mais rápido possível, distribuindo para os pobres ou para os ricos segundo a cor ideológica do governo de turno.

Mas aí a globalização chegou. No começo do século XXI, as grandes economias emergentes e os “emergentizinhos” que vêm atrás, foram os queridinhos das grandes empresas transnacionais, dos investidores globais e dos consumidores dos países ricos.

E a explosão do crescimento econômico foi espetacular. A China virou a fábrica do mundo, o Brasil e outros produtores de commodities vendia matéria prima para os Chineses por preços estratosféricos, a Índia se transformava em pólo de serviços para as grandes cadeias de produção globalizadas, enquanto os tigres asiáticos, os pumas latino-americanos ou as gazelas africanas cresciam na base da subcontratação.

E no final das contas, essa produção toda – e a euforia que vem junto – dependia completamente do apetite do consumidor americano e europeu, e dos investimentos dos países ricos.

Só que os dirigentes deste imenso mundo emergente achavam que esse sucesso todo era deles, e só deles. O grupo dos BRICS saiu cantando que o mundo desenvolvido estava se acabando e que agora era a vez dos antigos pobres. E que os novos riquinhos não precisavam mais da economia dos industrializados. A arrogância tinha até um nome: “descolamento”.

Mas então bateu a crise financeira de 2008. Os países ricos pararam. Pouco a pouco toda a economia mundial entrou quase em estado de coma. Os emergentes seguraram um pouquinho mais graças à máquina de fazer dinheiro: os governos tentaram manter o crescimento estourando o crédito para o consumo ou para o investimento pouco produtivo. A conta chegou rápido. E com a conta voltaram as lamúrias de sempre.

Quando os Americanos decidiram largar uma enxurrada de dinheiro para salvar a economia dos, Estados Unidos, os emergentes – com a Brasil na frente – denunciaram uma “guerra do câmbio”. A chegada massiva de capitais fugindo os juros zero dos países ricos valorizava de maneira brutal as moedas locais, mas também cobria as necessidades de dinheiro para lutar contra as conseqüências da crise dentro de cada país. Agora que a economia americana está saindo do buraco – para o bem de toda a humanidade – Washington decidiu parar de jogar dinheiro pela janela.

O resultado é a volta dos capitais para o Norte e a desvalorização brutal das moeda do Sul. Claro, agora a choraminga dos emergentes é que os países ricos não estão ajudando os pobrezinhos a sair da enrascada. Como se fosse o dever dos Europeus e Americanos tomar conta da saúde econômica de países que não souberam aproveitar o próprio sucesso para criar as condições de um crescimento sério e sustentável, capaz de enfrentar o vendaval da crise sem ter que passar o pires para os Bancos Centrais do Norte.

Cadê o “descolamento”? Cadê o famoso Banco dos BRICS que iria blindar as moedas dos grandes emergentes? Cadê as reformas estruturais e os investimentos produtivos? Quem pode pode, quem não pode se sacode. Como dizia o português da venda: quem não tem competência, não se estabelece.

 

Clique acima para ouvir a crônica O Mundo Agora de Alfredo Valladão, professor do Instituto de Estudos Políticos de Paris.

 

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