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Prostituição/França

Adolescentes francesas contam por que decidiram se prostituir em Paris

Julia se prostitui para guardar dinheiro "para depois da escola". Pauline entrou no mundo da prostituição porque "todo mundo faz isso". Estas são duas das jovens francesas que fazem parte da nova onda de prostituição adolescente, que cresce consideravelmente na região de Paris. Segundo a associação Agir Contra a Prostituição de Crianças, há cerca de 8.000 menores de idade se prostituindo na capital francesa.

Segundo a associação Agir Contra a Prostituição de Crianças, há cerca de 8.000 menores de idade se prostituindo na capital francesa.
Segundo a associação Agir Contra a Prostituição de Crianças, há cerca de 8.000 menores de idade se prostituindo na capital francesa. AFP / MARIO VEDDER
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Aos 17 anos, Julia [todos os nomes foram trocados] se prostituía nos fins de semana, durante as férias escolares, nas tardes de quarta-feira, quando ela não tinha curso. Como muitas vezes nesses casos, ela se apaixonou por um garoto que rapidamente propôs que ela se tornasse uma "scort girl". Ele encontra os clientes, define as taxas - € 100 por hora, € 50 por meia hora - e eles deveriam compartilhar os ganhos. Mas, como sempre acontece nesses casos, ela não viu a cor do dinheiro.

Por que aceitar? Como acabamos “atendendo” cinco clientes no sábado à tarde? "Acho difícil responder", disse a estudante do ensino médio aos investigadores após a prisão de Julia e seu namorado. "Às vezes tudo vai bem, às vezes penso apenas no dinheiro que faço". Ao contrário de Julia, que mora com os pais, a maioria desses adolescentes, em média de 14 a 18 anos, se encontra fora da escola, em casa ou em fuga.

Como Pauline, que chegou sozinha na região de Paris, aos 17 anos. "Eu tenho uma amiga que fez isso com um cara, ela me apresentou", disse. Ela descreve as micro redes efêmeras mantidas por criminosos, o recrutamento em redes sociais, os "clientes" que as garotas trocam, os garotos que "testam" as garotas e ironizam as "trabalhadoras". Eles gerenciam anúncios, clientes, reservas de hotéis e fazem a "segurança" na porta do banheiro. Também fornecem comida, drogas e álcool para as meninas.

Pauline conta quem são os clientes - "há de tudo, jovens da periferia, funcionários em uniforme" – e as meninas às vezes muito jovens com quem dividia um quarto em redes de prostituição que às vezes duram “apenas dois, três dias”. "Elas colocam cílios postiços, uma camada de maquiagem ... Não há como ver que elas têm 13 anos", disse.

Chloé fugia regularmente quando foi recrutada aos 14 anos por uma amiga que lhe prometeu "uma tonelada de dinheiro", segundo explicou em um tribunal de Créteil, um subúrbio de Paris, onde viera testemunhar, há pouco mais de um ano. Loirinha de leggings e tênis, rosto de criança, ela se mostrava, na ocasião, muito constrangida entre os juízes do tribunal e seu pai. Foi ele quem a pegou em um hotel fingindo ser um cliente.

"Fenômeno Zahia"

Este "proxenetismo de bairros" aumentou "significativamente" nos últimos anos, disse Raphaëlle Wach, uma referência sobre o assunto no Ministério Público de Créteil, que atualmente lida com cerca de trinta casos desse tipo. Na região parisiense, pelo menos 145 investigações foram registradas entre julho de 2016 e o ​​final de 2018. "É a ponta do iceberg", segundo Lorraine Questiaux, do Mouvement du Nid, associação que luta contra a prostituição. Questiaux lamenta a ausência de números oficiais sobre a questão.

O Nid estimou em 2015 em 37.000 o número global de prostituição de menores na França, e a associação Agir Contra a Prostituição Infantil menciona de 5.000 a 8.000 menores. Meninas adolescentes muito frágeis e vulneráveis, em "grande falta de autoestima e em busca de afeto" por sua história pessoal - violências, famílias complicadas, assédio -, segundo o secretário-geral da Agir, Arthur Melon.

Para algumas dessas meninas, a prostituição também é "banalizada", "glamour", diz Wach, falando dos danos do "fenômeno Zahia", o nome da ex-prostituta - então menor de idade - que ficou famosa por ser o " presente de aniversário "do futebolista Franck Ribery em 2009, antes de se tornar criadora de lingeries de luxo. Para estas adolescentes francesas que decidem se prostituir, "Zahia é um modelo de mulher que teve sucesso".

A realidade destas garotas, no entanto, se passa em hotéis de baixa renda na região de Paris. Uma recepcionista descreve as garotas "sentadas nas escadas" e conta como acontece: "Um jovem chega, pega uma chave na recepção, sobe, depois chega uma garota, nós vemos a movimentação, entendemos ". Yanis, empregado em um hotel parisiense no entroncamento de uma rodovia, reconhece os clientes - "perdidos e que baixam os olhos", às vezes cafetões. Mas "se eles têm documento de identidade e reservas online, temos que dar o quarto", afirma.

Nos quartos minúsculos, diz uma governanta, “encontramos preservativos usados, pacotes de batatas fritas e garrafas vazias, às vezes sangue nos lençóis”.

"É meu corpo"

Quando perguntada sobre como decidiu seguir essa vida, Pauline dá de ombros: "Está tudo bem ... Nós entramos em uma bolha, nos acostumamos a isso, é dinheiro fácil, podemos ganhar € 500 euros em um dia, e no dia seguinte nós descansamos". Ela nunca recuperou o dinheiro roubado por seu último namorado e cafetão, pelo qual ela estava apaixonada, mas ainda não se considera uma vítima, dois anos depois. "Foi um acordo, ninguém é forçado", diz ela. "Meninas, elas pedem para fazer isso, elas entram. É moda, todo mundo faz isso."

Mesma defesa utilizada pelos cafetões. "Eu não sou um criminoso. Eu não bato nelas, eu não as coloco na calçada, eu nunca forço ninguém", disse com raiva em seu julgamento o chefe de uma micro rede de prostituição, de 22 anos, condenado pelo tribunal de Créteil a quatro anos de prisão. "Eles não percebem a violência desse fenômeno que às vezes os leva a obrigar estas garotas a enviarem o que ganham para seus namorados na prisão, diz Wach.

Na frente da polícia que as escuta, as meninas, muitas vezes arrogantes e agressivas, negam ser vítimas. Eles nunca dizem que são prostitutas, mas "scort girl" consentida. "Elas nos dizem ‘eu faço o que eu quero, é o meu corpo’ “, diz um investigador da região parisiense. "Quando lhes dizemos ‘mas você está se prostituindo’, elas ficam com raiva", diz. "Eles pensam que são princesas, nós dizemos:" Não, você não é uma princesa, você vende seu corpo por dinheiro e ganha 50% do que ganha", conclui o policial.

(Com informações da AFP)

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